Acórdão Nº 5003629-02.2021.8.24.0135 do Segunda Câmara Criminal, 30-08-2022

Número do processo5003629-02.2021.8.24.0135
Data30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5003629-02.2021.8.24.0135/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: WILLIAN TELLES DA SILVA (ACUSADO) ADVOGADO: JONATHAN PICONCELLI NEIDERT (OAB SC059617) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca de Navegantes, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra Willian Telles da Silva, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, c/c art. 40, incisos III e VI, ambos da Lei n. 11.343/06, em razão dos seguintes fatos (Evento 1, dos autos de origem):

FATO 1:

No dia 29 de março de 2021, por volta das 17h30min, na Conveniência Chaolin, situada na Avenida Prefeito Juvenal Mafra, n. 8877, Centro, na Cidade de Navegantes/SC, nas proximidades da instituição de ensino Uniandrade1 , o denunciado WILLIAN TELLES DA SILVA, responsável pelo estabelecimento, mantinha em depósito e comercializava, 12 (doze) porções de substância conhecida como cocaína pesando 22g (vinte e duas gramas) e uma porção de maconha pesando 26g (vinte e seis gramas), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, cuja prática envolveu o adolescente R. W. M..

FATO 2:

No dia 1º de abril de 2021, por volta das 20h40min, no mesmo estabelecimento comercial, o denunciado mantinha em depósito e comercializava, 5 (cinco) porções de substância conhecida como cocaína, pesando 3g (três gramas), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, cuja prática envolveu o adolescente R. W. M..

Consta dos autos que a Agência de Inteligência da Polícia Militar de Navegantes havia recebido denúncias de que o denunciado traficava drogas na Conveniência Chaolin, cuja prática contava com o auxílio de adolescentes que portavam e comercializaram os entorpecentes.

À conta disso, em duas abordagens distintas realizadas no local, os agentes públicos confirmaram as denúncias de que havia menores de idade no estabelecimento, sendo apreendida droga com o adolescente R. no dia 29 de março de 2021, além de porções escondidas no banheiro e no gaveteiro do comércio, juntamente com documentos de William e objetos pessoais.

Encerrada a instrução, foi julgada procedente a Exordial, para condenar Willian Telles da Silva ao cumprimento da pena privativa da liberdade de 07 (sete) anos, 06 (seis) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, assim como ao pagamento de 756 (setecentos e cinquenta e seis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, por infração ao disposto no art. 33, caput e §4º, c/c art. 40, incisos III e VI, ambos da Lei n. 11.343/06, por duas vezes (Evento 118, dos autos de origem).

Insatisfeito, o Ministério Público apresentou Recurso de Apelação, em cujas Razões (Evento 125, dos autos de origem) pugna pela exasperação da pena-base, com fundamento na má valoração da conduta social e personalidade do agente, o afastamento da minorante do tráfico privilegiado e a fixação do regime inicial fechado.

Igualmente inconformado, Willian manejou a Irresignação cabível, em cujas Razões (Evento 9, destes autos) requer, preliminarmente, o reconhecimento da inépcia da Exordial e da ausência de justa causa para a deflagração da ação penal ou o desentranhamento do laudo pericial juntado após a conclusão da instrução criminal. No mérito, pleiteia a absolvição, com fundamento na insuficiência probatória. Subsidiariamente, pugna pela aplicação da sanção em seu patamar mínimo legal e a concessão da detração.

Apresentadas as Contrarrazões (Eventos 159, dos autos de origem, e 12, destes autos), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra da Exma. Sra. Dra. Rosemary Machado Silva, manifestou-se pelo parcial conhecimento dos Apelos e, nessa extensão, pelo provimento parcial daquele interposto pelo Ministério Público, com o afastamento da benesse do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, e a fixação do regime inicial fechado para resgate da reprimenda, e pelo improvimento da insurgência defensiva (Evento 15, dos presentes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Os recursos merecem ser conhecidos, por próprios e tempestivos.

Do Apelo de Willian

Das preliminares

Da ausência de justa causa e inépcia da Exordial

Pugna, a Defesa, pelo reconhecimento de nulidade, em razão da inépcia da Exordial, bem como ante a ausência de justa causa para a deflagração da ação penal.

Sem razão.

Consoante se extrai da lição de Norberto Avena, "Justa causa é suporte probatório mínimo em que se deve lastrear a acusação, e que obrigatoriamente deve estar presente, tendo em vista que a simples instauração do processo penal já atinge o status dignitatis do imputado" (Processo penal - 10ª edição - Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 309).

In casu, verifica-se que o oferecimento da Exordial se deu com fundamento nos elementos de convicção produzidos nos autos do Inquérito Policial de n. 5002948-13.2019.8.24.0067, em especial a prova oral colhida na fase administrativa.

Na hipótese, os Policiais Militares Juliano e Gilson foram uníssonos ao afirmar que o estabelecimento pertencente a Willian já havia sido objeto de denúncias em razão do comércio espúrio, sendo que, após a apreensão do adolescente R. e de algumas porções de cocaína no local, este lhes confirmou o envolvimento do Apelante.

A Testemunha Protegida, da mesma forma, disse ser usuária de estupefacientes e relatou já ter adquirido cocaína na conveniência do Recorrente, assim como disse ter conhecimento de que o mesmo armazenava a substância ilícita sob o seu colchão.

Desta forma, tem-se que foram colhidos, na etapa investigatória, indícios suficientes quanto à autoria e materialidade delituosas, de modo que resta evidenciada a existência de elementos aptos a justificar o início da ação penal.

Outrossim, da leitura da Exordial, tem-se que ela descreve suficientemente os fatos delituosos e suas circunstâncias, além de qualificar adequadamente o acusado e indicar os dispositivos por ele infringidos, preenchendo os requisitos exigidos pelo art. 41 do Código de Processo Penal.

A confirmação da tese encampada pelo Ministério Público, por óbvio, depende das provas colhidas durante a instrução probatória as quais serão melhor analisadas por ocasião do mérito.

Tem-se, portanto, que não subsistem as teses preliminarmente apresentadas, uma vez que presente a justa causa para o início da ação penal e devidamente preenchidos os requisitos do art. 41, do CPP.

Ainda que assim não fosse, a superveniência de Sentença condenatória, na qual houve amplo debate acerca dos fatos que ensejaram a deflagração do processo criminal, impede o acolhimento do pleito de inépcia da Exordial, consoante posicionamento pacífico do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO CONFIGURADA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. PERDA DE OBJETO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO ACÓRDÃO ESTADUAL. INOCORRÊNCIA. MANIFESTA ILEGALIDADE OU TERATOLOGIA NÃO IDENTIFICADAS. 1. As alegações de inépcia da denúncia e de falta de justa causa para a ação penal ficam superadas com a superveniência da sentença penal condenatória, independentemente do momento processual em que tais vícios foram arguidos. Precedentes. 2. Agravo regimental conhecido e não provido. (AgRg no RHC 191399, Relatora Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 08/02/2021)

Não há, portanto, como acolher a alegada inépcia da Exordial.

Da juntada de laudo pericial após o encerramento da instrução

Pugna a Defesa, ainda em sede preliminar, pelo desentranhamento do Laudo Pericial juntado pelo Ministério Público quando da apresentação das Alegações Finais, uma vez que já encerrada a instrução processual.

Igualmente sem razão.

É que a juntada, ainda que tardia, da prova técnica mencionada, não trouxe qualquer prejuízo ao Recorrente/Recorrido, uma vez que sua inclusão nos autos, em 17/02/2022 (Evento 111, dos autos de origem), ocorreu mais de um mês antes da apresentação das Alegações Finais defensivas, em 04/04/2022 (Evento 115, dos autos de origem), momento em que oportunizado o pleno exercício do contraditório.

Nesse sentido, aliás, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do AgRg no RHC n. 83.589/RJ, de relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz, em 20/08/2019, ao decidir que "Não se verifica a alegada violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório se a parte teve acesso às provas para apresentação de alegações finais logo após a manifestação ministerial, mesmo que elas tenham sido juntadas aos autos tardiamente".

Idêntico posicionamento foi adotado recentemente, no AgRg no RHC de n. 162.884/RJ, de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2022:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. [...] 2. JUNTADA DE DOCUMENTOS APÓS O INTERROGATÓRIO. POSSIBILIDADE. ART. 231 DO CPP. [...] 2. Prevalece nesta Corte Superior que "a juntada de documentos pela acusação após o interrogatório do réu é admitida, consoante art. 231 do CPP. No caso em tela, inexistente prejuízo (art. 563 do CPP), eis que a defesa apresentou alegações finais após a juntada de documentos pelo assistente da acusação e não ficou demonstrada necessidade de novo interrogatório do réu" (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.638.190/RJ, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 24/11/2020, DJe de 27/11/2020). [...] 8. Agravo regimental a que se nega provimento.

Não há, portanto, razão para o desentranhamento do documento pericial objeto da irresignação.

Do mérito

Pugna, a Defesa, pela absolvição, com fundamento na insuficiência probatória, por entender que os elementos de convicção produzidos não se revelam aptos a justificar a prolação do Édito condenatório.

Razão, outra vez, não lhe assiste.

Tanto a autoria quanto a materialidade restaram demonstradas, em relação a este fato, por meio do Boletins de Ocorrência (Evento 1, Inquérito 1...

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