Acórdão Nº 5002587-87.2022.8.24.0035 do Primeira Câmara Criminal, 28-06-2022

Número do processo5002587-87.2022.8.24.0035
Data28 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5002587-87.2022.8.24.0035/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRENTE) RECORRIDO: MARIA FERNANDA FARIAS (RECORRIDO) ADVOGADO: JOSE DOS SANTOS JUNIOR (OAB SC047457)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, com base no art. 581, V, do Código de Processo Penal, contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de ITUPORANGA, que substituiu a prisão preventiva de Maria Fernanda Farias por prisão domiciliar cumulada com monitoramento eletrônico (evento 375/PG da Ação Penal 5000192-25.2022.8.24.0035), nos autos em que se apura a prática do crime previsto no art. 35 da Lei 11.343/2006, estando ela denunciada, também, nos autos em que se aprecia o cometimento do delito descrito no art. 33 da mesma legislação (evento 1/PG da Ação Penal 5001744-25.2022.8.24.0035).

Em síntese, sustentou que a recorrida não faz jus à prisão domiciliar, muito menos à fixação de medidas cautelares diversas da segregação, visto que, consoante decidido pela mesma autoridade judicial dias antes da decisão ora combatida, o fato de ter um filho menor, por si só, não justifica a benesse em tela, ainda mais quando constatado que a segregação ocorreu em dezembro de 2021 e o pleito foi formulado apenas em março de 2022, evidenciando, portanto, que, nesse interregno, a criança ficou sob os cuidados dos familiares da recorrida, de modo que a sua presença é prescindível.

Destacou que, além de o juízo de primeiro grau ter deixado de justificar concretamente a mudança do cenário fático-probatório que ensejou, dias antes, o indeferimento da prisão domiciliar ante a persistência dos motivos invocados para a prisão preventiva, as condições pessoais da recorrida são claramente desfavoráveis, porque já responde a outra ação penal pelo cometimento dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, ocorridos em 2019 e 2020 (autos 5001046-87.2020.8.24.0035, em grau de recurso), foi condenada pelo crime de tráfico de drogas, ocorrido em 27-11-2020 (autos 5000491-36.2021.8.24.0035) e está sendo processada pelo mesmo delito, perpetrado até 30-11-2021 (autos 5001744-25.2022.8.24.0035), o que demonstra sua reiteração criminosa apta a ensejar a adoção da medida extrema à luz do pressuposto da garantia da ordem pública.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso (evento 1/PG - em 20-5-2022).

Contrarrazões ofertadas por defensor dativo, pugnando pela manutenção da decisão combatida, sem prejuízo da fixação de verba honorária pelo encargo desempenhado nesta instância (evento 5/PG - em 26-5-2022).

Em juízo de retratação (CPP, art. 589), o juiz de direito Marcio Preis manteve a decisão impugnada (evento 7/PG - em 27-5-2022).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do procurador de justiça Gercino Gerson Gomes Neto, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 8/SG - em 2-6-2022).

VOTO



Do juízo de admissibilidade

Presentes os pressupostos objetivos (cabimento, adequação, tempestividade e ausência de fatos impeditivos ou extintivos da pretensão recursal) e subjetivos (interesse e legitimidade), conhece-se do recurso.

Do mérito

De início, cumpre fazer breve retrospecto dos autos em tela para melhor compreensão do contexto em que a recorrida se encontra inserida, o qual pode ser apreciado mediante leitura da decisão proferida pelo Togado de origem quando decretou a prisão preventiva diante da representação policial, com a qual concordou o Ministério Público:

Da prisão preventiva:

Entendo que, por ora, presentes estão os requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal para a prisão cautelar, em que dispõe que "a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado" (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019).

A Lei n. 12.403/2011 restringiu as hipóteses de decretação da custódia cautelar e reafirmou o mandamento constitucional segundo o qual a prisão preventiva é medida excepcional. Assim, não se nega que a prisão provisória é medida de exceção, a ser utilizada somente nas hipóteses previstas em lei. No entanto, essa é a hipótese dos autos.

A segregação cautelar deve estar devidamente fundamentada em fato concreto, capaz de indicar que o agente, em liberdade, possa comprometer a ordem pública, embaraçar a instrução criminal, ou subtrair-se à aplicação da lei penal.

Convém destacar, ainda, que segregação cautelar somente é admissível quando: 1) presentes os fundamentos/hipóteses para a prisão preventiva, quais sejam, garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, garantia da aplicação da lei penal e conveniência da instrução criminal [artigo 312 do Código de Processo Penal]; 2) presentes as condições estabelecidas no artigo 313 do Código de Processo Penal; e 3) não seja possível a sua substituição por nenhuma das medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal.

Desse modo, porque a prisão cautelar é medida de caráter excepcional, que implica sacrifício à liberdade individual, faz-se necessário o reconhecimento da presença dos pressupostos [fumus commisi delicti] - prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria -, e dos fundamentos/hipóteses para a prisão preventiva [periculum libertatis] - indicativos de atos concretos susceptíveis de prejuízo à ordem pública e econômica, à instrução penal e à aplicação da lei penal.

No caso específico, os pressupostos para a prisão preventiva [fumus commisi delicti] mostram-se presentes. No tocante à prova da existência do crime, observo que a materialidade desponta das provas que instruem os presentes autos digitais, em especial do Relatório de Investigação, depoimentos e os documentos que estão anexados no evento 1.

Além disso, as declarações apresentadas na fase indiciária reforçam a presença da materialidade do delito e nos dão indícios razoáveis da autoria por parte dos investigados MARIA FERNANDA FARIAS, DIEGO LEONARDO DA SILVA e JULIA POLINI GASTALDI.

Com efeito, a Policial Civil Jessica Luiza Longen, durante a lavratura do auto de prisão em flagrante de Nikolas May e Rafael da Silva, destacou como iniciaram as investigações e a participação dos ora representados nos crimes apurados:

Que nós recebemos, acerca [sic] de 2 semanas, na DIC informações, através de um depoimento protegido, dando conta que o Nikolas estaria fazendo a traficância de drogas no Município de Ituporanga e que ele teria auxílio de alguns terceiros, até mesmo para disfarçar esse envolvimento com comercialização de substâncias entorpecentes, uma vez que, recentemente, foi abordado na casa de um traficante, que foi preso também pela DIC de Ituporanga; que o Nikolas ele achava que talvez pudesse ser alvo de investigação da polícia civil e por isso ele acabava armazenando, de acordo com essa testemunha protegida, as drogas que ele buscava em outra cidade, na casa da menina conhecida como Julia Polini, uma amiga dele. Nessa residência, é um apartamento, moram a Julia, a Taissa e a irmã mais nova delas, são todas irmãs. Nas redes sociais todos eles expunham que realmente tinham laços próximos, estavam sempre juntos. De acordo com a testemunha protegida também, o Nikolas costumava buscar cerca de 30 a 50 gramas de cocaína para ter durante a semana, ele não pegava maiores quantidades que isso e dificilmente estava com boa parte dessa quantidade consigo, que deixava mais armazenado, principalmente no apartamento dessas meninas. E o Nikolas para toda essa movimentação ele sempre utilizou o veículo dele. Há cerca de alguns meses ele tinha um LOGAN e agora ele vendeu o LOGAN e comprou esse HONDA CIVIC, que é o veículo que ele utilizava para a traficância. A partir desse depoimento, nós realizamos campana, monitoramento, conseguimos informações com outras pessoas, relativamente próximas, que pudessem esclarecer algumas informações e confirmar algumas informações do depoimento protegido, que a gente conseguiu, que conseguimos, inclusive, ver a frequência que ele ia na casa Julia, e monitorando o movimento do veículo dele, ele vinha com certa frequência para Rio do Sul, chegou a ir para Florianópolis na semana passada e hoje nós recebemos a informação de que ele já estava sem drogas para fazer a comercialização, e que ele faria uma viagem novamente para buscar mais uma quantidade. Que na data de hoje, antes de ele ir, nós não tínhamos o conhecimento do destino, soubemos depois, através de outros informantes que ele iria para região de TIMBÓ, ASCURRA buscar, talvez essas informações a gente consiga esclarecer com análise dos celulares, caso a gente consiga a quebra de sigilo, enfim. Ele foi para essa região, conforme a gente viu nos sistemas que temos disponíveis, saiu de Ituporanga no início da noite, chegou ali em Apiúna, passou Ascurra, passou um curto período sem ser captado por outros sistemas, e logo em seguida já estava retornando. Foi quando então os policiais 20ª DRP, não só da DIC, em razão do pouco efetivo, nós nos reunimos ali na Delegacia, comunicamos à Autoridade Policial responsável lá de Ituporanga, Dra. Elizabete, e organizamos ali uma operação para fazer a abordagem desse veículo, quando estivesse retornando para Ituporanga, uma vez que as informações davam conta de que ele estaria trazendo droga para comercialização ao longo da semana ali ou das próximas 2 semanas. Conseguimos fazer esse monitoramento, quando ele estava se aproximando, fizemos a abordagem no portal de Ituporanga e de pronto vimos que o Nikolas realmente estava no carro, era o carro dele mesmo, o HONDA CIVIC, que está no nome dele, quem estava dirigindo, no entanto, era a pessoa conhecida como "buganha", o nome dele é Rafael da Silva, é uma pessoa conhecida já por tráfico, associação...

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