Acórdão Nº 5002604-83.2021.8.24.0092 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 04-05-2023

Número do processo5002604-83.2021.8.24.0092
Data04 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5002604-83.2021.8.24.0092/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002604-83.2021.8.24.0092/SC



RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA


APELANTE: LEO MAURO XAVIER FILHO (EMBARGANTE) ADVOGADO: LIANDRA NAZARIO NOBREGA (OAB SC021807) ADVOGADO: ANDERSON NAZÁRIO (OAB SC015807) APELADO: BANCO VOLKSWAGEN S.A. (EMBARGADO) ADVOGADO: ALBERTO IVAN ZAKIDALSKI (OAB PR039274)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo embargante-executado, Leo Mauro Xavier Filho, da sentença (evento 34) de lavra do Juízo de Direito da 1ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, Dra. Lucilene dos Santos, que julgou improcedentes os embargos que opôs à execução de título extrajudicial (cédula de crédito bancário) movida por Banco Volkswagen S.A..
O embargante-executado sustenta, em suas razões recursais, que o crédito objeto da execução encontra-se inscrito na relação de credores da ação de recuperação judicial da devedora principal, Biguaçú Transportes Coletivos Adm e Part Ltda., autuada sob o nº 5052498-75.2020.8.24.0023, e o pagamento vai ser realizado por meio do plano de recuperação.
Defende que, uma vez que a homologação do plano de recuperação judicial traz como consequência direta a novação da dívida, conforme art. 59 da Lei nº 11.101/2005, "a execução deve ser julgada extinta por perda superveniente do interesse de agir, haja vista ter como objeto créditos já devidamente habilitados".
Sustenta, outrossim, que é parte ilegítima para responder pelo pagamento do saldo devedor da cédula de crédito bancário exequenda, pois há necessidade de comprovação da tentativa prévia cobrança do devedor principal, para que seja possível demandar o devedor solidário.
Acrescenta que, em decisão proferida nos autos da recuperação judicial, houve ordem de suspensão das execuções ajuizadas contra a devedora principal, estendendo-se o benefício aos sócios que são devedores solidários da sociedade empresária.
Aduz, ainda, as seguintes teses:
(a) carência da ação, por ausência de assinatura de testemunhas no título;
(b) ausência dos extratos bancários e deficiência do demonstrativo de débito apresentado pelo exequente;
(c) ausência de provas da disponibilização do crédito e da notificação da devedora principal;
(d) aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e possibilidade de revisão do contrato;
(e) inversão do ônus da prova, sendo indispensável "a juntada, pelo Apelado, dos extratos bancários referentes à cédula de crédito, desde a data da emissão do contrato originário em que se funda a execução até os dias atuais, especialmente as alterações contratuais e renovações".
(f) abusividade dos juros remuneratórios; e
(g) descaracterização da mora.
Pautou-se pelo provimento do recurso (evento 41).
Foram ofertadas contrarrazões (evento 51).
Este é o relatório

VOTO


I. Tempestividade e preparo recursal
Constata-se que o recurso de apelação é tempestivo e que a parte apelante promoveu o recolhimento do preparo recursal (eventos 16, 20 e 21).
II. Caso concreto
Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto pelo embargante-executado, Leo Mauro Xavier Filho, da sentença (evento 34) de lavra do Juízo de Direito da 1ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, Dra. Lucilene dos Santos, que julgou improcedentes os embargos que opôs à execução de título extrajudicial (cédula de crédito bancário) movida por Banco Volkswagen S.A..
O embargante-executado sustenta, em suas razões recursais, que o crédito objeto da execução encontra-se inscrito na relação de credores da ação de recuperação judicial da devedora principal, Biguaçú Transportes Coletivos Adm e Part Ltda., autuada sob o nº 5052498-75.2020.8.24.0023, e o pagamento vai ser realizado por meio do plano de recuperação.
Defende que, uma vez que a homologação do plano de recuperação judicial traz como consequência direta a novação da dívida, conforme art. 59 da Lei nº 11.101/2005, "a execução deve ser julgada extinta por perda superveniente do interesse de agir, haja vista ter como objeto créditos já devidamente habilitados".
Sustenta, outrossim, que é parte ilegítima para responder pelo pagamento do saldo devedor da cédula de crédito bancário exequenda, pois há necessidade de comprovação da tentativa prévia cobrança do devedor principal, para que seja possível demandar o devedor solidário.
Acrescenta que, em decisão proferida nos autos da recuperação judicial, houve ordem de suspensão das execuções ajuizadas contra a devedora principal, estendendo-se o benefício aos sócios que são devedores solidários da sociedade empresária.
Aduz, ainda, as seguintes teses:
(a) carência da ação, por ausência de assinatura de testemunhas no título;
(b) ausência dos extratos bancários e deficiência do demonstrativo de débito apresentado pelo exequente;
(c) ausência de provas da disponibilização do crédito e da notificação da devedora principal;
(d) aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e possibilidade de revisão do contrato;
(e) inversão do ônus da prova, sendo indispensável "a juntada, pelo Apelado, dos extratos bancários referentes à cédula de crédito, desde a data da emissão do contrato originário em que se funda a execução até os dias atuais, especialmente as alterações contratuais e renovações".
(f) abusividade dos juros remuneratórios; e
(g) descaracterização da mora.
Passo ao exame das insurgências.
(a) recuperação judicial da emitente e ilegitimidade passiva do embargante-executado
É oportuno ressaltar que o embargante-executado subscreveu a cédula de crédito bancário objeto da ação de execução na condição de devedor solidário, razão pela qual se obrigou pelo pagamento do valor integral do débito, conforme estabelece o artigo 275 do Código Civil, in verbis:
Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.
Parágrafo único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores.
Aliás, é a lição de José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo:
[...] Sob a ótica externa (auberhalb) e com o foco voltado para a relação processual, o devedor solidário poderá ser demandado pela integralidade da prestação. Corretamente, a jurisprudência firmou-se no sentido de que "não há litisconsórcio necessário nos casos de responsabilidade solidária, sendo facultado ao credor optar pelo ajuizamento da ação contra um, alguns ou todos os responsáveis" (STJ, REsp 1625833/PR, rel. Min. Benedito Gonçalves, 1.ª T., j. 06.08.2019). [...] (Código Civil comentado [livro eletrônico]: Com jurisprudência selecionada e enunciados das Jornadas do STJ sobre o Código Civil. 3. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021).
Na mesma linha de raciocínio, lecionam de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:
[...] Solidariedade passiva. "A solidariedade passiva é um meio de que o sistema jurídico privado municia os agentes econômicos visando uma facilidade e mesmo uma garantia de pagamento mais efetiva. Podem os credores demandar o cumprimento da obrigação, mediante desempenho da prestação, de um só ou de todos os devedores, em litisconsórcio (CPC/1973 77) [CPC 130]. A unidade do vínculo é muito forte, nada obstante a pluralidade subjetiva" (Nery. Soluções Práticas², v. VI, n. 109, p. 528). [...] (Código civil comentado [livro eletrônico]. 3. ed. rev., atual. e ampl. até 03.06.2019. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019).
Assim, convencionada a solidariedade passiva no título exequendo, a obrigação pode ser exigida por inteiro de qualquer um dos devedores solidários, não sendo exigida prévia tentativa de cobrança da devedora principal.
O artigo 49, §1º, da Lei 11.101/05 estabelece que "Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso".
Este entendimento coaduna-se com o do Superior Tribunal de Justiça de que "[...] muito embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias, de regra, são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral" (STJ, REsp nº 1.326.888-RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 08.04.2014).
No mesmo sentido é a Súmula nº 581 do STJ: "a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória".
Ocorrendo o pagamento da dívida pelo devedor principal durante o cumprimento do plano de recuperação judicial, caberá ao exequente informar na execução, podendo o embargante-executado, igualmente, comprovado o adimplemento, pleitear o abatimento do saldo devedor ou mesmo a extinção da execução, na hipótese de liquidação total da dívida:
[...] O credor com garantia de terceiro (v.g., aval, fiança etc.), mesmo sujeitando-se aos efeitos da recuperação, pode executar o garantidor. Um exemplo facilitará o entendimento: suponha-se uma limitada que emitiu uma promissória em favor de qualquer credor, tendo o sócio dessa limitada (ou qualquer terceiro) avalizado o título. Mesmo que o crédito esteja sujeito aos efeitos da recuperação, o credor pode executar o avalista. Deverá cuidar para, recebendo qualquer valor em qualquer das ações, comunicar nos autos da outra tal recebimento. Nesse caso (aval pleno), não há, por óbvio, qualquer limite ao valor em execução, ante a autonomia das relações cambiais. A propósito, a Súmula 581 do STJ diz: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra...

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