Acórdão Nº 5002980-85.2021.8.24.0022 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 21-06-2022

Número do processo5002980-85.2021.8.24.0022
Data21 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002980-85.2021.8.24.0022/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER

APELANTE: EVA SANTOS DE SOUZA (AUTOR) APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Banco Bradesco S.A. e Eva Santos de Souza interpuseram Recurso de Apelação e Recurso Adesivo (Evento 48 e 51, respectivamente) contra a sentença prolatada pelo Magistrado oficiante na 1ª Vara Cível da Comarca de Curitibanos - doutor Elton Vitor Zuquelo - que, nos autos da "ação declaratória de inexistência de débito e nulidade contratual c/c restituição de valores, com pedido de tutela de urgência e indenização por dano moral" n. 5002980-85.2021.8.24.0022, ajuizada pela segunda em face do primeiro, julgou procedente a pretensão vertida na exordial, cuja parte dispositiva se transcreve:

Isto posto, ACOLHE-SE a pretensão para DECLARAR a nulidade do contrato de n.° 20190303468026677000 e a averbação da margem consignável junto ao benefício da autora, n.° 6248646973, declarando vigente contrato de empréstimo consignado pelo valor creditado à postulante, R$ 1.144,00, no mês de janeiro de 2019, com a taxa de juros divulgada pelo BACEN para a espécie contratual no mês da contratação de 25,351% a.a., com capitalização anual.

CONDENAR o réu ao pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de compensação pecuniária por dano moral. Valor é atual, reajustável pela SELIC a partir desta data.

Estabelece-se a compensação com eventual saldo devedor do contrato, após a sua conversão para empréstimo consignado. Em verificando-se adimplemento superior ao valor do débito com os juros incidentes, condena-se o réu na restituição simples do valor excedente, incidindo juros de 1,0% ao mês e correção monetária pelo INPC dos valores cobrados indevidamente.

CONDENAR o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor da condenação.

Ao trânsito em julgado, arquivar.

(Evento 41, SENT1).

Em suas razões recursais, a Instituição Financeira alega, em suma, que: (a) "resta claro a má-fé da apelada, em aduzir que o presente cartão de crédito, se trata de uma fraude contratual, ou que é uma dívida impagável, pois o beneficiário é informado mensalmente no extrato de pagamento do valor que é consignável, e que será descontado em caso de uso do cartão, bem como, lhe é encaminhado em sua residência fatura para pagamento do saldo remanescente"; (b) "a Requerente não realizou transações com o cartão de crédito, utilizando-se apenas do empréstimo consignado"; (c) "não merecem prosperar as alegações da Requerente de devolução dos valores da reserva de margem consignável, uma vez que não há descontos, TANTO QUE NÃO TROUXE QUALQUER DOCUMENTO AOS AUTOS QUE COMPROVEM SUPOSTOS DESCONTOS"; (d) "Não há qualquer comprovação nos autos de descontos, ou de que teria sofrido qualquer prejuízo em decorrência da reserva, uma vez que não há qualquer prejuízo a Requerente com a simples reserva"; (e) "NÃO HÁ QUE SE FALAR EM DANOS SOFRIDOS PELA REQUERENTE, uma vez que não comprova suas alegações"; (f) "o simples dano suportado pela suposta vítima não enseja a responsabilidade civil, para ela se faz necessária uma ligação entre esse dano e o comportamento do seu causador"; e (g) "O Banco Apelante não praticou ato contrário ao direito, não agiu com dolo ou culpa para o evento, e, além disso, não houve dano, que sequer foi provado, o que leva ao decreto de improcedência do pedido inicia".

Em seu turno, a Autora verbera, em síntese, a necessidade de majoração dos danos morais.

Empós, com as contrarrazões (Evento 56, CONTRAZAP1), os autos ascenderam a este grau de jurisdição e foram distribuídos a esta relatoria.

É o necessário escorço.

VOTO

Primeiramente gizo que, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade, o Recurso é conhecido.

1 Dos Recursos

1.1 Da declaração de inexistência de débito

A parte Requerente ajuizou "ação declaratória de inexistência de débito e nulidade contratual c/c restituição de valores, com pedido de tutela de urgência e indenização por dano moral" em face do Banco Bradesco S.A., argumentando que a Instituição Financeira impôs de forma dissimulada a contratação de empréstimo via cartão de crédito, com desconto em folha do valor mínimo da fatura, de modo que acreditou que estava realizando um empréstimo nos moldes tradicionais.

Da leitura da exordial fica claro que a Autora almeja: (a) a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com reserva de margem consignável - RMC; (b) a restituição dos valores descontados indevidamente em folha de pagamento; e (c) a condenação da parte Ré ao pagamento de indenização por danos morais.

A parte Demandada advoga, em apertado escorço, que no contrato celebrado entre as Partes restou expressamente pactuada a contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), tendo a parte Demandante plena ciência da referida contratação.

Sem embargo da argumentação recursal, verifica-se que a parte Requerida não apresentou com a contestação o contrato firmado entre as partes tampouco boletos ou comprovantes de transferência de valores, dever que lhe incumbia por ser o detentor do documento e por força da inversão do ônus da prova, determinada com fundamento no art. 6º, VIII, do CDC.

Compulsando os autos, verifico que a relação estabelecida é típica de consumo, amoldando-se as partes aos conceitos de fornecedor e consumidor estabelecidos pelos artigos e do Código de Defesa do Consumidor.

Por outro lado, a parte Consumidora apresentou documentos que respaldam sua alegação de que sofreu descontos, efetuados pela parte Requerida, em seu benefício previdenciário (Benefícios 624.864.697-3) a título de Reserva de Margem Consignável - RMC (Evento 1, EXTR5).

Enfatizo que o contrato, faturas e outros documentos que comprovem a disponibilização de crédito não foram trazidos com a contestação e, apesar do eminente Juiz intimar a parte Réu para a juntada dos documentos supracitados em período excepcional, não houve colheita de provas pela mesma (Evento 19, DESPADEC1, Evento 30, DESPADEC1).

Diante disso, é inviável acolher a tese defendia pela Casa Bancária de de que a parte Consumidora pretendia contratar cartão de crédito consignado, na medida em que sequer carreou aos autos qualquer documento que comprovasse a negociação válida, ou mesmo a efetiva utilização do plástico pela Demandante para efetuar compras ordinárias em seu dia a dia, o que corrobora a alegada ausência de interesse na pactuação deste serviço, razão pela qual outra alternativa não resta senão reconhecer a ilegalidade do ajuste sub examine na forma como foi avençado, declarando-se inexistente o débito dele decorrente, torna-se cogente a conversão de contrato para empréstimo consignado.

Por esta razão, a premissa adotada pelo Magistrado de primeira instância deve ser preservada:

DECISÃO:

Antecipa-se o julgamento dos pedidos, pois prescindível a colheita de outras provas.

Afasta-se a prefacial de falta de interesse de agir, pois, delineada a causa de pedir e deduzido pedido consentâneo, admite-se o processamento da demanda.

Da narrativa inicial evidencia-se a intenção da autora de contratar tão somente empréstimo consignado, diferentemente do cartão de crédito. Não houve demonstração pelo banco da existência de contratação de margem consignável, eis que instado para comprovar esse negócio jurídico, este silenciou-se.

Logo, conquanto aparente legalidade da averbação de margem RMC, em vista da afirmativa autoral de inexistência dessa relação jurídica entre as partes, entende-se pela ocorrência de uma contratação de empréstimo consignado convencional, isso porque houve valores liberados na conta corrente da beneficiária.

A pretensão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT