Acórdão Nº 5002995-65.2020.8.24.0062 do Quarta Câmara de Direito Civil, 03-11-2022

Número do processo5002995-65.2020.8.24.0062
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002995-65.2020.8.24.0062/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002995-65.2020.8.24.0062/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO

APELANTE: ENIVALDO PAULO DA CRUZ (AUTOR) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Banco do Brasil S.A. (réu) e Enivaldo Paulo da Cruz (autor) interpuseram recursos de apelação contra sentença (Evento 41, SENT1) que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito com pedido de compensação por abalo moral, aforada pelo segundo em desfavor do primeiro, julgou procedentes os pedidos exordiais.

Em atenção aos princípios relacionados à economia e à celeridade processuais, adota-se para o esclarecimento dos fatos, o relatório já redigido pelo Magistrado de Origem na sentença (Evento 41), porquanto retrata a questão em litígio e a tramitação da demanda a ser julgada. Vide:

Cuida-se de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenizatória ajuizada por ENIVALDO PAULO DA CRUZ em face de BANCO DO BRASIL S.A., ambos já qualificados e bem representados nos autos.

Em síntese, a parte autora afirmou ter se surpreendido quando tomou ciência de que seu nome foi incluído nos órgãos de proteção ao crédito a pedido do réu, pois jamais contratou com o requerido.

Postulou a concessão de tutela de urgência para a exclusão do registro desabonador e, ao final, a declaração de inexistência de débito e a condenação do demandado ao pagamento de indenização por danos morais.

Em decisão proferida no EVENTO 19, deferiu-se a tutela de urgência.

Devidamente citado, o réu apresentou contestação (EVENTO 25).

Asseverou que a negativação do nome do autor ocorreu em razão da inadimplência do contrato de cartão de crédito, com adesão em 05/12/2016 e desbloqueado para uso em 11/01/2017, gerado e encaminhado ao endereço do demandante e utilizado para compras no estabelecimento "Amazon", ao passo que não houve pagamento de nenhuma fatura. Rechaçou os pedidos formulados pelo autor, aduzindo ter agindo no exercício regular do direito.

Houve réplica (EVENTO 31).

Na sequência, as partes foram intimadas para especificarem as provas que ainda pretendiam produzir, oportunidade em que somente houve manifestação pela parte autora, informando não ter outras provas a produzir.

Sentenciando, o Togado de primeiro grau julgou a lide nos seguintes termos:

[...]

Ante o exposto, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora, para o fim de:

1.1. DECLARAR inexistente a dívida mencionada no documento "Outros 7", do EVENTO 1, identificada pelo contrato de número 000000100453653;

1.2. CONDENAR o réu a pagar ao autor o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, com acréscimo de correção monetária pelo INPC a partir do presente arbitramento e de juros de mora (1% ao mês) a contar de 09/09/2020.

Confirmo a decisão que deferiu a tutela de urgência.

Condeno o demandado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios aos procuradores da parte autora, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, conforme vetores do art. 85, § 2º, do CPC.

Inconformados com a prestação jurisdicional, as partes litigantes apelam e apresentam suas razões recursais.

O autor, logo após a sentença (Evento 46, APELAÇÃO1, p. 1-6) pretende tão somente a majoração dos danos morais fixados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), argumentando que "que o nome do recorrente permaneceu incluso nos cadastros de inadimplentes por longo período, já que o débito é datado de 06/04/2020 (EVENTO1, OUT7) e só foi excluído em 11/02/2021 (EVENTO28), após decisão judicial (EVENTO19). Tal fato, sem sombra de dúvidas, agravou a angústia vivenciada pelo recorrente, de modo que, também por isso, a indenização merece ser majorada" (p. 5).

O banco demandado (Evento 53, APELAÇÃO1, p. 1-19), por meio das quais faz breve resumo dos fatos e sustenta, preliminarmente, a necessidade de revogação da justiça gratuita.

No mérito, afirma que a inscrição dos dados do autor em cadastro de inadimplentes ocorreu em exercício regular do direito da credor, uma vez que "A negativação do nome da recorrida se deve a inadimplência em contrato de cartão de crédito, OUROCARD ELO MAIS, contrato 100453653, com adesão em 05/12/2016, desbloqueado para uso em 11/01/2017 às 11:36, conforme documentos que instruem a defesa apresentada nos autos, o cartão foi gerado e encaminhado ao endereço do cliente cadastrado no sistema, tendo sido desbloqueado e utilizado para compras no estabelecimento Amazon, uma vez que não ocorreu o pagamento de nenhuma fatura, a negativação do nome da recorrida nos órgãos de proteção ao crédito foi a medida pertinente" (p. 3)

Com base nesse fato, afirma a) a necessidade de revogação da tutela concedida, b) a ausência dos requisitos para a responsabilidade civil (ilícito, comprovação do dano e nexo causal); c) impossibilidade de inversão do ônus da prova; e subsidiariamente d) que o quantum indenizatório deveria ter sido arbitrado com razoabilidade, razão pela qual deve ser reduzido.

Intimadas, as partes apenas o autor apresentou contrarrazões (Evento 62, CONTRAZ1), requerendo o desprovimento do recurso adverso.

Distribuídos os autos, então, vieram conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recursos de apelação combatendo sentença proferida em ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de compensação por abalo moral, demanda na qual se discute (i)legalidade de contratação de cartão de crédito e débitos relacionados, bem como de inscrição de dados de consumidor em cadastro de inadimplentes e as consequências jurídicas no aspecto moral.

De início, prudente destacar que a sentença foi proferida na vigência do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise dos recursos, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Os reclamos são cabíveis, tempestivos, sendo o autor dispensado do recolhimento do preparo, porque litiga sob a concessão da Justiça Gratuita (Evento 8, DESPADEC1) e o banco o recolhe (Evento 52, CUSTAS1), razão pela qual se admite a análise e o processamento das insurgências.

Adianta-se, todavia, que o recurso do réu comporta parcial conhecimento e na parte conhecida deve ser desprovido e do autor deve ser acolhido, conforme abaixo se discorrerá.

I - Da parte não conhecida do recurso do réu.

O pedido de revogação da liminar deferida nos autos de origem, apenas confirmada na sentença, igualmente não pode ser conhecido, porque não houve insurgência a tempo e modo da decisão que apreciou o pedido de tutela de urgência nos autos de origem ( Evento 19, DESPADEC1).

Ocorre, portanto, a preclusão da insurgência relacionada à tutela de urgência deferida em favor do recorrido, porquanto apenas confirmada na sentença. Como sabido "[...] a preclusão incide sobre o comportamento contraditório, impedindo que ele produza qualquer efeito. A prática de um ato processual implica a impossibilidade de praticar outro ato com ele logicamente incompatível" (Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. 18.ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 430-431)

E muito embora a tutela de urgência possa ser requerida e reiterada a qualquer tempo, o novo pedido deve estar amparado em novas circunstâncias fáticas e/ou jurídicas, já que "É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão" (Código de Processo Civil, art. 507).

Nesse norte:

APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DÍVIDA QUITADA. INSCRIÇÃO EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO RÉU. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA NÃO SUSCITADA A TEMPO E MODO. PRECLUSÃO. [...] (TJSC, Apelação n. 0304940-65.2019.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 12-05-2022).

Nesse norte, não se conhece das insurgência relacionada à tutela de urgência, porque trata-se de questão preclusa, pois não houve recurso da instituição financeira a tempo e modo.

II - Do apelo do demandado.

II. I - Da impugnação à justiça gratuita:

Não merece guarida a insurgência contra à concessão da justiça gratuita ao autor, que, no caso, repisa a impugnação formulada em contestação.

Isso porque, o apelante não trouxeram nenhuma prova no sentido de que o autor não fizesse jus à benesse.

Sob esse viés, é importante salientar que "convencendo-se o Magistrado acerca da alegada hipossuficiência financeira da parte autora e, pois, concedendo o benefício da gratuidade judiciária, é cabível a impugnação pela parte contrária, a quem compete, no entanto, 'o ônus de provar que o beneficiário não mais ostenta a qualidade de necessitado, requerendo a revogação do benefício' (JUNIOR, Nelson Nery; Nery, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 479)" (TJSC, Ap. n. 5000186-81.2020.8.24.0166, de TJSC, rel. Luiz Cézar Medeiros, 5ª Câmara de Direito Civil, j. em 11-8-2020).

Nem mesmo se confirma a alegada falta de comprovação, pois, no caso, o Juízo de origem intimou a parte demandante para justificar e comprovar a hipossuficiência, tendo sido acostado aos autos demonstrativos da referida incapacidade (Evento 6, PET1, OUT2-4, EXTR5-6, CTPS7 e CERTNEG8).

Nesse sentido, não há como acolher a impugnação genérica formulada:

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PERDAS E DANOS. CONFISSÃO DE DÍVIDA COM DEVER DE ENTREGA DE IMÓVEIS EM PAGAMENTO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. REJEIÇÃO DO PLEITO DE ABALO ANÍMICO. [...] IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDA À AUTORA. INSUBSISTÊNCIA. REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA BENESSE PREENCHIDOS. ALEGAÇÃO GENÉRICA QUE NÃO INFIRMAM A CONCLUSÃO JUDICIAL DE PRIMEIRO GRAU. BENEFÍCIO MANTIDO...

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