Acórdão Nº 5002653-03.2022.8.24.0024 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 20-04-2023

Número do processo5002653-03.2022.8.24.0024
Data20 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5002653-03.2022.8.24.0024/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: MARIA IZABEL DE LARA MARIAN (AUTOR)


RELATÓRIO


1.1) Da inicial
MARIA IZABEL DE LARA MARIAN ajuizou Ação Declaratória e Indenizatória em face de BANCO BMG S.A, alegando, em síntese, que buscou a casa bancária para realizar um mútuo bancário na modalidade de empréstimo consignado mas, para sua surpresa e sem seu conhecimento, fora pactuado um contrato de cartão de crédito consignado, com inclusão de reserva de margem consignável em seu benefício previdenciário. Falou, ainda, que a conduta do Banco lhe causou prejuízos materiais e morais.
Assim, pleiteou a concessão da tutela de urgência antecipada para que a parte ré se abstenha de reservar margem consignável (RMC) destinada ao cartão de crédito e de efetuar o respectivo desconto em seu benefício previdenciário.
Pugnou pela declaração de nulidade do negócio jurídico, pela repetição do indébito e pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Por fim, acostou documentos, requerendo a concessão da justiça gratuita e a procedência dos pedidos inaugurais.
1.2) Da contestação
Citada, a parte ré ofereceu contestação (evento 23) alegando, preliminarmente, a inépcia da inicial e a ocorrência de prescrição e decadência.
No mérito, defendeu que a parte autora solicitou a emissão de cartão de crédito, sendo lícitas todas as cláusulas pactuadas, bem como sua contratação. Falou sobre a legalidade do cartão de crédito com margem consignável, da inexistência de responsabilidade civil e de danos morais. Por fim, reiterou sobre a inexistência de prova do dano moral e pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.
1.3) Do encadernamento processual
Concedido o pedido de justiça gratuita (evento 16) e deferido o pedido de tutela de urgência antecipada.
Manifestação sobre a contestação (evento 32).
1.4) Da sentença
Prestando a tutela jurisdicional, a Dra. Sabrina Menegatti Pitsica proferiu sentença resolutiva de mérito (evento 34), nos seguintes termos:
Ante o exposto, com resolução de mérito, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para:
I - Declarar a nulidade da modalidade contratual apresentada (contrato de cartão de crédito consignado) e, por consequência, determinar que as partes voltem ao status quo ante, devendo os valores depositados na conta bancária da parte autora, atualizados monetariamente pelo INPC, ser compensados com a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente pela parte ré a título de RMC, atualizados monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso.
II - Condenar a parte ré a efetuar o pagamento em favor da parte autora, a título de danos morais, da quantia de R$ 5.000,00, acrescida de correção monetária pelo INPC a partir desta sentença e de juros de mora de 1% ao mês, a contar da data da inclusão dos descontos no benefício previdenciário da parte autora.
III - Confirmar a tutela de urgência deferida.
CONDENO a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios de sucumbência, os quais fixo em R$ 4.000,00, com fundamento no art. 85, §§2º, 8º e 8º-A, do Código de Processo Civil, conforme dispostos na Tabela de Honorários Advocatícios da OAB/SC1, item n. 227.4 (ação judicial movida pelo consumidor visando a nulidade de cláusulas abusivas constantes em contratos de consumo)2.
Registro que, embora haja condenação em valor estimável ou quantia certa, a aplicação da regra prevista no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil impõe a fixação de verba honorária em valor inferior ao da Tabela de Honorários Advocatícios da OAB/SC, referencial mínimo para fixação dos honorários advocatícios, o que implica na adoção do parâmetro estabelecido no art. 85, § 8º-A do Código de Processo Civil.
1.5) Do recurso
Irresignada, a parte ré interpôs recurso de Apelação Cível (evento 43), alegando a ocorrência de prescrição e decadência. No mérito, reiterou a existência do pacto e a legalidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como a ausência de danos morais e de valores a repetir. Alternativamente, discorreu sobre a necessidade de minorar a indenização fixada e falou que a devolução deve ser na forma simples. Assim, requereu a reforma do julgado.
1.6) Das contrarrazões
Presente (evento 52).
É o relatório

VOTO


2.1) Do objeto recursal
A discussão é sobre a validade do negócio jurídico entabulado entre as partes.
2.2) Do juízo de admissibilidade
Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, recolhido o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Das prejudiciais de mérito
2.3.1) Da prescrição
A discussão neste processo diz respeito essencialmente ao prazo prescricional aplicável a pretensão de declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de indenização por danos morais, originárias de contratos de reserva de margem consignáveis - RMC.
Pois bem, é indiscutível que tanto a pretensão declaratória, quanto o pedido condenatório, seja por repetição de indébito, seja por indenização por danos morais, advém da tese de inadimplemento contratual, decorrente de vício de consentimento, isto é, possuem a mesmo origem.
Sobre a prescrição nestas hipóteses, o Superior Tribunal de Justiça, por certo tempo, aplicou dois entendimentos distintos, um tomando o prazo quinquenal, consoante citado na decisão combatida, e outro com base no prazo decenal, na forma do artigo 205 do Código Civil.
Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, colocou fim a celeuma e uniformizou a incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual.
Vejamos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de...

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