Acórdão Nº 5002675-24.2022.8.24.0004 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 26-01-2023

Número do processo5002675-24.2022.8.24.0004
Data26 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5002675-24.2022.8.24.0004/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: ANTONIO DE SOUZA COSTA (AUTOR) APELADO: BANCO CETELEM S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


Antonio de Souza Costa interpôs recurso de apelação cível, em face da sentença proferida pela juíza de direito, Dr. Lígia Boettger Mottola, da 1ª Vara Cível da Comarca de Araranguá, que julgou improcedentes os pedidos da "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada", ajuizada em face do Banco Cetelem S/A, nos seguintes termos:
ANTONIO DE SOUZA COSTA ingressou com ação em desfavor de BANCO CETELEM S.A. alegando que pretendia a contratação de empréstimo consignado, mas que lhe foi fornecido, de forma indevida, um contrato de cartão de crédito, com condições mais gravosas, de forma que o contrato deve ser anulado, com restituição dos valores. Sustentou ter experimentado danos morais em razão da atitude abusiva. Pediu a declaração de nulidade do contrato, a repetição dos valores e indenização por danos morais.
Deferida a gratuidade da justiça, ocasião em que foi postergada a análise da tutela e ordenada a citação (evento 6).
Em sede de contestação, a parte ré arguiu preliminares. No mérito, alegou que o contrato apontava claramente que se tratava de contratação de cartão de crédito, em razão do que a autora tinha plena ciência do negócio, reputando legal a contração. Enfatizou que a autora utilizou o crédito, não devendo ser acolhido o pleito de repetição, mas que em caso de procedência do pedido devem ser compensados os valores sacados pela autora. Asseverou inexistir ato ilícito a justificar a condenação por danos morais. Requereu a improcedência (evento 12). Juntou documentos.
Houve manifestação à contestação (evento 18).
Vieram os autos conclusos.
Este, em escorço suficiente, é o Relatório. Passo, pois, a decidir.
[...]
Diante do exposto, resolvo o mérito na forma do art. 487, I, do CPC, e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes que fixo em 10% sobre o valor da causa, cuja cobrança fica suspensa pelo prazo legal em face de litigar ao abrigo do benefício da Justiça Gratuita.
Ao Cartório para que atualize o cadastro dos autos, com remoção da pendência de apreciação de liminar/tutela de urgência.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Havendo a interposição de recurso, intime-se a parte apelada para apresentar contrarrazões no prazo legal e, observando-se o disposto no art. 1.010, §3º, do CPC, ascendam os autos ao E. Tribunal de Justiça, com as anotações de estilo.
Transitada em julgado, e cumpridas as formalidades, arquivem-se. (evento 20/1G)
Em suas razões recursais, o apelante sustentou, em síntese, que: a) foi induzido a erro na contratação do empréstimo consignado com desconto em seu benefício, com prazos certos e valores fixos, o que não teria ocorrido na hipótese em tela, haja vista que, no seu entender, todas as operações se assemelhavam a empréstimo consignado em benefício; b) nunca utilizou o cartão de crédito e nem mesmo o desbloqueou, inexistindo nas faturas anexadas quaisquer comprovação da sua utilização; c) possui mais de 60 anos de idade, sem estudos e com dificuldade de leitura, não se podendo exigir conhecimento acerca do tema, não havendo dúvida de que nunca desejou realizar qualquer operação com o cartão contratado, tratando-se, ainda, de contrato de adesão, no qual suas cláusulas não podem ser discutidas. Diante desses argumentos, requereu a reforma da sentença para que seja reconhecida como indevida a cobrança a título de reserva de margem consignável, condenando o apelado a restituir, em dobro, o apelante, as quantias pagas a este título e ao pagamento de indenização por danos morais (evento 23/1G).
Contrarrazões do recorrido, pugnando pelo não provimento do recurso (evento 29/1G).
Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça e foram redistribuídos a esta relatoria por sorteio.
Este é o relatório

VOTO


1. Exame de admissibilidade do recurso
Inicialmente, registre-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).
Assim, o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.
2. Fundamentação
2.1 (Ir)regularidade da operação contratada entre as partes
Insurge-se o apelante, justificando que não optou pela contratação de cartão de crédito consignável, o que gerou a reserva da margem consignável de seu benefício previdenciário e cobrança de encargos referentes à modalidade, das quais não houve informação a respeito, razão pela qual sustenta deva ser declarada nula a contratação de empréstimo via cartão de crédito, com a condenação do banco a repetição do indébito, bem como sua indenização por danos morais.
Contudo, razão não assiste ao recorrente.
A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).
As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):
Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.
[...]
Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:
I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1º;
II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;
III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;
IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;
V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e
VI - as demais normas que se fizerem necessárias.
[...]
§ 5º Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 6º A instituição financeira que proceder à retenção de valor superior ao limite estabelecido no § 5o deste artigo perderá todas as garantias que lhe são conferidas por esta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004) - grifou-se
Em relação aos aposentados e pensionistas do INSS, tais operações ainda se encontram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/08, que, ao tempo da contratação, estabelecia da seguinte forma:
[...]
Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que: (Alterado pela IN INSS/PRESS nº 39, de 18/06/2009).
[...] § 1º Os descontos de que tratam o caput não poderão exceder o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor da renda mensal do benefício, considerando que o somatório dos descontos e/ou retenções não exceda, no momento da contratação, após a dedução das consignações...

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