Acórdão Nº 5003322-88.2021.8.24.0930 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 26-01-2023

Número do processo5003322-88.2021.8.24.0930
Data26 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5003322-88.2021.8.24.0930/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: JOSE SANSÃO (AUTOR) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


José Sansão interpôs recurso de apelação cível, em face da sentença proferida pelo juiz de direito, Dr. Giancarlo Rossi, da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou improcedentes os pedidos da "ação declaratória de inexistência de débito c/c restituição de valores e indenização por dano moral", ajuizada em face do Banco PAN S/A, nos seguintes termos:
JOSE SANSãO propôs Ação Anulatória de Contrato c/c Obrigação de Fazer contra BANCO PAN S.A., ambos qualificados na inicial. Aduziu que celebrou contrato de empréstimo com a parte ré, o qual restou efetivado em modalidade diversa da pretendida, pois desejava firmar empréstimo consignado, que restou pactuado na modalidade cartão de crédito consignado com RMC (Reserva de Margem Consignável). Sustentou a existência de falha na informação ao consumidor e de conduta abusiva da instituição financeira ré, consistente na venda casada de cartão de crédito, o que gerou o desvirtuamento do contrato firmado pelas partes, ensejando sua nulidade. Pugnou pela declaração da inexistência da contratação de "empréstimo via cartão de crédito com reserva de margem consignável", com a repetição do indébito, bem como indenização por danos morais em razão de suposta fraude contratual. Requereu a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, valorou a causa e juntou documentos.
Houve a inversão do ônus da prova e o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à parte autora (evento 12).
Citada, a parte ré apresentou resposta por meio de contestação (evento 21). Preliminarmente, defendeu a falta de interesse processual. Como prejudicial de mérito, levantou a prescrição. No mérito, sustentou que o contrato celebrado observou a legislação vigente e a vontade das partes. Esclareceu as características e condições da operação de crédito contratada, defendendo sua legalidade. Requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos.
Réplica no evento 25.
É o breve relato.
[...]
III- Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos veiculados na inicial proposta por JOSE SANSãO contra BANCO PAN S.A., nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, cuja cobrança fica sobrestada em razão da concessão dos benefícios da justiça gratuita, na forma do art. 98, § 3°, do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitada em julgado, cumpridas as formalidades legais, arquive-se.
Em caso de apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões e, em seguida, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina. (evento 27-1G)
Em suas razões recursais, sustentou, em síntese, que: a) o contrato é inválido, pois foi ludibriado pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, pois não recebeu, tampouco utilizou o cartão de crédito; b) a forma como o desconto é realizado, torna o valor recebido impagável, na medida em que apenas da conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização, conforme comprovam as próprias faturas; c) diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada; d) a operação deve ser cancelada, com a respectiva suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução da quantia indevidamente cobrada; e) o banco deve ser condenado ao pagamento de danos morais, em razão do ato ilícito praticado. Ao final, requereu o provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos da ação (evento 33/1G).
Contrarrazões do recorrido, pugnando pelo não provimento do recurso (evento 35/1G).
Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça e foram distribuídos a esta relatoria por sorteio.
Este é o relatório

VOTO


1. Exame de admissibilidade do recurso
Inicialmente, registre-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).
Dito isso, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.
2. Fundamentação
2.1 (Ir)regularidade da operação contratada entre as partes
Em resumo, o apelante defende a ilicitude do negócio, pugnando pela declaração da inexistência da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável, a qual sustenta nunca ter realizado, pois pretendia tão somente a contratação de empréstimo consignado.
Razão não assiste ao recorrente.
A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).
As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):
Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.
[...]
Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:
I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1º;
II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;
III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;
IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;
V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e
VI - as demais normas que se fizerem necessárias.
[...]
§ 5º Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 6º A instituição financeira que proceder à retenção de valor superior ao limite estabelecido no § 5º deste artigo perderá todas as garantias que lhe são conferidas por esta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004)
Em relação aos aposentados e pensionistas do INSS, tais operações ainda se encontram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/08, que, ao tempo da contratação, estabelecia da seguinte forma:
[...]
Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que: (Alterado pela IN INSS/PRESS nº 39, de 18/06/2009).
[...] § 1º Os descontos de que tratam o caput não poderão exceder o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor da renda mensal do benefício, considerando que o somatório dos descontos e/ou retenções não exceda, no momento da contratação, após a...

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