Acórdão Nº 5002669-54.2020.8.24.0079 do Terceira Câmara de Direito Público, 15-02-2022

Número do processo5002669-54.2020.8.24.0079
Data15 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002669-54.2020.8.24.0079/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: BRUNA SCHULZ MOREIRA (AUTOR) APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Bruna Schulz Moreira em desfavor da sentença proferida nos autos da Ação Acidentária n. 5002669-54.2020.8.24.0079, ajuizada pela ora Apelante em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual o Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Videira julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil (Evento 62, autos de origem).

A Autora objetiva, com a interposição do apelo, a desconstituição do julgado, com a consequente análise do mérito e o acolhimento da sua pretensão, no sentido de obter a concessão de auxílio-acidente. Para tanto, defende a desnecessidade de prévio requerimento administrativo para postular o benefício de auxílio-acidente em juízo, ao passo que já gozou de auxílio-doença acidentário em razão da mesma lesão. Ademais, aduziu que a sentença vai de encontro ao entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Especial n. 631.240/MG (Tema 350/STF) (Evento 71, autos de origem).

O Apelado não apresentou contrarrazões (Evento 76, autos de origem).

Este é o relatório.

VOTO

A Apelante é dispensada do recolhimento do preparo recursal, tendo em vista isenção prevista no art. 129, parágrafo único, da Lei 8.213/1991. Ademais, o recurso é tempestivo e adequado bem como foram preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual comporta conhecimento.

A demanda de origem, como visto, versa sobre Ação Acidentária ajuizada por Bruna Schulz Moreira em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social, visando a concessão de auxílio-acidente.

A Autora relata a ocorrência de acidente de trabalho no dia 14-7-2010, no qual sofreu amputação da falange distal do quinto dedo da mão esquerda, tendo permanecido afastada do seu serviço, recebendo auxílio-doença, no período compreendido entre 30-7-2010 e 30-10-2010. Prosseguiu afirmando que, em pese a cessação do benefício, a redução da sua capacidade laborativa subsistiu, razão pela qual ingressou com a presente ação, a fim de obter a concessão de auxílio-acidente (Evento 1, autos de origem).

Apresentada a contestação pelo Réu, na qual foi impugnado o pedido da parte autora, bem como realizada a prova pericial (Eventos 18 e 35, autos de origem), o Instituto Nacional do Seguro Social peticionou nos autos requerendo a extinção do feito, sem resolução do mérito, por ausência de interesse processual, tendo em vista a inexistência de prévio requerimento administrativo (Evento 41, autos de origem).

Na sequência, o Magistrado singular julgou extinto o feito, sem resolução do mérito (art. 485, inc VI, do Código de Processo Civil), nos seguintes termos (Evento 62, autos de origem):

[...] Em síntese, para que haja o conhecimento da ação judicial proposta é necessário que a parte autora demonstre ter formulado prévio requerimento administrativo para concessão do benefício, bem como ter havido negativa do INSS ou demora de mais de 45 dias para decisão/resposta, ou se tratar de matéria sobre a qual o INSS tem posição manifestamente contrária ao pedido feito pelo segurado.

Logo, em regra, quando inaugurada a relação entre o segurado e a autarquia, é dispensado o prévio requerimento administrativo.

Por outro lado, "Decorridos cinco anos da cessação do pagamento do auxílio-doença, o pedido judicial de sua conversão em auxílio-acidente depende de prévio requerimento administrativo" (Ata n. 217 de 14-10-2020).

Portanto, faz-se necessário analisar as peculiaridades de cada caso concreto.

In casu, a autora sofreu acidente de trabalho e, em razão disso, usufruiu auxílio-doença, circunstância que, aparentemente, afastaria a necessidade de formular requerimento administrativo.

Contudo o benefício do auxílio-doença foi cessado em 30.10.2010 e não há provas de que a autora tenha postulado qualquer novo benefício junto à autarquia e, apenas no dia 07.05.2020 ajuizou a presente demanda, ou seja, quase 10 (dez) anos depois da cessação do auxílio-doença.

Assim, diante do lapso decorrido entre o início da relação jurídica entre as partes e o ajuizamento da ação, não há como afirmar que a autarquia teve ciência das consequências atuais das lesões que acometem a segurada.

Consideradas essas circunstâncias, em harmonia com o recente entendimento da Corte Catarinense, a autora deve necessariamente fazer novo requerimento administrativo para, apenas na hipótese de ser negado, ingressar com demanda judicial. Veja-se:

APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO E CIVIL. AÇÃO ACIDENTÁRIA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. BENEFÍCIO ANTERIOR. CESSAÇÃO HÁ MUITO. AUSÊNCIA. - EXTINÇÃO SEM MÉRITO NA ORIGEM. RECURSO DO AUTOR. (1) PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. TEMA 350/STF. BENEFÍCIO ANTERIOR CESSADO HÁ NOVE ANOS. PRETENSÃO RESISTIDA NÃO CONFIGURADA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. IRRESIGNAÇÃO AFASTADA. - O Supremo Tribunal Federal assentou, em sede de repercussão geral (Tema 350), que: a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, mas na mesma oportunidade a tese fixada apresentou exceções à regra, como "na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração [...]" (RE 631240/MG, rel. Min Roberto Barroso, j. em 3-9-2014; destaquei). - In casu, o quadro de incapacidade arguido neste momento não foi submetido ao prévio conhecimento do INSS, pois o último benefício percebido cessou há mais de 9 (nove) anos - a contar do ajuizamento da ação. Assim, pelo longo lapso temporal transcorrido, necessário o requerimento administrativo atual a configurar o interesse processual do acionante. (2) HONORÁRIOS RECURSAIS. PRESSUPOSTOS AUSENTES. DESCABIMENTO. - Ausente um dos pressupostos processuais incidentes, qual seja, a fixação de honorários na origem, não se aplica a verba recursal. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000593-13.2019.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Henry Petry Junior, Segunda Câmara de Direito Público, j. 28-07-2020).

[...] Diante do exposto, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil, JULGO EXTINTO o processo, sem resolução do mérito, em razão da falta de interesse de agir da parte autora.

Sem condenação da parte ativa ao pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios, em razão da isenção de sucumbência para as demandas acidentárias, estabelecida no art. 129, parágrafo único, da Lei 8.213/1991 (cf. Súmula 110/STJ: A isenção do pagamento de honorários advocatícios, nas ações acidentárias, é restrita ao segurado").

Incabível, ainda, o ressarcimento dos honorários periciais, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Irresignada, Bruna Schulz Moreira interpôs o recurso de Apelação Cível ora em análise, visando, inicialmente, o afastamento da preliminar de ausência de interesse agir, tendo em vista a prescindibilidade do prévio requerimento administrativo em hipóteses como a presente, nas quais o obreiro objetiva a concessão de auxílio-acidente precedido de auxílio-doença decorrente do mesmo fato e, em consequência, a desconstituição da sentença extintiva.

Também pugnou pelo acolhimento da sua pretensão. Nesse sentido, elucidou que se trata de causa madura para julgamento, ao passo que já foi concluída a fase instrutória, aplicando-se ao caso em comento o regramento previsto no art. 1.013, § 3º,do Código de Processo Civil.

Razão assiste à Apelante, conforme se verá a seguir.

1. Da preliminar de ausência de interesse processual:

É cediço que a matéria referente à necessidade de prévio requerimento administrativo como pressuposto para postular em juízo benefício previdenciário ou acidentário foi pacificada no Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Especial n. 631.240/MG (Tema 350/STF), que assentou a seguinte tese de repercussão geral:

I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;II - A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;III - Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;IV - Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que...

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