Acórdão Nº 5002880-97.2021.8.24.0033 do Primeira Câmara Criminal, 27-05-2021

Número do processo5002880-97.2021.8.24.0033
Data27 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5002880-97.2021.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


APELANTE: GUILHERME GUERINO SILVA (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público da comarca de ITAJAÍ ofereceu denúncia em face de Guilherme Guerino Silva, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos seguintes fatos:
No dia 5 de fevereiro de 2021, por volta das 8h40min, na Rua Pedro José João, Bairro Vila Operária, nesta cidade, o denunciado GUILHERME GUERINO SILVA trazia consigo 29 (vinte e nove) porções de crack - subproduto da cocaína - substância entorpecente capaz de causar dependência física ou psíquica, pesando aproximadamente 10g (dez gramas), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para fins de mercancia ilícita. Por ocasião fatos, uma guarnição da Polícia Militar que realizava campanas naquelas imediações logrou êxito em abordar o denunciado antes que ele ingressasse em sua moradia, situada naquela mesma rua. Durante a abordagem, os agentes públicos localizaram as 29 (vinte e nove) pedras de crack mais a quantia de R$ 134,00 (cento e trinta e quatro reais), oriunda da venda espúria de drogas, que GUILHERME GUERINO SILVA trazia consigo. Na casa do denunciado, que não possui numeração aparente, foi apreendida outra bucha ainda não fracionada daquela droga, pesando 10g (dez gramas), a qual GUILHERME GUERINO SILVA guardava, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para posterior narcotraficância, bem como uma balança de precisão, prato com resquícios de crack, gilete, vela e um simulacro de arma de fogo. Assim, constatada a finalidade comercial dos entorpecentes, GUILHERME GUERINO SILVA, que fazia uso de uma tornozeleira eletrônica, foi preso em flagrante.(evento 1, DENUNCIA1PG - 5-2-2021).
Sentença: o juiz de direito Juliano Rafael Bogo julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar Guilherme Guerino Silva pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto; e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, negando-lhe/concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade (evento 53PG - 7-4-2021).
Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.
Recurso de apelação de Guilherme Guerino Silva: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:
a) a pena na segunda fase da dosimetria seja fixada abaixo do mínimo legal, diante da existência de duas atenuantes;
b) o apelante faz jus ao benefício estampado no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, sob a alegação de inexistem provas a revelar a dedicação ao tráfico;
c) uma vez minorada a pena, impõe-se a readequação do regime e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, de modo a minorar a pena e alterar a sua forma de resgate (evento 60PG - 8-4-2021).
Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:
a) a minoração pretendida encontra óbice no verbete 231 da Súmula de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça;
b) existe elementos probatórios a revelar a dedicação ao crime pelo apelante, o que obsta a incidência da causa especial de redução da pena.
Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 71PG - 16-4-2021).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Humberto Francisco Scharf Vieira opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 12SG - 30-4-2021).
Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor

Documento eletrônico assinado por CARLOS ALBERTO CIVINSKI, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 924266v6 e do código CRC d8ad173c.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ALBERTO CIVINSKIData e Hora: 31/5/2021, às 15:14:2
















Apelação Criminal Nº 5002880-97.2021.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


APELANTE: GUILHERME GUERINO SILVA (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche parcialmente os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser parcialmente conhecido.
Do mérito
Da fixação da pena abaixo do mínimo legal na segunda fase da dosimetria
A defesa busca a fixação da pena na segunda fase da dosimetria abaixo do mínimo legal, diante da incidência de duas circunstâncias atenuantes.
A insurgência não se volta contra a condenação do apelante, logo, para facilitar a compreensão, colaciona-se os respectivos trechos da aplicação da pena efetuada pelo Juízo a quo:
Circunstâncias judiciais
É necessária uma leitura constitucional do art. 59 do CP, atenta aos princípios consagrados do direito penal e aos direitos fundamentais previstos na Constituição (legalidade, devido processo legal, liberdade, dignidade da pessoa humana, lesividade, culpabilidade, non bis in idem etc).
A culpabilidade resta avaliada no momento em que verifica se a conduta típica e antijurídica é também culpável, em decorrência da imputabilidade, da potencial consciência de ilicitude e da exigibilidade de conduta diversa. Com efeito, "[...] a culpabilidade do ator pela realização do tipo de injusto não é mero elemento informador do juízo de reprovação, mas o próprio juízo de reprovação pela realização do tipo de injusto (o que é reprovado no autor), cujos fundamentos são a imputabilidade, a consciência do injusto e a exigibilidade de comportamento diverso (porque o autor é reprovado). A inclusão da culpabilidade como circunstância judicial de formulação do juízo de reprovação constitui impropriedade metodológica, porque o juízo de culpabilidade, como elemento do conceito de crime, não pode ser, ao mesmo tempo, simples circunstância judicial de informação do juízo de culpabilidade" (SANTOS, Juarez Cirino dos. Manual de direito penal: parte geral. Florianópolis: Conceito, 2012. p. 311). Portanto, valorar a culpabilidade, para fins de incremento da pena, além da atecnia, acarreta ilegal bis in idem. A reprovabilidade da conduta, geralmente referida pela doutrina como significado da "culpabilidade" prevista no art. 59 do CP, deve ser avaliada com base nas circunstâncias e consequências do crime.
Quanto aos antecedentes, há uma lacuna normativa sobre seu significado técnico-jurídico e hipótese(s) de incidência (diferentemente do conceito legal de reincidência), de modo que a construção doutrinária e jurisprudencial a respeito dessa categoria (condenação transitada em julgado que deixou de operar os efeitos da reincidência) consubstancia afronta ao princípio da legalidade, além de violação ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CRFB) e à vedação de penas perpétuas (art. 5º, XLVII, "b", da CRFB). Nesse sentido, já decidiu o Supremo Tribunal Federal ser inadmissível considerar como maus antecedentes condenação anterior que deixou de operar os efeitos da reincidência (STF, HC 126315, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 15/09/2015). Ainda, "[...] inquéritos policiais e processos em andamento não podem ser valorados negativamente na fixação da pena-base, a título de maus antecedentes, sob pena de ofensa ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF) [...]" (STF, RHC 123711, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 07/10/2014). Por óbvio, condenação transitada em julgado, que gera reincidência, não pode ser considerada na análise do art. 59, para não acarretar bis in idem, haja vista que configura circunstância agravante, a ser observada na segunda fase da dosimetria ("A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial" - súmula n. 241 do STJ). Desse modo, apenas a condenação criminal por fato anterior, mas que transitou em julgado somente após o novo crime (portanto, não geradora de reincidência) pode ser reconhecida como mau antecedente.
Com relação à conduta social e à personalidade, não se pode olvidar que o direito penal é o campo do ordenamento de define crimes e comina as penas e medidas de segurança aos autores das condutas incriminadas (SANTOS, Juarez Cirino dos. op. cit. p. 01). O direito penal não se aplica a comportamentos que, embora imorais ou ofensivos aos padrões éticos, não estejam definidos na lei como crime. Frise-se, "o delito só existe enquanto ação humana (Direito Penal do fato) e não como estado, condição social, modo de ser ou atitude (Direito Penal do autor), especialmente em uma sociedade livre e democrática, em que vige o primado da lei e do respeito inarredável aos direitos e garantias fundamentais do homem" (PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 16 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 175). Logo, eventuais máculas na conduta social do indivíduo ou em sua personalidade não podem ser valorados na aplicação da pena. O réu deve ser julgado e, conforme o caso, punido pelo fato praticado...

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