Acórdão Nº 5003372-09.2022.8.24.0016 do Primeira Câmara de Direito Civil, 13-04-2023

Número do processo5003372-09.2022.8.24.0016
Data13 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5003372-09.2022.8.24.0016/SC



RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO


APELANTE: TEREZINHA APARECIDA DOS REIS DA SILVA (AUTOR) APELADO: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)


RELATÓRIO


Trata-se de Apelação Cível interposta por T. A. dos R. da S. contra a sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara da comarca de Capinzal que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Compensação por Danos Morais e Repetição de Indébito n. 50033720920228240016 ajuizada por si em desfavor de F. F. S.A. C., F. e I., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos (Evento 20, Sentença 1 - autos de origem):
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos feitos na Inicial e, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, extingo o processo com resolução do mérito.
Em consequência, revogo a tutela provisória concedida no evento 4.
Com o trânsito em julgado, oficie-se ao INSS comunicando o teor desta sentença, e proceda-se a devolução dos valores depositados no evento 8 em favor da parte autora.
Custas e honorários advocatícios pela autora, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil, suspensa a exigibilidade face o benefício da gratuidade concedido no evento 4.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Transitada em julgado e ultimadas as providências, arquivem-se os autos.
Em atenção ao princípio da celeridade processual e a fim de evitar tautologia, adota-se o relatório da sentença apelada (Evento 20, Sentença 1 - autos de origem):
Terezinha Aparecida dos Reis da Silva ajuizou a presente ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição de indébito e danos morais em face de Facta Financeira S.A. Credito, Financiamento e Investimento, ao argumento de que o réu efetuou contratação indevida em seu nome, com descontos em seu benefício previdenciário.
A decisão de evento 4 deferiu a antecipação da tutela, inverteu o ônus probatório em favor da parte autora e lhe concedeu o benefício da gratuidade da justiça.
Citado, o requerido apresentou contestação no evento 12. Em preliminar, alegou ausência de interesse de agir. No mérito, sustentou a validade da contratação realizada por meio digital, refutou os pedidos de indenização e restituição de indébito e requereu a condenação da autora em litigância de má-fé.
Houve réplica (evento 18).
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
Dos eventos em que se demonstra a prova produzida nos autos:
Extrato do benefício previdenciário (Evento 1, Extrato 9 - autos de origem);
Histórico de créditos do benefício previdenciário (Evento 1, Extrato 10 - autos de origem);
Contrato de empréstimo consignado (Evento 12, Contrato 5 autos de origem);
Comprovante de transferência de valores (Evento 12, Comprovantes 7 - autos de origem).
Inconformada, a apelante sustentou a inexistência de provas da contratação do empréstimo consignado, uma vez que o réu anexou apenas uma fotografia, sem assinatura do contrato. Argumentou que um dos requisitos para formação do contrato é a assinatura, não bastando uma simples fotografia para autorizar transações sem o consentimento da autora, que é pessoa idosa e não possui conhecimento sobre contratação virtual, sendo vítima de uma fraude. Defendeu a inconsistência das informações quanto aos seus dados pessoais; geolocalização genérica e aparelho de celular de confirmação da operação que não pertence ao seu grupo familiar. Por fim, pugnou pelo provimento do recurso para reforma da sentença e procedência dos pedidos da inicial (Evento 24, Apelação 1 - autos de origem).
Em resposta, a apelada apresentou contrarrazões (Evento 33, Contrarrazões 1 - autos de origem).
Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
É o relatório

VOTO


Exame de Admissibilidade Recursal
Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se à sua análise.
Relação de Consumo
De plano, registra-se que ao caso aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, porquanto se trata de relação consumerista, estando de um lado o consumidor e de outro o fornecedor de serviços.
A defesa dos direitos básicos do consumidor deve ser resguardada e, em especial, o previsto no art. 6º, incisos VI, VIII e X, do CDC, que assim dispõem: "São direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; e a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral".
Dessarte, o julgamento da presente demanda está adstrito às regras de proteção ao consumidor, em especial à inversão do ônus da prova, pois ele é parte hipossuficiente e merece especial tratamento.
Mérito
O cerne da questão jurídica cinge-se à contratação indevida de empréstimo consignado.
O recurso, adianta-se, comporta provimento.
Irregularidade do Contrato
Extrai-se dos autos que a controvérsia cinge-se na contratação de empréstimo consignado, em que a autora alega a inexistência de relação jurídica e a ré a regularidade da contratação.
O contrato em questão foi registrado sob o n. 0048617817, no valor de R$ 573,30, em 84 parcelas mensais de R$ 17,23, com início de desconto em 5/2022, conforme extrato do benefício previdenciário (Evento 1, Extrato 9 - autos de origem). Até o protocolo da inicial, a autora demonstrou que os descontos estavam sendo efetuados, presumindo-se o débito de 5 parcelas. Ainda, verifica-se que a parte autora não é pessoa idosa (56 anos) e recebe R$ 1.212,00 de aposentadoria por tempo de contribuição (à época do protocolo), sendo os descontos inferiores à 2% dos proventos mensais.
O réu anexou o contrato, alegando que a contratação se deu por meio digital e que o documento foi assinado eletronicamente (Evento 12, Contrato 5 autos de origem).
Sobre tal modalidade de contratação (eletrônica), importante mencionar que o Código Civil não prevê forma específica para sua validade, prevalecendo a liberdade de forma, desde que respeitado a regra geral prevista no art. 104, que assim dispõe: "a validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei".
A Instrução Normativa do INSS n. 28, de 16 de maio de 2008 prevê requisitos para a autorização do desconto. Vejamos:
Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que:
I - o empréstimo seja realizado com instituição financeira que tenha celebrado Convênio e/ou Acordo com o INSS/Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência - Dataprev, para esse fim;
II - mediante contrato firmado e assinado com apresentação do documento de identidade e/ou Carteira Nacional de Habilitação - CNH, e Cadastro de Pessoa Física - CPF, junto com a autorização de consignação assinada, prevista no convênio; e
III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência.
(...)
De outra parte, importante frisar a obrigatoriedade da instituição financeira em observar os direitos básicos do consumidor, dentre eles do dever de informação, disposto no art. 6°, inc. III, do CDC, além de não executar ou contratar serviços sem autorização expressa do consumidor, sob pena de prática abusiva (ex vi art. 39, VI, do ...

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