Acórdão Nº 5002649-36.2020.8.24.0282 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 19-10-2021

Número do processo5002649-36.2020.8.24.0282
Data19 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002649-36.2020.8.24.0282/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

APELANTE: GERUSA DA ROSA MALINOSKI DE JESUS (AUTOR) APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Gerusa da Rosa Malinoski de Jesus em face da sentença proferida pelo MM. Juízo da 1ª Vara da comarca de Jaguaruna que, nos autos da "ação de revisional de juros com pedido de tutela de urgência antecipada e produção antecipada de prova" movida contra Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A, assim decidiu, verbis:

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, inciso I, do CPC.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC). (evento 31).

Em suas razões defende, em síntese, que: os juros remuneratórios devem ser limitados com base no chamado período da normalidade, taxa média de mercado estipulada pelo BACEN; a capitalização de juros em operações realizadas por instituições financeiras somente é admissível se houver cláusula expressa e clara incumbindo ao credor demonstrar a sua existência; é ilegal a cobrança das tarifas de cadastro e de avaliação do bem; diante a má-fé da Instituição Ré em não permitir à possibilidade do pagamento do IOF a vista, requer a devolução em dobro dos valores cobrados a maior; permanecendo saldo favorável ao demandante após a compensação dos valores pagos com os valores em aberto, é plenamente justificável o deferimento da repetição do indébito em sua forma dobrada (evento 49).

Contrarrazões ao evento 59 onde defende a recorrida o não conhecimento do recurso por ofensa ao princípio da dialeticidade.

É o relatório.

VOTO

De início, vale esclarecer que tanto a publicação da decisão recorrida quanto a interposição deste recurso sucedem a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), que se deu em 18/3/2016.

Logo, os pressupostos de admissibilidade recursal devem observar o regramento disposto no Código de Processo Civil de 2015, segundo estabelecido no Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

Insurge-se a recorrida em sede de preliminar apresentada em contrarrazões, defendendo o não conhecimento do recurso por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal.

Descabida a tese, porquanto verifico que a recorrente impugnou os fundamentos do decisum recorrido no tocante às cláusulas contratuais consideradas abusivas, como também à possibilidade de repetição do indébito.

Logo, não há como concluir que as razões recursais são dissociadas do conteúdo da decisão combatida e, sendo assim, refuta-se a preliminar arguida.

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

Insurge-se a autora defendendo que os juros remuneratórios pactuados são abusivos, motivo pelo qual devem ser limitados à média divulgada pelo Bacen para operações de mesma natureza e mesmo período.

A Corte Superior, no âmbito do julgamento do recurso especial representativo da controvérsia, REsp n. 1.061.530, firmou a seguinte orientação:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado. Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade. Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. PRELIMINAR O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento definitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17/00, reeditada sob o n.º 2.170-36/01. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em Concreto. (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

Esta Câmara, seguindo esse norte, tem entendido não haver, em regra, abusividade na contração de taxa de juros remuneratórios superior à média de mercado em até 10%.

Em análise à Cédula de Crédito Bancário firmada entre as partes verifico que os juros remuneratórios foram pactuados com índice de 2,34% a.m. e de 31,96% a.a. (evento 1, CONTR10).

As taxas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central do Brasil no período de sua respectiva contratação, março de 2020, para operações desta mesma natureza (taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - pessoas físicas - aquisição de veículos - série 25471; taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - pessoas físicas - aquisição de veículos - série 20749) foram, respectivamente, de 1,51% a.m. e de 19,76% a.a.

Logo, considerando que as taxas contratadas ultrapassam 10% do índice médio praticado pelo mercado, merece ser reformada a sentença para reconhecer a abusividade dos juros remuneratórios e determinar sua limitação à média divulgada pelo Bacen.

Sobre o assunto, extraio precedentes deste Órgão Fracionário:

APELAÇÃO CÍVEL. CPC/2015. REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DA RÉ. JUROS REMUNERATÓRIOS, JUROS DE MORA E MULTA CONTRATUAL NO PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA. MATÉRIA NÃO DISCUTIDA NOS AUTOS. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL NO PONTO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ÍNDICE PACTUADO QUE NÃO SUPERA A MÉDIA DE MERCADO EM MAIS DE 10%. RECURSO DO AUTOR. TESES: GRATUIDADE DA JUSTIÇA, VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR, ONEROSIDADE EXCESSIVA, FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA, APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEMAS DECIDIDOS SEGUNDO OS INTERESSES DO APELANTE. CARÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada (Súmula 541 do STJ). ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. READEQUAÇÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. RECURSO DA RÉ CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, PROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 0801157-04.2013.8.24.0057, de Santo Amaro da Imperatriz, rel. Des. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 04-06-2019) (grifei).

E:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL E DEMANDA DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA ÚNICA. INCONFORMISMO DE AMBOS OS CONTENDORES. DIREITO INTERTEMPORAL. DECISÃO PUBLICADA EM 11-2-19. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. JUSTIÇA GRATUITA. CONSUMIDORA QUE PUGNA PELA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. BENESSE JÁ DEFERIDA PELO JUÍZO A QUO. ENFOQUE VEDADO. AUTORA DA DEMANDA REVISIONAL QUE ADVOGA A NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA, EM RAZÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INACOLHIMENTO. PROVAS NECESSÁRIAS À FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO ESTADO-JUIZ QUE SE ENCONTRAM CARREADAS AO FEITO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO DO PROCESSO NO ESTADO EM QUE SE ENCONTRA. INTELIGÊNCIA DO ART. 355, INCISO I, DO NOVO CPC. PREFACIAL REPELIDA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL N. 1.061.530/RS, DE QUE...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT