Acórdão Nº 5002737-67.2021.8.24.0079 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 23-09-2021

Número do processo5002737-67.2021.8.24.0079
Data23 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002737-67.2021.8.24.0079/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: BANCO CETELEM S.A. (RÉU) ADVOGADO: DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA (OAB SC051063) APELADO: JAIR GOMES MORAIS (AUTOR) ADVOGADO: ROBERTA WEBER (OAB SC032056) ADVOGADO: GUSTAVO BOGO VOLPATO (OAB SC048989)

RELATÓRIO

Banco Cetelem S.A interpôs recurso de apelação cível em face da sentença que, proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Videira, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor na "ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável cumulada com restituição de valores e indenização por danos morais".

Cuida-se, na origem, de "ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável cumulada com restituição de valores e indenização por danos morais" aforada por Jair Gomes Morais contra Banco Cetelem S/A, na qual pede o reconhecimento da inexistência de contratação de empréstimo consignado na modalidade de cartão de crédito, - ou, alternativamente, a conversão da operação impugnada para a de empréstimo consignado convencional -, bem como a condenação da instituição financeira ao ressarcimento dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, de maneira dobrada, e a condenação ao pagamento de danos morais, em razão da inexistência de contratação de reserva de margem consignada em seu benefício previdenciário, para contratação de cartão de crédito não solicitado.

Foi deferida a gratuidade da justiça requerida pela demandante (evento 4, autos do 1º grau).

Devidamente citado, o Banco Cetelem S/A apresentou contestação (evento 12, CONT1, autos do 1º grau), na qual defendeu, preliminarmente, a decadência do direito do autor. No mérito, alegou, inicialmente, a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda. Juntou o contrato firmado com a parte autora, comprovante de disponibilização do valor sacado do cartão de crédito, cópia das faturas do cartão de crédito emitidas durante o período da contratação.

Houve réplica (evento 15, autos do 1º grau).

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 23-06-2021 pelo magistrado Rafael Resende Britto, que julgou procedentes os pedidos formulados pelo autor, o que se deu nos seguintes termos (evento 18, autos do 1º grau):

3. DISPOSITIVO.

Posto isso, com fundamento no artigo art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial e, em consequência:

a) declaro nulo o termo de adesão n. 819392884 (evento 12, CONTR3);

b) condeno a parte ré a efetuar o pagamento ao autor dos valores cobrados indevidamente, em dobro, conforme demonstrativos juntados, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação e de correção monetária pelo INPC desde o dia de cada dispêndio, abatido o valor creditado à parte autora por força da avença, nos termos da fundamentação;

c) condeno a ré a efetuar o pagamento em favor do autor de indenização por danos morais na quantia de R$ 5.000,00, acrescida de juros de mora de 1% ao mês a contar da data do primeiro desconto indicado nos autos (evento 1, CARNE_INSS6) e de correção monetária pelo INPC a partir desta sentença.

Diante da sucumbência mínima da parte autora (artigo 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil), condeno a parte ré ao pagamento das despesas, custas processuais e dos honorários advocatícios em favor dos patronos da parte autora, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação atualizado pelo INPC, tratando-se de demanda simples, repetitiva e sem instrução processual (artigo 85, § 2°, do Código de Processo Civil).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se.

Inconformada, a instituição financeira interpôs recurso de apelação (evento 29, autos do 1º grau), no qual sustenta, em síntese, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Afirma que diante da regularidade da operação impugnada, é indevida a sua condenação ao pagamento de danos morais em favor do demandante. Ainda, diante da situação narrada, pugna pela condenação do autor as penas da litigância de má-fé. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, sendo julgada totalmente improcedente a demanda de origem.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 35, autos do 1º grau).

Os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.

Vieram-me os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que os recursos devem ser conhecidos porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Da regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta a instituição financeira recorrente, inicialmente em seu recurso, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de maneira clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito.

Analisados os autos, verifica-se que razão possui mesmo o banco recorrente.

A princípio, necessário destacar que a própria autora, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1o Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:

I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o;

II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;

III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias.

[...]

§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por...

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