Acórdão Nº 5003784-44.2020.8.24.0004 do Quinta Câmara Criminal, 29-09-2022

Número do processo5003784-44.2020.8.24.0004
Data29 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5003784-44.2020.8.24.0004/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: EDICO HENRIQUE MOLDER (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Julian de Souza Filipe, Édico Henrique Molder e André Monteiro Gomes, imputando-lhes a prática dos crimes tipificados no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal, e art. 121, § 2º, V, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (autos da Ação Penal - AP, doc. 2):

1. Do homicídio consumado contra a vítima André Barbosa

No dia 7 de janeiro de 2020, por volta das 20h, nos fundos da residência situada na Rua José João Geremias, s/n., Bairro Zona Nova, em Balneário Arroio do Silva/SC, os denunciados Julian de Souza Felipe e Édico Henrique Molder, agindo em comunhão de esforços e mediante unidade de desígnios com André Monteiro Gomes e com outros dois indivíduos não identificados, imbuídos todos de evidente animus necandi, utilizando-s de duas armas de fogo, efetuaram disparos contra a vítima André Barbosa, atingindo-a na região da cabeça e nas regiões cervical, dorsolombar e lombar esquerda, dorsal inferior esquerda e direita e escapular direita, bem como nas mãos e no braço esquerdo.

Em decorrência das múltiplas lesões sofridas, a vítima teve "politraumatismo por projéteis de arma de fogo, com perfurações cardíacas e hemorragia/desorganização cerebral", que foram a causa eficiente de sua morte, conforme se extrai do laudo pericial de exame cadavérico n. 9413.20.00028.

O denunciado André Monteiro Gomes concorreu para a prática do crime de homicídio, na medida em que, aderindo à vontade delituosa dos comparsas, e atuando conforme o plano já traçado, acompanhou a vítima até a residência desta, a pretexto de com ela confraternizar naquele local, oportunidade em que os comparsas a mataram, tendo agido, assim, de forma a assegurar o sucesso do crime, após o qual todos fugiram juntos a bordo do veículo GM/Vectra GL, de placa IGC-0045, pertencente a Julian de Souza Felipe.

1.1 Da qualificadora do motivo torpe

Os denunciados agiram impelidos por motivo torpe, tendo sido o crime de homicídio praticado por ordem (ou "decreto") da facção criminosa "Primeiro Grupo Catarinense" (PGC), da qual os denunciados e a vítima eram integrantes, em retaliação a desentendimentos ocorridos dias antes entre a vítima e outros membros do grupo.

1.2 Da qualificadora da dissimulação/traição

O crime foi cometido medidante dissimulação, tendo o denunciado Julian de Souza Felipe, minutos antes, telefonado para a vítima e lhe informado que a aguardaria na casa desta, sob o argumento de que ele e o denunciado Édico Henrique Molder iriam com ele confraternizar e lhe entregar suas armas de fogo que estavam na posse deles, atraindo-a, assim, para um encontro, durante o qual, agindo à traição, e colhendo-a de surpresa, Julian e Édico, em concurso com André (que acompanhava a vítima, de forma a assegurar que ela realmente fosse para casa, para que tudo saísse conforme o combinado), efetuaram os disparos de arma de fogo em sua direção.

2. Do homicídio tentado contra a vítima Ronaldo Costa Sabino

No mesmo contexto, no dia 7 de janeiro de 2020, por volta das 20h30min, nos fundos da residência situada na Rua José João Geremias, s/n., Bairro Zona Nova, em Balneário Arroio do Silva/SC, o denunciado Julian de Souza Felipe, de posse de uma arma de fogo, agindo em concurso com os denunciados Édico Henrique Molder e André Monteiro Gomes, imbuídos todos de evidente animus necandi, efetuou disparos em direção à vítima Ronaldo Costa Sabino.

O denunciado Julian de Souza Felipe, ao assim agir, deu início à execução de um crime de homicídio, o qual somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, uma vez que, por erro de pontaria, os projéteis não atingiram a vítima, a qual conseguiu pular o muro e fugir do local, escondendo-se em uma casa vizinha.

Os denunciados Édico Henrique Molder e André Monteiro Gomes concorreram para a prática do crime de tentativa de homicídio, na medida em que aderiram à vontade delituosa do comparsa Julian, instigando-o a disparar também contra a vítima Ronaldo Costa Sabino, cuja morte igualmente almejavam, para que esta não testemunhasse em seu desfavor.

2.1. Da qualificadora pela conexão consequencial

O crime de tentativa de homicídio contra a vítima Ronaldo Costa Sabino foi praticado para assegurar a impunidade do crime de homicídio perpetrado pelos denunciados momentos antes contra a vítima André Barbosa, de forma a impedir que Ronaldo os identificasse às autoridades como autores do delito.

A denúncia foi recebida (autos da AP, doc. 24), os réus Édico e André foram citados pessoalmente (autos da AP, docs. 27 e 29) e apresentaram resposta à acusação (autos da AP, docs. 38 e 40).

Foi determinada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional no que tange ao acusado Julian, com base no art. 366 do Código de Processo Penal (autos da AP, doc. 82)

Processado o feito, sobreveio decisão que determinou a cisão do autos em relação ao acusado Julian e que admitiu parcialmente a acusação e: a) pronunciou "o réu Édico Henrique Molder, já qualificado nos autos, para julgamento perante o Tribunal do Júri desta comarca, pela prática, em tese, dos delitos previstos no art. 121, §2º, I e IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal, e art. 121, §2º, V, c/c art. 14, II, c/c art. 29, todos do Código Penal"; b) impronunciou "o réu André Monteiro Gomes, já qualificado nos autos, das imputações previstas no art. 121, §2º, I e IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal, e art. 121, §2º, V, c/c art. 14, II, c/c art. 29, todos do Código Penal" (autos da AP, doc. 146).

Não conformados com a prestação jurisdicional entregue, o Ministério Público interpôs recurso de apelação (autos da AP, doc. 152) e o acusado Édico recurso em sentido estrito (autos da AP, doc. 153), os quais foram, respectivamente, parcialmente conhecido e desprovido e conhecido e desprovido (autos do 2º grau, docs. 7-8).

Ainda irresignado, Édico opôs embargos de declaração (autos do 2º grau, doc. 10), o qual foi conhecido e acolhido para fins de suprir a omissão, porém negado "ao embargante o direito de recorrer em liberdade" (autos do 2º grau, docs. 12-13).

Novamente insatisfeito, o réu Édico interpôs recurso especial (autos do 2º grau, doc. 15), o qual não foi admitido (autos do 2º grau, doc. 17).

Foi certificado o trânsito em julgado em 11/08/2021 (autos do 2º grau, doc. 18).

Submetido Édico a julgamento perante o Tribunal do Júri, a acusação foi julgada procedente para condenar o acusado "ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 25 (vinte e cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, por infração ao art. 121, §2º, I e IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal, e art. 121, §2º, V, c/c art. 14, II, c/c art. 29, todos do Código Penal, na forma do art. 69 do Código Penal" (autos da AP, doc. 312).

Inconformado com a decisão, o réu Édico interpôs recurso de apelação (autos da AP, doc. 314).

Em sede de razões recursais (autos do 2º grau, doc. 27), preliminarmente, alegou a ocorrência de cerceamento de defesa, almejando a anulação do feito e que seja submetido a novo julgamento, pois a defensora nomeada ficou impossibilitada "de examinar o inteiro teor dos trabalhos efetivamente submetidos ao crivo do Tribunal Popular", vez que houve flagrante violação ao art. 495, XIV, do Código de Processo Penal, porquanto as alegações/fundamentos lançados pela acusação e pela defesa em Plenário não restaram descritas na ata da sessão do julgamento, sendo notório o prejuízo, sobretudo porque os debates não foram filmados e "foi condenado ao resgate de pena corporal superior a 25 (vinte e cinco) anos de reclusão" (fls. 2-4).

No mais, em persistindo o édito condenatório, pleiteou, no que tange ao concurso de crimes, pelo afastamento do concurso material e pela aplicação do art. 71, parágrafo único, do Código Penal, "com o implemento da fração de exasperação de 1/6" (fls. 4-5).

Ainda, pediu pela concessão da gratuidade da justiça e pela revisão da prisão preventiva e, porque ausente a contemporaneidade, pela substituição da segregação por medidas cautelares alternativas (fls. 5-6).

Por fim, requereu a fixação de honorários recursais em prol da defensora nomeada (fl. 6).

Foram apresentadas contrarrazões pelo órgão ministerial (autos do 2º grau, doc. 28).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestando-se pelo não conhecimento do recurso no que se refere ao pedido de justiça gratuita e, na parte conhecida, pelo desprovimento do reclamo (autos do 2º grau, doc. 33).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANTONIO ZOLDAN DA VEIGA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2717369v55 e do código CRC e1aa2645.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANTONIO ZOLDAN DA VEIGAData e Hora: 12/9/2022, às 18:32:46





Apelação Criminal Nº 5003784-44.2020.8.24.0004/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: EDICO HENRIQUE MOLDER (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

O recurso, como se verá, merece ser parcialmente conhecido.

1. Do pedido de justiça gratuita

Pugnou o acusado pela concessão da gratuidade da justiça (autos do 2º grau, doc. 27, fl. 6).

Contudo, segundo entendimento jurisprudencial, a questão atinente à concessão dos benefícios da justiça gratuita "[...] é matéria afeta ao Juízo do primeiro grau, a ser discutida após o trânsito em julgado da sentença" (TJSC, Apelação Criminal n. 0002217-97.2019.8.24.0004, de Araranguá, rel. Júlio César M. Ferreira de Melo, Terceira Câmara...

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