Acórdão Nº 5002904-85.2021.8.24.0014 do Primeira Câmara de Direito Público, 23-08-2022

Número do processo5002904-85.2021.8.24.0014
Data23 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002904-85.2021.8.24.0014/SC

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: MUNICÍPIO DE CAMPOS NOVOS/SC (AUTOR)

RELATÓRIO

O Estado de Santa Catarina interpôs apelação à sentença de procedência do pedido formulado na "ação declaratória" que lhe move o Município de Campos Novos com o escopo de declarar a legalidade do direito dos servidores municipais à revisão geral anual autorizada pela Lei Municipal n. 4.694/2021.

Colhe-se do dispositivo do decisum:

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para DECLARAR a legalidade da revisão geral anual concedida por meio das Lei Municipal n. 4.694/2021, bem como a ausência de violação aos dispositivos da Lei Complementar n. 173/2020, e, por conseguinte, impor ao réu a obrigação de não fazer, consistente na impossibilidade de desaprovar as contas do exercício de 2021 do município autor por motivos relacionados à concessão da revisão geral anual e a sua manutenção, por força da lei ora declarada legal, ou de tomar qualquer outra medida com o fim de punir ou compelir o Poder Executivo e Legislativo do Município a revogar a mencionada lei.

Confirmo a decisão que deferiu a tutela provisória.

Cientifique-se o Tribunal de Contas do Estado sobre a presente decisão.

Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 3.000,00 (três mil reais), nos termos do art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil.

A Fazenda Pública é isenta das custas processuais, consoante art. 7º, I, da Lei n. 17.654/2018 (evento 26 na origem).

Nas suas razões, o ente público sustentou que "Os arts. 7º e 8º da LC n. 173/2020 pretendem, a um só tempo, evitar que a irresponsabilidade fiscal do ente federativo, por incompetência ou populismo, seja sustentada e compensada pela União e pelo Estado" (fl. 4); e que, portanto, os servidores do Município de Campos Novos não têm direito à revisão geral da remuneração autorizada pela Lei Municipal n. 4.694/2021. Por fim, prequestionou dispositivos legais (evento 30 nos autos principais).

Houve contrarrazões (evento 41 na origem).

Vieram os autos à conclusão para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.

O Estado de Santa Catarina afirma que "Os arts. 7º e 8º da LC n. 173/2020 pretendem, a um só tempo, evitar que a irresponsabilidade fiscal do ente federativo, por incompetência ou populismo, seja sustentada e compensada pela União e pelo Estado" (fl. 4); e que, portanto, os servidores do Município de Campos Novos não têm direito à revisão geral da remuneração autorizada pela Lei Municipal n. 4.694/2021.

Não lhe assiste razão, porém.

Segundo o art. 37, X, da Constituição Federal de 1988, "a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices" (sublinhou-se). Como se vê, a Lex Mater trata distintamente das hipóteses de alteração da remuneração/subsídio e de sua revisão geral anual.

Já a Lei Complementar Federal n. 173/2020 estabelece:

Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;[...]VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal; (grifou-se).

Assim, não houve, no texto infraconstitucional, menção expressa à revisão geral anual - do contrário, aliás, seria de se cogitar de inconstitucionalidade frente à expressa dicção do art. 37, X, da CF/1988. A ratio legis, como evidencia o inciso VIII, foi de impedir incremento de despesa, mas apenas aquele que extrapole a variação da inflação. Finalmente, ressaltou-se a necessidade de respeitar "determinação legal anterior à calamidade pública", e a norma do art. 37, X, da Carta Magna sem dúvida se enquadra nesse conceito.

Vale o registro de que o Supremo Tribunal Federal, nas ADIs n. 6.450, n. 6.447 e n. 6.525, não reconheceu inconstitucionalidade na LC n. 173/2020 e tampouco impôs leitura que obstasse à revisão geral vencimental.

Conclui-se que, data venia, a LC n. 173/2020 não impede a revisão geral anual de que trata o art. 37, X, da CF.

Logo, o reajuste in casu não configura acréscimo remuneratório, pois é mera reposição inflacionária decorrente da variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, de março de 2020 até fevereiro de 2021.

Portanto, correta a sentença que reconheceu o direito dos servidores do Município de Campos Novos à revisão geral anual autorizada pela Lei Municipal n. 4.694/2021.

A questão está muito bem delineada na jurisprudência catarinense, a qual foi objeto de alguns precedentes, figurando entre eles o Mandado de Segurança Coletivo n. 5036064-46.2021.8.24.0000 (Grupo de Câmaras de Direito Público), da relatoria do Exmo. Sr. Des. Júlio César Knoll, j. 30-3-2022, que assim restou ementado:

MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO GERAL ANUAL. IMPUGNAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO QUE, EM CUMPRIMENTO À REGRA CONTIDA NO ART. 8º, INCISO I, DA LEI COMPLEMENTAR FEDERAL N. 173/2020, A QUAL ESTABELECEU O PROGRAMA FEDERATIVO DE ENFRENTAMENTO À COVID-19, DETERMINOU A SUSPENSÃO DA...

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