Acórdão Nº 5003215-06.2020.8.24.0081 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 30-11-2021

Número do processo5003215-06.2020.8.24.0081
Data30 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5003215-06.2020.8.24.0081/SC

RELATORA: Desembargadora JANICE GOULART GARCIA UBIALLI

APELANTE: DELCIA MARIA STRAIT (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta por DELCIA MARIA STRAIT da sentença proferida nos autos da "Ação Revisional de Contrato c/c Repetição do Indébito em Dobro, Compensação por Danos Morais e Pedido de Tutela Antecipada" n. 5003215-06.2020.8.24.0081, aforada contra BANCO BMG S.A. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva:

ANTE TODO O EXPOSTO, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial.

Condeno a autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado (CPC, art. 81 e art. 85, § 2.º). As obrigações ficam sob condição suspensiva de exigibilidade, pois beneficiária da justiça gratuita (artigo 98, § 3.º, do Código de Processo Civil).

A parte apelante sustenta, em síntese: a) "pleiteou o reajuste dos juros contidos no contrato, considerando que para a Apelante havia contratado um empréstimo pessoal e nunca uma aquisição de cartão de crédito com saque automático - empréstimo esse conhecido como RMC"; b) o banco "não provou que a intenção da Apelante era adquirir um cartão de crédito para saque, uma vez que a Apelante não teve a informação da taxa de juros já que não assinou a página do contrato que previa a taxa de juros e, de outro tanto, não se sabe se a taxa de juros não foi incluída apenas após a Apelante deixar o estabelecimento comercial da Apelada"; c) a dívida é impagável; d) houve falha no dever de informação. Ao final, requer a reforma da sentença para revisar o contrato a fim de que "a taxa de juros nele contido seja declarada nula" e o encargo seja readequado de acordo com a taxa média do Bacen prevista para empréstimo consignado. Pugna ainda pela restituição dos valores descontados do seu benefício previdenciário e a condenação do banco ao pagamento de compensação por danos morais.

Nas contrarrazões o banco apelando requer a intimação da "parte autora, a ser cumprido por oficial de justiça, para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, assim como seja designada audiência de instrução e julgamento para depoimento pessoal da parte autora. Acaso negativa a resposta aos questionamentos constantes do mandado, requer o BMG a condenação do advogado por litigância de má-fé, nos termos do art. 80, do CPC c/c art. 32, p.u., do Estatuto da OAB, bem como expedidos ofícios à OAB, ao Ministério Público e à Autoridade Policial competente, para que apure os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica" (doc 44).

Após, os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do recurso.

Requer o banco apelado nas contrarrazões a intimação da "parte autora, a ser cumprido por oficial de justiça, para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, assim como seja designada audiência de instrução e julgamento para depoimento pessoal da parte autora. Acaso negativa a resposta aos questionamentos constantes do mandado, requer o BMG a condenação do advogado por litigância de má-fé, nos termos do art. 80, do CPC c/c art. 32, p.u., do Estatuto da OAB, bem como expedidos ofícios à OAB, ao Ministério Público e à Autoridade Policial competente, para que apure os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica" (doc 44).

Não obstante, sabe-se que "o fato de o causídico da parte autora ter, em tese, ajuizado centenas de ações com a mesma pretensão em face do banco requerido não o transforma em litigante de má-fé. [A] subscrição de procuração e de declaração de hipossuficiência por parte da autora demonstra inequívoca ciência e desejo pelo ajuizamento da ação em tela" (TJSC, Apelação n. 5001727-59.2019.8.24.0175, de TJSC, rel. Des. Guilherme Nunes Born, 1ª Câmara de Direito Comercial, j. 25-6-2020).

Logo, rejeita-se o pedido.

Mérito

Cuida-se, na hipótese, de demanda na qual a parte autora pretende ver declarada a nulidade da taxa de juros fixada no contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignada, sob a alegação de que pretendia contratar empréstimo consignado.

Pois bem. Os contratos de Empréstimo Consignado e de Cartão de Crédito com Margem Consignada em benefícios pagos a servidor público civil ou militar do Estado de Santa Catarina foram institucionalizados pelo art. 97 da Lei n. 6.745/1985 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado de Santa Catarina) e pelo art. 52, VI, da Lei Complementar n. 412/2008. A fim de regulamentar as consignações em folha de pagamento, fora editado o Decreto n. 080/2011.

Do art. 8º desse diploma colhe-se o seguinte:

Art. 8º A soma mensal das consignações facultativas de cada servidor não poderá exceder ao valor equivalente a 40% (quarenta por cento) do resultado encontrado pela subtração das consignações compulsórias da remuneração bruta. [...]

§ 2º Será admitida liberação da margem adicional equivalente a 10 % (dez por cento), além, da margem consignável prevista no caput deste artigo, destinada exclusivamente para:

I - desconto de valores resultante de convênios com instituições financeiras administradoras de cartão de crédito; e

II - desconto de valores decorrentes de convênios para aquisição de medicamentos.

Como se vê, a norma determina que os descontos para contratação de empréstimo consignado e de cartão de crédito devem ficar limitados a 50% (cinquenta por cento) do valor do benefício auferido pelo consumidor.

A lei também é clara quando prevê que o beneficiário dispõe de 40% de margem consignável para a adesão a empréstimo consignado e de 10% para a contratação de cartão de crédito. Aquele, mais benéfico ao consumidor.

Portanto, são duas modalidades distintas de contratação:

- No empréstimo consignado o banco tem assegurado o recebimento da totalidade do valor financiado em número determinado de parcelas.

- Já no cartão de crédito com reserva de margem consignada, a garantia só existe em relação ao valor mínimo (10% da margem consignável). Essa circunstância tem reflexo direto nas taxas de juros que incidem nas duas modalidades.

No caso, a autora/apelante é servidora pública aposentada da polícia militar do Estado de Santa Catarina (doc 9). Consta nos autos prova da contratação de cartão de crédito consignado (doc 37), documento devidamente assinado pelo aderente/titular, cuja assinatura não foi impugnada, com informações acerca do negócio jurídico celebrado, das características do cartão de crédito consignado e com autorização para desconto em folha de pagamento do "valor mínimo indicado na fatura mensal do cartão de crédito consignado ora contratado". Outrossim, o banco comprova que o valor do saque solicitado, foi transferido para a conta bancária da parte autora mediante Transferência Eletrônica Disponível (doc 28), assim como os saques complementares (docs 29-30).

Impende anotar que, diferentemente da maioria das demandas julgadas por este Órgão Fracionário sobre o tema, a autora/apelante é servidora pública aposentada, pessoa esclarecida, particularidades que afastam os argumentos iniciais de que "firmou com a Ré contrato de financiamento pessoal", "em nenhum momento a Ré informou a...

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