Acórdão Nº 5002673-71.2019.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 26-10-2022

Número do processo5002673-71.2019.8.24.0000
Data26 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Público
Classe processualMandado de Segurança Cível (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão
Mandado de Segurança Cível (Grupo Público) Nº 5002673-71.2019.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

IMPETRANTE: PAULO HENRIQUE NAVARRO MEYER IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA IMPETRADO: Corregedor-Geral - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis IMPETRADO: Corregedor-Geral do Foro Extrajudicial - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis

RELATÓRIO

Paulo Henrique Navarro Meyer impetrou Mandado de Segurança contra ato supostamente ilegal atribuído ao Corregedor-Geral da Justiça do Foro Extrajudicial do Estado de Santa Catarina, que modificou sua qualidade de interventor para interino da Escrivania de Paz do Distrito de Boa Vista, comarca de Joinville/SC, retroativamente à data do falecimento do titular da Serventia, seu pai, Ruy Meyer.

Postulou liminar consubstanciada na suspensão imediata do ato coator e o sobrestamento das prestação de contas nºs 0011047-68.2019.8.24.0710, 0011953.58.2019.8.24.0710 e 00111924-08.2019.8.24.0710, que tramitam perante Corregedoria-Geral da Justiça do Foro Extrajudicial de Santa Catarina.

Ao final, requereu a concessão definitiva da ordem a fim de que seja cassado o ato impetrado, garantido seu direito líquido e certo de ser considerado interventor durante todo o período em que respondeu pela Escrivania de Paz, em respeito à decisão que o nomeou interventor na Mandado de Segurança n. 4017484-58.2016.8.24.0000, bem como sejam, afastados todos os consectários da interinidade ilegalmente declarada pela autoridade impetrada.

A análise da liminar foi postergada.

O Estado de Santa Catarina manifestou interesse em ingressar no feito.

Foram prestadas informações pela autoridade coatora, apontando as razões pelas quais se decidiu pela alteração da qualidade do Impetrante de interventor para interino, com amparo nas orientações do Conselho Nacional de Justiça, objeto da Meta 15, concretizada no Provimento n. 77/2018.

A liminar foi indeferida (Evento 22).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador de Justiça João Fernando Quagliarelli Borrelli, manifestou-se pela denegação da segurança.

Formulou-se novo pleito liminar que desta vez fora deferido "apenas para obstar eventuais cobranças provenientes dos processos de prestação de contas, indicados no Evento 28 - OUT4".

É o breve relatório.

VOTO

Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por Paulo Henrique Navarro Meyer contra ato supostamente ilegal atribuído ao Corregedor-Geral da Justiça do Foro Extrajudicial do Estado de Santa Catarina.

Narrou que, por força de decisão proferida nos autos do Mandado de Segurança n. 4017484-58.2016.8.24.0000, em 15.12.2016, foi nomeado interventor da Escrivania de Paz do Distrito de Boa Vista, comarca de Joinville/SC, por ser o substituto legal de Ruy Meyer, seu genitor e titular da Serventia desde julho de 1965, tendo em vista seu afastamento das funções por ordem da Corregedoria-Geral da Justiça de Santa Catarina.

Extrai-se da decisão liminar da relatoria do eminente Des. Ricardo Roesler, no Mandado de Segurança n. 4017484-58.2016.8.24.0000, as justificativas para nomeação do Impetrante como interventor (Evento 1, Desp/Dec Partes 4, Eproc/PG):

Ao que se tem, em princípio, dos autos, instaurou-se processo administrativo disciplinar em face o titular da escrivania em questão, em razão de infrações, tais como, a cobrança de emolumentos em desacordo com o Regimento de Custas, o desrespeito aos prazos para a comunicação de casamentos e óbitos às serventias que possuem o registro primitivo, prática de atos fora da área de circunscrição da serventia, a negativa de prestação de serviço sem a formalização de documento escrito devidamente fundamentado, além de inúmeras outras irregularidades (pp. 466-469).

Ocorre que, em que pese a relevância da apuração feita pela Vice- Corregedoria, como também do laborioso parecer lavrado pelo Juiz Corregedor, não há elementos que, neste momento, impeçam a nomeação do substituto legal, ora impetrante. Inclusive, na Portaria n. 40/2016, que instaurou o PAD, não se justificou especificamente os motivos que ensejaram a mitigação da regra do art. 39, § 2º, da Lei n. 8.935/1994 ("Extinta a delegação a notário ou a oficial de registro, a autoridade competente declarará vago o respectivo serviço, designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso" - grifei).

Para escorar a preterição do substituto, mencionou-se, na portaria, apenas a existência de precedente (STJ, RMS n. 28.013/MG), que, em tese, autorizaria a nomeação direta de interventor.

No precedente em voga, decidiu-se que, em razão das peculiaridades do caso concreto, possível a preterição do substituto, em virtude do seu grau de parentesco com o titular, com a finalidade de proteger os princípios da impessoalidade e da moralidade. A propósito, constou da ementa:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARTÓRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AFASTAMENTO E PERDA DA DELEGAÇÃO. NOMEAÇÃO DE TERCEIRO COMO INTERVENTOR. PRETERIÇÃO DE SUBSTITUTO MAIS ANTIGO. POSSIBILIDADE. ATO DISCRICIONÁRIO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL E DE CRISE INSTITUCIONAL. PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E DA MORALIDADE.

1. Caso em que o titular de serventia extrajudicial, após suspensão de suas funções e afastamento para responder a procedimento disciplinar, perde a delegação.

2. É discricionário o ato da Administração Judiciária que, em vez de optar pelo substituto mais antigo, decide, nos termos do art. 36 da Lei 8.935/94, nomear terceira pessoa como interventor e, diante das peculiaridades do caso concreto (relação próxima de parentesco), manter, com base nos princípios da impessoalidade e da moralidade, a referida nomeação até o preenchimento definitivo da vaga.

Precedentes do STJ.

3. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança não provido. (RMS 28.013/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2010, DJe 03/08/2010) - (grifei).

No caso em destaque, o titular perdeu definitivamente a delegação. E, afora o precedente mencionado, nada de concreto se disse. Ao contrário, a fundamentação revelou-se genérica e lateral, suportando o impetrante o ônus da preterição, ao que se tem nesta fase inicial, exclusivamente por conta do seu grau de parentesco com o titular (pai-filho). Ocorre que o DNA não pode ser razão a escorar a subtração de sua função, pelo menos, repito, nesta fase de cognição sumária.

Outrossim, é garantia constitucional, que nenhuma pena passará da pessoa do condenado (CRFB, art. 5º, XLV). Conquanto, na hipótese, não se cuide de aplicação de pena, tendo em vista que o afastamento é cautelar, parece que houve a transferência da responsabilidade também ao impetrante unicamente pelo fato da proximidade de parentesco com o titular, uma vez que não há registro de ilegalidade cometida por ele.

Contudo, como dito, isso, no contexto até então constante dos autos, não pode ser considerado adequado sem que outros fundamentos sejam mais especificamente apresentados; mesmo porque, em alguns casos, a jurisprudência desta Corte autorizou, até mesmo, a nomeação de esposa de titular como interventora (MS n. 2014.028653-1, Rel. Des. Jorge Luiz de Borba).

Relativamente à legislação, haja vista não vislumbrar motivo que enseje a mitigação da regra geral, essa estabelece que, na vacância do cargo, deve ser nomeado o substituto legal. No particular, o art. 20, § 5º, da Lei n. 8.935/1994,

Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho.

[...]

§ 5º Dentre os substitutos, um deles será designado pelo notário ou oficial de registro para responder pelo respectivo serviço nas ausências e nos impedimentos do titular.

Ademais, a teor do que apregoa o art. 36, § 1º, da mesma norma:

Art. 36. Quando, para a apuração de faltas imputadas a notários ou a oficiais de registro, for necessário o afastamento do titular do serviço, poderá ele ser suspenso, preventivamente, pelo prazo de noventa dias, prorrogável por mais trinta.

§ 1º Na hipótese do caput, o juízo competente designará interventor para responder pela serventia, quando o substituto também for acusado das faltas ou quando a medida se revelar conveniente para os serviços.

[...]

Por derradeiro, o art. 39 da Lei em comento:

Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por:

[...]:

§ 2º Extinta a delegação a notário ou a oficial de registro, a autoridade competente declarará vago o respectivo serviço, designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso.

A legislação, como se vê, dispõe que, na falta do titular, deve assumir o seu substituto, salvo se contra ele também pesar as acusações relacionadas ao titular. Desse modo, no momento, não há como ratificar a argumentação da portaria, tal como posta.

Além disso, o perigo da demora é até intuitivo, tendo em vista se tratar da atividade profissional do substituto, da qual extrai o seu meio de subsistência (remuneração de caráter alimentar).

Por esses motivos, com fulcro na legislação apontada, e no art. 7º, III, da Lei n. 12.016/2009, uma vez ausente fundamentação adequada, defiro a liminar e determino a nomeação e investidura imediata do...

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