Acórdão Nº 5002663-85.2023.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 11-05-2023

Número do processo5002663-85.2023.8.24.0000
Data11 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAção Penal - Procedimento Ordinário
Tipo de documentoAcórdão










Ação Penal - Procedimento Ordinário Nº 5002663-85.2023.8.24.0000/SC



RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER


AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: ODAIR JOSE MANNRICH RÉU: MARCIO PIRES DE MORAES RÉU: JONES RODRIGO GAUGER RÉU: JEFERSON LUIS RODRIGUES RÉU: DAVID DO PRADO RÉU: ANTONIO RODRIGUES RÉU: ALTEVIR SEIDEL RÉU: CRISTIANE RUON DOS SANTOS


RELATÓRIO


Neste egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Antônio Rodrigues, Jeferson Luis Rodrigues, Odair José Mannrich, Altevir Seidel, Cristiane Ruon dos Santos, Márcio Pires de Moraes, David do Prado e Jones Rodrigo Gauger, da seguinte forma:
1 INTROITO
A trama que serve de conteúdo à presente denúncia decorre das investigações desenvolvidas na denominada Operação Mensageiro e descreve o ingresso de ANTÔNIO RODRIGUES e de JEFERSON LUIS RODRIGUES na organização criminosa constituída por particulares ligados ao grupo empresarial Serrana (já denunciados nos Autos TJSC n. 500180809.2023.8.24.0000) e por outros agentes públicos, e, nesse caso,
especificamente, também os atos de corrupção desenvolvidos no âmbito do município de Balneário Barra do Sul.
2 BREVE HISTÓRICO DA INVESTIGAÇÃO
Os fatos ilícitos aqui narrados, sob o ângulo cronológico, vieram ao conhecimento do Ministério Público no curso da chamada Operação Et Pater Filium, capitaneada pela Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, com o apoio do Grupo Especial Anticorrupção do Ministério Público (GEAC) e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO).
Após encetada a Fase 4 da citada perquirição, o investigado ADELMO ALBERTI, à época, Prefeito de Bela Vista do Toldo, procurou voluntariamente o Ministério Público, a fim de manifestar o interesse em colaborar com as investigações.
Surgiu, então, a colaboração premiada homologada no dia 5 de novembro de 2021, por meio da qual ADELMO ALBERTI confessou a coautoria nos atos denunciados nas ações penais já desencadeadas em seu desfavor na Operação Et Pater Filium e trouxe relevantes dados e provas de corroboração sobre as atividades da correlata organização criminosa e as infrações penais por ela praticadas (Autos TJSC n. 5055615-12.2021.8.24.0000).
Indo além, conforme as disposições previstas na Lei n. 12.850/13 e demais normativas pertinentes, o colaborador revelou a existência de outros delitos contra a administração pública, nem todos conexos ao enredo da Operação Et Pater Filium, levados a efeito por si próprio, enquanto Prefeito de Bela Vista do Toldo, e por outros Chefes de Poder Executivo de cidades da região, todos em concurso de agentes públicos e particulares.
Assim é que, ADELMO ALBERTI, Prefeito Municipal muito bem articulado na política da região e experiente, já no curso do seu quarto mandato, por meio de relato firme, coerente e minucioso, no Anexo 4 da sua colaboração premiada, desvelou um vultoso esquema criminoso envolvendo as empresas do Grupo Serrana em Bela Vista do Toldo e outros municípios do Planalto Norte catarinense, no ambiente dos contratos relacionados aos serviços de coleta, transporte e destinação final do lixo.
De início, a verossimilhança das informações trazidas pelo colaborador foi avaliada pelo Relatório Conjunto de Verificação Preliminar de Informações de Colaboração Premiada n. 001/2021/GEAC/GAECO/JOIN, produzido em conjunto pelo Grupo Especial Anticorrupção (GEAC) e pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (GAECO).
Ato contínuo, colheu-se autorização desse e. Tribunal de Justiça de Santa Catarina para instaurar nova investigação, pois havia suspeita do cometimento de crimes por Prefeitos Municipais durante o exercício do mandato atual e relacionados às respectivas funções, o que foi anuído pela 5ª Câmara Criminal, em decisão dessa e. Relatora (Autos TJSC n. 5063871-41.2021.8.24.0000).
Passando a tramitar no bojo do Procedimento Investigatório Criminal n. 06.2021.00004889-5, a partir de 2 de dezembro de 2021, a apuração evoluiu, precipuamente em decorrência de medidas cautelares postuladas pelo Ministério Público e deferidas por essa e. Corte de Justiça, a exemplo (I) do afastamento de sigilo de dados telefônicos, telemáticos, bancários e fiscais (Autos TJSC n. 5012407-41.2022.8.24.0000) e (II) da interceptação de comunicações telefônicas e fluxos telemáticos, além da autorização para uso de equipamento de rastreamento e ação controlada (Autos TJSC n. 5031166-53.2022.8.24.0000).
Os elementos probatórios foram ainda robustecidos por duas novas colaborações premiadas oriundas da Operação Et Pater Filium, obtidas de maneira independente, e também homologadas pelo Poder Judiciário catarinense. Nesse contexto, GILBERTO DOS PASSOS (ex-Prefeito de Canoinhas) e Diogo Carlos Seidel (servidor público do Município de Canoinhas) voluntariamente procuraram o Ministério Público para confessar suas participações em crimes cometidos contra a Administração Pública canoinhense e, no recorte que importa a esta peça inaugural, na trama que abrange os contratos alusivos aos serviços de lixo prestados pelo Grupo Serrana (Autos TJSC ns. 5006758-50.2022.8.24.0015 e 5004609-81.2022.8.24.0015).
Toda narrativa trazida pelos colaboradores foi reafirmada e aprofundada por meio de informações, dados, diligências de campo e documentos compilados em Relatórios lavrados pelo GEAC e pelo GAECO, os quais findaram por evidenciar que o arranjo delitivo tinha abrangência muito maior que a primordialmente observada.
Em suma, a investigação identificou a existência de um mecanismo de enormes proporções, engendrado para a prática reiterada de fraude a licitações, corrupção ativa e passiva, desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro (pelo menos), propulsor de uma organização criminosa encabeçada pelo Grupo Serrana e integrada por Prefeitos
Municipais e agentes públicos de diversas regiões do Estado de Santa Catarina, tendo como pano de fundo contratações de serviços públicos essenciais à população, sobretudo relacionadas à coleta, ao transporte e à destinação final de resíduos sólidos das cidades.
Nessa toada e considerando a necessidade premente de estancar a sangria dos cofres públicos operada pela torpe e grandiosa engrenagem, o Ministério Público então manejou pedidos de busca e apreensão em 109 (cento e nove) alvos, requerendo, ainda, a prisão preventiva de 16 (dezesseis) dos investigados (Autos TJSC n. 5067831-68.2022.8.24.0000; Autos TJSC n. 5070005-50.2022.8.24.0000; e Autos TJSC n. 5070656-82.2022.8.24.0000).
Além disso, com os olhos postos na repercussão financeira dos delitos, para assegurar o ressarcimento ao erário e porque o crime não pode compensar, lançou pedidos de medidas assecuratórias de bloqueios de bens e valores (Autos TJSC n. 5069313-51.2022.8.24.0000).
Acolhidas as demandas ministeriais, em cumprimento aos respectivos mandados judiciais expedidos pela Exma. Desa. Rel. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, no dia 6 de dezembro de 2022, foi deflagrada a Operação Mensageiro, palco genuíno da denúncia ora veiculada.
Enfim, e sem prejuízo dos subsídios obtidos no curso da investigação e na deflagração da operação, sobrevieram as colaborações premiadas de ODAIR JOSÉ MANNRICH, MÁRCIO ANDRÉ SAVI, MÁRCIO PIRES DE MORAES, JOEL ALVES, DIOHN DO PRADO, ALTEVIR SEIDEL e CRISTIANE RUON DOS SANTOS, devidamente homologadas por esse Juízo, que confessaram as práticas criminosas aqui narradas, apresentaram importantes provas de corroboração e revelaram valiosos aspectos da organização criminosa em voga.
Para facilitar o processamento do feito, diante da imensidão de delitos perpetrados e da correspondente ramificação territorial, vale esclarecer que o objeto da presente exordial restringe-se a duas vertentes específicas, quais sejam: a) a organização criminosa desmantelada, naquilo que concerne, exclusivamente, ao braço público alusivo ao município de Balneário Barra do Sul; e b) os delitos de corrupção ativa e de corrupção passiva já identificados no enredo das licitações e contratos desta mesma cidade.
Os outros crimes praticados pela organização criminosa, também apurados no decorrer da Operação Mensageiro, apesar de conexos, serão objeto de denúncias distintas, considerando que foram praticados em circunstâncias de tempo, lugar e envolvendo agentes públicos diferentes, e em razão do número excessivo de acusados (art 80 do CPP), evitando-se tumulto processual e em homenagem à razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF).
3 DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
3.1 Funcionamento Básico e Eixo Empresarial
A investigação revelou a existência de um agigantado mecanismo criminoso arquitetado e posto em prática a partir do Grupo Serrana, ao menos desde o ano de 2014 até o dia 6 de dezembro de 2022, em uma conjugação intersubjetiva de esforços entre integrantes desse conjunto empresarial, associados a agentes públicos de diversas cidades catarinenses, de maneira estável, permanente, estruturada e com divisão de tarefas.
O grupo delituoso objetivava reiteradamente obter, direta e indiretamente, vantagens indevidas, mediante a prática de crimes para assegurar, manter e perpetuar contratações públicas, dali extrair dividendos ilídimos e exacerbados e, ainda, propiciar boa relação e posição privilegiada da Serrana nos municípios e perante agentes públicos corruptos. As atividades criminosas ocorriam primordialmente no cenário dos serviços de coleta e destinação de resíduos sólidos (e se difundiam também na área de águas e saneamento e iluminação pública), viabilizando-se pelo acerto e pagamento de propina, repassada em dinheiro em espécie para Prefeitos e servidores municipais estrategicamente escolhidos para compor o grupo, especialmente por meio da figura conhecida no meio público como o "Mensageiro da Serrana".
Trata-se, portanto, de organização...

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