Acórdão Nº 5003569-66.2020.8.24.0037 do Quarta Câmara de Direito Civil, 03-11-2022

Número do processo5003569-66.2020.8.24.0037
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5003569-66.2020.8.24.0037/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: TELEFONICA BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: HENDERSON ESCOLA DE INGLES EIRELI (AUTOR)

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 46/1º grau) por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

1.Trata-se "Ação rescisória c/c declaratória de inexistência de débito, indenização por danos morais e medida de urgência" ajuizada por HENDERSON ESCOLA DE INGLES EIRELLI em face de TELEFONICA BRASIL S.A. Na espécie, a parte autora alega que era cliente do plano de telefonia e internet móvel da ré, entretanto, em virtude de falhas de sinal, optou pela rescisão antecipada do pacto originário. Todavia, foi surpreendida com a negativação de seu nome em decorrência de dívida no valor de e R$ 35.262,89 (trinta e cinco mil e duzentos e sessenta e dois reais e noventa e nove centavos). Sustenta que a quantia se refere à multa por quebra de fidelidade e que, mesmo tendo entrado em contato com a requerida para contestar o valor, não obteve sucesso. Requer dano moral em decorrência da inscrição indevida. Citada (Ev. 20), em contestação, a parte ré, por sua vez, apresenta narrativa divergente. Aduz que não há provas das falhas na prestação dos serviços e que a multa por rescisão antecipada estava prevista no contrato firmado entre as partes. Assim, sustenta que não houve qualquer cobrança indevida, motivo pelo qual a inscrição foi lícita, razão pela qual deseja o afastamento do dano moral.

Ao evento 07 foi deferida a tutela de urgência de natureza cautelar, ocasião em que determinou-se à ré a retirada do nome da autora, no prazo 05 dias, dos órgãos de restrição ao crédito, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, até o limite de R$ 25.000,00.

Houve réplica ao Evento 42.

A Magistrada julgou procedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos:

3. Diante do exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, CPC, JULGO TOTALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Henderson Escola de Ingles Eirelli, a fim de:

a) DECLARAR rescindido o contrato de telefonia móvel e internet celebrado entre os litigantes em razão de descumprimento de obrigação contratual (falha na prestação de serviços);

b) DECLARAR inexistência do débito R$ 35.262,89 (trinta e cinco mil e duzentos e sessenta e dois reais e noventa e nove centavos) diante da ilegalidade da cobrança de multa contratual por quebra de fidelidade;

c) CONFIRMAR, de maneira definitiva, a tutela de urgência concedida em decisão de evento 7, de modo que a ré não poderá inscrever a autora em cadastro de proteção ao crédito por débitos noticiados nesta lide;

d) CONDENAR a ré TELEFONICA BRASIL S.A. ao pagamento de indenização por danos morais quantificados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo INPC do arbitramento e juros de mora de 1% a.m. do evento danoso. (Súmula 54 e 362 STJ)

Por fim, CONDENO a ré no pagamento das custas e despesas processuais, assim como honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação.

Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a ré interpôs apelação, por meio da qual alega: a) a ausência de falha na prestação dos serviços telefônicos; b) a validade da cobrança da multa rescisória; e c) a inexistência de configuração de dano moral. Subsidiariamente, pugna a minoração do quantum indenizatório do abalo moral e a incidência dos juros de mora a partir da citação. Ao final, pleiteia o integral provimento do recurso (evento 54/1º grau).

Contrarrazões no evento 59/1º grau.

VOTO

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Defende a ré/apelante que os protocolos de atendimentos foram bastantes valorados na sentença, embora ultrapassado o período de manutenção obrigatória das gravações, de modo que o conteúdo dos protocolos não consta nos autos, restando apenas a narrativa autoral de que eles comprovariam a suposta falha na prestação dos serviços e um acordo firmado entre as partes, com o que não concorda.

Explica que havendo a alegação de falha de sinal, deveria ser exigida maior comprovação pela autora, a exemplo de apresentação de "print" ou fotografia de medição de velocidade de internet ou interrupção de qualquer serviço, porquanto apenas dois protocolos de atendimento (desconhecidos) são insuficientes para demonstrar um problema contínuo no fornecimento dos serviços, sendo a regularidade destes comprovada pelas faturas anexadas no processo.

Aponta não ser possível simplesmente presumir a alegada má qualidade na prestação dos serviços, devendo ser reformada a sentença que reconheceu a inexigibilidade da multa, especialmente porque a apelada contratou serviços de telefonia e internet móvel pagando valores promocionais e, como contrapartida, se comprometeu a manter o serviço por 24 meses, sob pena de arcar com a multa rescisória do contrato de permanência.

Registra que o limite de 12 meses estabelecido na Resolução n. 632/2014 da Anatel é aplicável apenas aos contratos celebrados por pessoas físicas, o que não é a hipótese dos autos.

Menciona, ainda, ser inviável reconhecer o direito à indenização por danos morais à autora pois, além da higidez da cobrança da multa contratual, os serviços de telefonia utilizados até o cancelamento são devidos, e a fatura levada a registro no cadastro de proteção ao crédito também englobou tal cobrança.

Sobre o caso concreto, colhe-se trecho da sentença recorrida:

Da inversão do ônus da prova

Inicialmente, registra-se que, na hipótese vertente, não há dúvida da incidência do Código de Defesa de Consumidor, ainda que o serviço de telefonia contratado tenha sido utilizado de insumo na atuação das atividades desenvolvidas pela autora, notadamente destinado ao atendimento de clientes e fornecedores, pois é plenamente possível o enquadramento da empresa demandante no conceito de consumidora final.

Primeiro porque o serviço de telefonia móvel não integra a cadeia produtiva da autora - cujo objeto social é escola de idiomas -, tampouco terá o seu custo acrescido no preço dos serviços ofertados por ela, de modo que não pode ser considerado insumo direto.

E, segundo, pois, é evidente que a parte autora, com atuação no ramo de educação - frisa-se, atividade estranha ao objeto da contratação (telefonia) -, possui vulnerabilidade técnica, econômica e informacional em relação tanto à ré, concessionária de serviço de telefonia que dispõe de alto poderio econômico e técnico.

Em sentido semelhante, colhe-se desta Corte de Justiça:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO - TEORIA FINALISTA - PESSOA JURÍDICA - VULNERABILIDADE - AQUISIÇÃO DE PRODUTO QUE NÃO FAZ PARTE DA CADEIA PRODUTIVA - ENCARGO PROBATÓRIO - INVERSÃO DEVIDA - DECISÃO MANTIDA Configura relação de consumo a aquisição de linhas telefônicas por pessoa jurídica de pequeno porte, as quais não fazem parte de sua cadeia produtiva, justo porque a empresa não tem por objeto comercial a revenda desses bens ou algum tipo de prestação de serviço a elas inerente. [...]. (TJSC, Apelação Cível n. 0302336-76.2018.8.24.0082, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 1-10-2019).

Dito isso, certo que as requeridas apresentam-se como pessoas jurídicas fornecedoras (art. 3º, do CDC), ao passo que a autora, por força do art. 2º da lei regente, assumiu o papel de destinatária final dos serviços de telefonia móvel prestados pelas demandadas, sendo, portanto, aplicáveis ao caso em análise as normas da Lei n. 8.078/1990.

Com efeito, no tocante à inversão do ônus da prova (art. 6º, inc. VIII, do CDC), cabe à parte ré o dever de demonstrar a regularidade dos seus serviços, o que não dispensa o mínimo de verossimilhança das alegações trazidas pela parte consumidora, entendimento este que é consagrado na Súmula 55 do Grupo de Câmaras de Direito Civil da Corte Catarinense:

Súmula 55. A inversão do ônus da prova não exime o consumidor de trazer aos autos indícios mínimos do direito alegado na inicial quando a prova lhe diga respeito.

Anotadas essas premissas, passa-se ao mérito da demanda.

No mérito

Compulsando os autos, verifica-se que a requerente informou que em razão da falha na prestação dos serviços pela ré, rescindiu o contrato e realizou a portabilidade para outra empresa de telefonia móvel. A parte ré, por sua vez, defende que a cobrança da multa é legítima, diante da quebra da cláusula de fidelidade com a rescisão contratual antecipada, bem como alega não ter sido comprovada a falha na prestação de serviços.

Verifica-se, portanto, que a existência da relação contratual entre as partes e o pedido de...

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