Acórdão Nº 5002954-22.2022.8.24.0000 do Primeira Câmara Criminal, 24-02-2022

Número do processo5002954-22.2022.8.24.0000
Data24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5002954-22.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: MONICA LETICIA MEDINA DE CARVALHO (Impetrante do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: GREGORY ANACLETO PASSOS DE LIMA (Paciente do H.C) ADVOGADO: MONICA LETICIA MEDINA DE CARVALHO (OAB SC035519) IMPETRADO: Juízo da Vara Regional de Execuções Penais da Comarca de São José

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado pela advogada Mônica Letícia Medina de Carvalho em favor de Gregory Anacleto Passos de Lima, contra ato do Juízo da Vara de Execuções Penais da comarca de São José.

Alegou, em síntese, que o paciente está sofrendo constrangimento ilegal em decorrência da quantidade de dias que foram remidos pela aprovação no ENCCEJA.

Requereu a concessão liminar da ordem, para reconhecer o direito à remição de 177 dias, com a confirmação da medida quando do julgamento do mérito (evento 1, em 31-1-2022).

A medida liminar foi indeferida (evento 11/SG, em 17-2-2022).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do procurador de justiça Gercino Gerson Gomes Neto, opinou pelo não conhecimento da ação, "nem concessão da ordem de ofício, mas determinação, ao juízo, para que reveja a remição concedida na sequência 1.288, dos autos da execução, ante a nova interpretação jurisprudencial". (evento 11/SG, em 22-2-2022).

Este é o relatório.

VOTO

A ação não comporta conhecimento.

Embora seja possível vislumbrar um eventual constrangimento do direito de ir e vir do paciente, segundo a narrativa contida na impetração - que alega excesso de execução -, a discussão é própria da fase de execução penal, de modo que não é viável a utilização do habeas corpus como substitutivo do recurso cabível para combater decisão relativa à execução penal, na esteira da fundamentação lançada por esta relatoria nos autos do HC 4010610-57.2016.8.24.0000, julgado por esta Primeira Câmara Criminal, em 04-10-16, por votação unânime.

Uma das razões que sustentam esse entendimento é um tanto evidente: a utilização de habeas corpus substitutivo em favor de um paciente específico, sobretudo quando não vislumbrada uma ilegalidade flagrante, equivale a "furar a fila" formada por todos os demais recursos interpostos por parte dos jurisdicionados que se valeram do meio processual adequado para se insurgir contra decisões proferidas no âmbito da execução penal, haja vista a tramitação prioritária deste tipo de ação, em flagrante violação do princípio da isonomia.

Nesse sentido, "o Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus (AgRg no HC 437.522/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018) [...]". (HC 625.504/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares DA Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9-3-2021, v.u.).

É verdade que recentemente ocorreu alteração no entendimento desta Primeira Câmara Criminal sobre a questão ora discutida, isso a partir do julgamento do HC 5012533-28.2021.8.24.0000, em voto da lavra do desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, e 5010144-70.2021.8.24.0000, em voto da lavra da desembargadora Ana Lia Moura Lisboa Carneiro.

Com efeito, embora ainda prevaleça neste Órgão Fracionário a posição acerca da impossibilidade de conhecimento de habeas corpus substitutivo do agravo em execução penal, passou-se a analisar, excepcionalmente nesta hipótese específica (relativa à remição pelo Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos - ENCCEJA), a ocorrência de eventual flagrante ilegalidade a ensejar a concessão de habeas corpus de ofício, haja vista a também recente decisão da Terceira Seção do STJ no HC 602.425/SC.

A propósito, tal entendimento vem se replicando nas demais Câmaras Criminais desta Corte de Justiça (HC 5021149-89.2021.8.24.0000, Segunda Câmara Criminal, Rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 18-5-2021; HC 5017149-46.2021.8.24.0000, Quinta Câmara Criminal, Relª. Desª. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, j. 06-05-2021; HC 5020894-34.2021.8.24.0000, Segunda Câmara Criminal, Rel. Norival Acácio Engel, j. 11-05-2021).

Contudo, é possível verificar a inexistência ilegalidade flagrante, pois a defesa busca a concessão de dias remidos correspondentes a aprovação integral no Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos - ENCCEJA referente ao Ensino Fundamental (177 dias), quando o paciente logrou aprovação no ENCCEJA do Ensino Médio (133 dias), conforme evento 1, DOCUMENTACAO3.

Assim, a ação não deve ser conhecida nos exatos termos da decisão monocrática interlocutória que indeferiu a medida liminar, de modo que, para evitar tautologia, colaciona-se a fundamentação a seguir:

[...].

No caso em tela, o pedido não está amparado por fundamentos que demonstrem, em primeira análise, o alegado constrangimento ilegal, a permitir o conhecimento excepcional da ação ou a concessão de habeas corpus de ofício, uma vez que o exame perfunctório que a ocasião permite revela que a remição concedida pela autoridade impetrada está de acordo com a recente decisão da Terceira Seção do STJ no HC 602.425/SC.

A fim de retificar a quantidade de dias remidos em razão da aprovação integral do paciente no Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos - ENCCEJA referente ao ensino médio, o Juízo a quo proferiu a seguinte decisão:

Na decisão seq. 1.842, o apenado foi aprovado no ENCCEJA/ 2019 - Ensino Médio - em todas as áreas de conhecimento e na redação, consoante certificação acostada no evento 390 e seq. 6, garantindo-lhe, neste prisma, 66 (sessenta e seis) dias de remição, já incluído 1/3 previsto no art. 126, § 1º, I e § 5º, da LEP.

Porém, recentemente o Superior Tribunal de Justiça uniformizou o entendimento acerca da remição pelo ENCCEJA, nos seguintes termos:

Execução Penal. Remição da pena pelo estudo. Aprovação no Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos - ENCCEJA. Recomendação n. 44/2013 do CNJ. Interpretação mais benéfica. Cálculo dos 50% da Carga Horária. Patamar equivalente a 1.600 horas. Remição de 133 dias. 26 dias por área de conhecimento. Reafirmação da jurisprudência da Terceira Seção. (HC 602.425/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, j. em 10.03.2021) (Informativo n. 689 do Superior Tribunal de Justiça).

Com base no novo posicionamento uniforme do Superior Tribunal de Justiça, ao apenado devem ser homologados mais 67 dias de remição. (evento 1, doc. 2).

Com efeito, em virtude do exame realizado no ano de 2019, no qual obteve aprovação em todas as áreas de conhecimento e na redação, foram homologados o total 133 dias de remição.

O instituto da remição está previsto no art. 126 da Lei de Execução Penal:

Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.

§ 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:

I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;

II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.

§ 2º As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.

§ 3º Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.

§ 4º O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.

§ 5º O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.

§ 6º O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.

§ 7º O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.

§ 8º A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.

A remição é um benefício que consiste no "desconto na pena do tempo relativo ao trabalho ou estudo do condenado, conforme a proporção prevista em lei. É um incentivo para que o sentenciado desenvolva uma atividade laboterápica ou ingresse em curso de qualquer nível, aperfeiçoando a sua formação. Constituindo uma das finalidades da pena a reeducação, não há dúvida de que o trabalho e o estudo são fortes instrumentos para tanto, impedindo a ociosidade perniciosa no cárcere. [...] A remição somente é viável quando o sentenciado estiver nos regimes fechado e semiaberto, pois, nessas hipóteses, como regra, deve trabalhar ou estudar no próprio estabelecimento penitenciário. No regime aberto, não cabe remição pelo trabalho, pois é obrigação do condenado, como condição para permanecer no mencionado regime, o exercício de atividade laboral honesta. Entretanto, a Lei 12.433/2011 permitiu a remição, em regime aberto, pelo estudo, como forma de incentivo ao sentenciado para tal atividade (art. 126, § 6º, LEP)" (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. v. 2. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 308).

A redação do art. 126, I...

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