Acórdão Nº 5002919-34.2019.8.24.0011 do Sexta Câmara de Direito Civil, 13-07-2021

Número do processo5002919-34.2019.8.24.0011
Data13 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5002919-34.2019.8.24.0011/SC

RELATORA: Desembargadora DENISE VOLPATO

APELANTE: BERNADETE MARIA ELEUTERIO (EXEQUENTE) ADVOGADO: RAFAEL FRANCISCO DOMINONI (OAB SC019073) APELADO: YMPACTUS COMERCIAL S/A (EXECUTADO)

RELATÓRIO

Forte no Princípio da Celeridade, e utilizando racionalmente as ferramentas informatizadas, adota-se, in totum, o relatório da Sentença (Ev. 11 - SENT1), verbis:

"Trata-se de cumprimento de sentença proposto por Bernadete Maria Eleuterio contra Ympactus Comercial S/A, todos já qualificados, em que a parte exequente pretende seja compelida a parte executada a exibir documentos referentes a extrato das contas abertas em razão de negócio reconhecido como pirâmide financeira.

Intimada para emendar a inicial, a fim de demonstrar prova mínima da existência do vínculo jurídico existente entre as partes, a parte exequente juntou aos autos inúmeros documentos."

Ato contínuo, sobreveio Sentença da lavra da MMa. Magistrada Andreia Régis Vaz (Ev. 11 - SENT1), julgando a demanda nos seguintes termos:

"Assim, verifica-se que, instada a emendar a inicial, a parte exequente não cumpriu integralmente o que lhe competia, razão por que forçoso o indeferimento da inicial.

Ante o exposto, com fundamento no art. 924, inc. I, do CPC, indefiro a petição inicial e, por consequência, extingo o cumprimento de sentença.

Custas pela parte exequente e sem honorários."

A autora opôs Embargos de Declaração (Ev. 14 - EMBDECL1), arguindo ter a Sentença incorrido em contradição ao deixar de deferir a gratuidade judiciária, apesar de já concedida a benesse nos autos da Ação de Exibição de Documentos n. 0306459-73.2017.8.24.0011, além de deixar de considerar a documentação que, segundo alega, comprova a existência de relação jurídica entre as partes. Os aclaratórios, entretanto, foram rejeitados (Ev. 16 - SENT1).

Irresignada com a prestação jurisdicional, a autora interpôs Apelação Cível (Ev. 19 - APELAÇÃO1), pleiteando, inicialmente, a concessão da gratuidade judiciária, em razão de não possuir condições de custear as despesas processuais sem prejuízo da subsistência própria e de seu núcleo familiar. No mérito, assevera que, apesar de obrigada a exibir a documentação relativa à relação jurídica entre as partes por Sentença proferida na Ação de Exibição de Documentos supra epigrafada, a obrigação não foi cumprida. Em virtude disso, aduz não ter lhe restado outra opção senão o ajuizamento do Cumprimento de Sentença mediante apresentação dos únicos documentos que possui, objetivando o pagamento de valores por si investidos e perdidos no esquema de pirâmide financeira Telexfree. Defende a legitimidade da documentação apresentada, afirmando ter comprovado satisfatoriamente o aporte da importância de R$ 39.900,09 (trinta e nove mil e novecentos reais e nove centavos) no esquema. Por estes motivos, pugna pela reforma da Sentença para reconhecer a higidez do acervo probatório documental e, em consequência, determinar o retorno dos autos à origem para retomada do andamento da execução.

Citada, a massa falida de Ympactus Comercial S/A apresentou contrarrazões (Evento 32 - CONTRAZ1), suscitando, preliminarmente, a necessidade de suspensão do andamento da demanda para habilitação dos créditos da parte autora no Juízo de sua recuperação judicial. No mérito, defende que a ausência de comprovação dos aportes financeiros alegadamente realizados pela pare autora influi no necessário julgamento de improcedência dos pedidos iniciais, arguindo ainda não possuir acesso aos sistemas eletrônicos de administração do sistema TelexFree para apresentação de eventual documentação relativa à conta da parte autora.

Os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade

É consabido que o procedimento recursal exige o preenchimento de pressupostos específicos, necessários para que se possa examinar o mérito do recurso interposto. Portanto, torna-se imperiosa, num primeiro momento, a análise dos pressupostos recursais, em razão de constituírem a matéria preliminar do procedimento recursal, ficando vedado ao Tribunal o conhecimento do mérito no caso de não preenchimento de quaisquer destes pressupostos.

Tais pressupostos são classificados como intrínsecos (cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e extrínsecos (regularidade formal, tempestividade e preparo). Os pressupostos intrínsecos estão atrelados ao direito de recorrer, ao passo que os extrínsecos se referem ao exercício desse direito.

1.1. Justiça gratuita

Inicialmente, insurge-se o apelante em face do indeferimento da gratuidade judiciária pelo Juízo de origem, aduzindo sua incapacidade para o custeio das despesas processuais sem prejuízo da subsistência própria ou de seu núcleo familiar.

Pois bem.

Na perspectiva constitucional de amplo acesso à prestação jurisdicional (artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal), a simples afirmação na própria petição inicial ou a declaração de hipossuficiência atestando a impossibilidade de arcar com os dispêndios processuais, sem prejuízo do sustento próprio e da família, adquire presunção relativa de veracidade (artigo 4º, §1º, da Lei n. 1.060/50), e afiguram-se suficientes às concessões dos benefícios da justiça gratuita.

Neste sentido, reza a disposição do art. 99, §§ 2º e 3º do Código de Processo Civil:

"Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. [...]§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.§ 3o Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. [...]"

Do mesmo modo, estabelece o artigo 1º da Lei n. 7.115/1983:

"Art. 1º - A declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira."

Neste contexto, impõe-se reconhecer a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência da apelante, a qual se afigura suficiente à concessão do benefício da Justiça Gratuita, sob pena de se macular o efetivo exercício da cidadania e a concretização da justiça.

Não se desconhece que essa presunção é relativa, por isso que, em aportando aos autos elementos que demonstrem a capacidade da parte de custear a demanda, é de se indeferir o benefício da gratuidade da Justiça, sendo lícito ao Magistrado, ainda, condicionar a concessão do benefício (ou a continuidade de sua percepção) à demonstração concreta de pobreza (TJSC, Apelação Cível n. 2010.060501-4, de Itajaí, Rel. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta).

Todavia, tal prerrogativa há de ser exercida sob o enfoque constitucional do livre acesso à jurisdição pontificador da cidadania.

Nesse sentido, destaca-se do acervo jurisprudencial deste Tribunal:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BENS, GUARDA, REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS E ALIMENTOS. JUSTIÇA GRATUITA. INDEFERIMENTO DE PLANO. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 99, § 2º, DO CPC/2015. OBRIGATORIEDADE DE SE OPORTUNIZAR À AGRAVANTE A COMPROVAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA GRATUIDADE. PROVIDÊNCIA, DE TODO MODO, DISPENSÁVEL IN CASU, DADA A PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DA ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA, CORROBORADA PELOS ELEMENTOS DE PROVA TRAZIDOS AOS AUTOS. PROVIMENTO." (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4005921-67.2016.8.24.0000, de Brusque, rel. Des. Stanley da Silva Braga, j. em 14/02/2017).

Ainda:

"A concessão do benefício da justiça gratuita depende da simples afirmação do postulante de que não está em condições de pagar as custas processuais e honorários advocatícios, sem prejuízo próprio ou de sua família (art. 4º da Lei n. 1.060/1950). Essa declaração goza de presunção relativa de veracidade que somente pode ser elidida por comprovação contundente em sentido contrário. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4005987-47.2016.8.24.0000, de Içara, rel. Des. Saul Steil, j. em 06/06/2017).

Ou seja, a prerrogativa legal não pode ser exercida de forma a limitar o exercício pleno da cidadania, ainda mais quando inexistem nos autos elementos capazes de combater a presunção de hipossuficiência, não se afigurando razoável o indeferimento do benefício.

Na hipótese sub judice, a autora afirma que não possui renda fixa e que os rendimentos mensais destinados à manutenção do lar conjugal se limitam ao benefício previdenciário recebido pelo seu cônjuge José Manoel...

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