Acórdão Nº 5003420-58.2020.8.24.0041 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 17-02-2022

Número do processo5003420-58.2020.8.24.0041
Data17 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5003420-58.2020.8.24.0041/SC

RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO

APELANTE: ELCIO ANDRE LIEBEL (AUTOR) APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Mafra, ELCIO ANDRE LIEBEL promoveu "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais", contra Banco PAN S.A., autuada sob o n. 5003420-58.2020.8.24.0041.

Na inicial, alegou a parte autora, em síntese, ter sido induzida em erro pela casa bancária, ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável, operação bancária diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado que acreditou ter celebrado. Sustentou, a respeito, que não teve a intenção de celebrar contrato de cartão de crédito, não foi comunicada a respeito dos débitos referentes à reserva da margem consignável e não recebeu qualquer cartão para uso. Também disse que julgou ter pactuado empréstimo consignado "padrão", pois o contrato em debate foi avençado de forma idêntica a outras avenças desta modalidade, que já havia celebrado antes, especialmente quanto à forma de pagamento e à quantia disponibilizada. Quanto ao pacto de "cartão de crédito consignado", aduziu que esta modalidade é ilegal, por ensejar onerosidade excessiva ao consumidor, ao restringir a sua liberdade em efetuar outros negócios jurídicos, bem como ao tornar o empréstimo impagável, em razão de o valor descontado corresponder apenas ao pagamento mínimo do cartão, contexto que enseja a prorrogação e o reajuste do restante do débito no mês subsequente. Defendeu, ainda, a ilegalidade na contratação, por não ter autorizado expressamente a cobrança da RMC e por ter sido induzida em erro pelo fornecedor, quando celebrou avença diversa e mais onerosa, havendo violação ao seu direito à informação. Pelo exposto, requereu a declaração de inexistência de contratação, a repetição do indébito em dobro e a condenação da demandada no pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Pediu, por fim, a concessão da gratuidade judiciária (petição inicial, evento 1).

Sua Excelência deferiu a gratuidade da justiça e decretou a inversão do ônus da prova (evento 3).

Citada, a instituição financeira ré apresentou contestação, bem como acostou documentos (evento 10).

Houve réplica (evento 13).

Na sequência, o MM. Juiz FERNANDO ORESTES RIGONI exarou sentença (evento 15), o que fez nos seguintes termos, consoante se extrai de sua porção dispositiva:

(...) Por tais razões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do art. 487, I do CPC, para:

a) converter o contrato originário firmado entre as partes (Evento 10, CONTR2), relativo ao "TERMO DE ADESÃO AO REGULAMENTO PARA UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO PAN" em empréstimo consignado, cujos descontos decorrentes do financiamento bancário devem ser adequados a esta modalidade, com observância às diretrizes preconizadas pelo Bacen, referente a empréstimos concedidos aos aposentados/pensionistas à época da contratação, devendo os valores deduzidos do benefício da parte autora serem descontados do saldo devedor até a quitação integral do empréstimo, observada a margem legalmente consignável, autorizada a repetição do indébito em favor da parte demandante, em dobro, no caso de se constatar valores pagos a maior, cujo montante deverá ser atualizado monetariamente pelo INPC, desde a data de cada pagamento indevido, acrescido de juros moratórios no patamar de 1% ao mês a contar da citação, cujo valor deverá ser apurado em liquidação de sentença por arbitramento (art. 509, inciso I do CPC), ressalvada a opção da parte autora pelo imediato cumprimento, na hipótese de entender se tratar de meros cálculos;

b) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais em favor da parte autora no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do dia 25/09/2015, nos termos da fundamentação acima lançada.

Em razão da sucumbência recíproca, deverão a parte autora e a parte requerida suportar as custas processuais em iguais proporções. Fixo honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, que deverão ser pagos na mesma proporção que as custas processuais aos procuradores adversos, considerando a simplicidade do feito, a prática de poucos atos processuais, o local da prestação do serviço e o tempo de duração do processo, vedada a compensação (Ap. Cív. n. 2008.055809-3, rel. Des. Fernando Carioni).

Advirto que, quanto à parte demandante, a exigibilidade de tais verbas segue suspensa, haja vista a gratuidade da justiça concedida. (...) (destaques do original).

Irresignados, apelaram os contendores.

A casa bancária acionada, em suas razões, preliminarmente, sustentou a possibilidade de juntada posterior de documentos com esteio na excepcionalidade prevista no parágrafo único do art. 435 do Código de Processo Civil. Quanto ao mais, defendeu a legalidade da contratação de cartão de crédito, com reserva de margem consignável. Argumentou, para tanto, que a parte recorrida, por vontade própria, contratou cartão de crédito consignado, conforme termo de adesão anexado ao processado, tendo recebido e usufruído do valor que lhe foi disponibilizado, mediante saque. Após fazer alusão às normas que amparam a modalidade de contratação defendida, bem como as características desta, pugnou pelo julgamento de improcedência da demanda. Também, insurgiu-se em face do comando de repetição dobrada do indébito. Outrossim, suplicou pela declaração de inexistência de danos morais ou pela mitigação do importe arbitrado a tal título, ou mesmo pela fixação do termo a quo de incidência dos respectivos juros de mora à data do arbitramento. Por derradeiro, requereu a "devolução ao Banco apelante dos valores depositados na conta da parte apelada, ou, alternativamente, a compensação dos valores arbitrados a título de danos morais e materiais do valor depositado à parte apelada, a fim de evitar seu enriquecimento ilícito" (evento 26).

De seu turno, no arrazoado recursal que ofertou, a parte autora pugnou a repetição do indébito em dobro, bem como requereu a majoração da indenização por danos morais. Ainda, pugnou que os valores fixados em condenação à parte ré: pelos danos morais sejam acrescidos de juros de mora e correção monetária, a computar, respectivamente, do evento danoso e do arbitramento; e pelos materiais, sejam incrementados de correção monetária desde o desconto indevido e de juros de mora a contar da citação. Também, suplicou que a devolução de valores de sua parte dê-se com correção monetária pelo IGPM, mediante compensação. Por fim, pediu a condenação da parte acionada a arcar integralmente como os ônus de sucumbência, com honorários advocatícios de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa (evento 19).

Com as contrarrazões (eventos 30 e 34), os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Ab initio, antes de se passar à apreciação do mérito do reclamo, esclarece-se que a análise sob enfoque é realizada em consonância com o posicionamento mais atual que vem sendo aplicado neste Órgão Colegiado acerca do tema; bem como não haver falar em não conhecimento do apelo da parte autora, como aduzido pela parte adversa em suas contrarrazões, por ofensa à dialeticidade, na medida em que o apelo do polo consumidor, ainda que apenas parcialmente, desafia a sentença exarada.

Trata-se de recursos de apelação interpostos por BANCO PAN S.A. e por ELCIO ANDRE LIEBEL contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação declaratória de inexistência de débito, com pedidos de repetição do indébito e indenização por danos morais (Autos n. 5003420-58.2020.8.24.0041), promovida pela última contra o primeiro.

Na petição inicial, a parte autora defende, em síntese, a nulidade da avença celebrada, por vício de consentimento, sustentando ter sido induzida em erro pela casa bancária, ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável, operação bancária diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado que acreditou ter celebrado.

A instituição financeira ré, por sua vez, preliminarmente, sustenta a possibilidade de juntada posterior de documentos com esteio na excepcionalidade prevista no parágrafo único do art. 435 do Código de Processo Civil. Quanto ao mais, aduz a validade do contrato de cartão de crédito entabulado entre as partes e, em consequência, a licitude dos descontos efetuados no benefício previdenciário da parte autora.

No tocante à preambular de exibição de documentos diretamente neste grau de jurisdição, inviável dar acolhida ao pedido da parte acionada.

Afinal de contas, à exceção de dos documentos de "Termo de adesão ao regulamento para utilização do cartão de crédito consignado PAN" e de "Solicitação de saque via cartão de crédito - transferência de recursos do cartão de crédito PAN", os demais não constam dentre aqueles juntados na contestação e não se enquadram na qualidade de documento novo (artigo 435, caput, do novo Código de Processo Civil).

Diante disso, "Sabe-se que o momento processual oportuno para a juntada dos documentos necessários a embasar a tese defensiva é a contestação, ressalvados os casos em que ocorra fato novo. Não havendo que se falar em documento novo, porquanto disponíveis e acessíveis ao requerido mesmo antes da propositura da ação (e juntados aos autos somente após a prolação da sentença), não se pode apreciá-los no presente momento processual, sob pena de ficar caracterizada a supressão de instância, vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro". (Apelação Cível n. 0014710-21.2010.8.24.0005, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. em 17.10.2017).

Nesse cenário, haja vista, outrossim, que a justificativa apresentada pelo polo recorrente acerca da juntada documental tardia ("que o banco réu não teve acesso tempestivo a via do...

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