Acórdão Nº 5003873-04.2020.8.24.0025 do Terceira Câmara Criminal, 15-02-2022

Número do processo5003873-04.2020.8.24.0025
Data15 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5003873-04.2020.8.24.0025/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: CRISTIAN BUSARELLO (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Gaspar, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Cristian Busarello, dando-o como incurso nas sanções do art. 171, caput, (quatro vezes), na forma do art. 69, ambos do Código Penal, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:

O denunciado CRISTIAN BUSARELLO narrava ser proprietário de uma loja de consertos de eletrodomésticos, na Cidade de Ilhota e Comarca de Gaspar/SC, e, desde dezembro de 2019, valendo-se dessa atividade comercial e de modus operandi idêntico, obteve vantagem ilícita no total de R$ 8.690,00 (oito mil seiscentos e noventa reais), induzindo em erro seus clientes Alyne Cristina Debrassi Silva, Joel José Soares, Daniela Coradini da Silva e Adriano de Castilhos.

A fraude foi cometida mediante o ardil da oferta de um bom preço e da promessa das entregas dos produtos, as quais jamais restaram efetuadas, além do artifício da transação por meio da máquina de cartões de crédito "Pagseguro" em parcelas, as quais CRISTIAN antecipou os respectivos saques, inviabilizando o ressarcimento das vítimas.

FATO 1

E foi assim que, no dia 12 de dezembro de 2019, por volta das 12h, na residência situada na Rua Modesto Vargas, n. 890, Bairro Centro, Município de Ilhota/SC, o denunciado obteve para si vantagem ilícita no valor de R$ 390,005 (trezentos e noventa reais), em detrimento de Alyne Cristina Debrassi Silva, ao ludibriá-la na troca de um sensor de sua máquina de lavar roupas, marca Brastemp, no prazo de 15 (quinze) dias, levando consigo a peça supostamente danificada. No entanto, decorrido o prazo, não obstante as inúmeras tentativas de contato, CRISTIAN não efetuou a troca do sensor e sequer ressarciu a ofendida.

FATO 2

Em 7 de janeiro de 2020, por volta do meio-dia, na Rua Izidoro Mães, n. 140, Bairro Centro, no Município de Ilhota, CRISTIAN obteve para si a vantagem patrimonial em detrimento de José Jose Soares ao ludibria-lo na venda de 1 (um) refrigerador no valor de R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais) e 1 (um) ar condicionado no valor de R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais)6 . José pagou o valor do ar condicionado em espécie e, em relação à geladeira, entregou a CRISTIAN sua geladeira antiga pelo valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), além de efetuar o pagamento de R$ 1.400,00 no cartão de crédito, em cinco vezes. Ocorre que o imputado não entregou os produtos, tampouco ressarciu a vantagem econômica auferida.

FATO 3

Nesta cidade e comarca, no dia 14 de janeiro, por volta das 18h55min, na Rua Júlio Schramm, n. 339, Bairro Sete de Setembro, CRISTIAN ludibriou Daniela Coradini da SIlva quando permutou um ar condicionado, cobrando-lhe o valor adicional de R$ 1.000,00 (mil reais)7 , em 12 parcelas no cartão de crédito, sem lhe devolver a vantagem econômica e tampouco efetuar a entrega do ar condicionado.

FATO 4

No dia 17 de janeiro de 2020, às 15h22min, na Rua Modesto Vargas, n. 890, Bairro Centro, Ilhota/SC, CRISTIAN auferiu vantagem patrimonial em face do ofendido Adriano de Castilhos ao comercializar o aparelho de ar condicionado marca LG, 30.000 BTUs, pelo montante de R$ 4.100,00 (quatro mil e cem reais)8 em 12 parcelas no cartão de crédito, não efetuando a entrega do produto e tampouco ressarcindo-lhe do prejuízo (ev. 1).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente, para condenar o acusado às penas de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 44 (quarenta e quatro) dias-multa, no mínimo legal, por infração ao art. 171, caput, do Código Penal (por 4 vezes), na forma do art. 69 do Código Penal. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 216).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu, inicialmente, que seja reconhecida a nulidade em relação aos crimes praticados em desfavor de Adriano de Castilhos e Daniela Cristina Coradini, por entender que inexistiu qualquer prejuízo às vítimas. Do mesmo modo, pleiteou pela absolvição do defendido no que tange ao crime praticado contra a vítima Alyne Cristina Debrassi, algando a ocorrência de "conflitos relacionados à garantia na prestação de serviço", mas não do crime de estelionato. Por fim, aventou a tese de mero desacordo comercial e de ausência de dolo (ev. 223).

Juntadas as contrarrazões (ev. 233), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, opinou para que, de ofício, seja declarada nula a sentença, por afronta direta ao art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, e ao art. 564, IV, do Código Processual Penal, tendo em vista que o sentenciante limitou-se a registrar a dosimetria da pena na ata de audiência. No mérito, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (ev. 9 SG).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado às sanções do art. 171, caput (por quatro vezes), na forma do art. 69, ambos do Código Penal.

O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Da preliminar de nulidade da sentença suscitada pela Procuradoria-Geral de Justiça Criminal

A douta Procuradoria-Geral de Justiça suscita a nulidade da sentença, em razão de ter sido proferida oralmente, de modo que o magistrado limitou-se a registrar na ata de audiência a dosimetria da pena, sem apresentar os demais requisitos legalmente exigidos, ferindo ao art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, e ao art. 564, IV, do Código Processual Penal.

Data venia, sem razão.

Com intuito de agilizar o trâmite processual, preservando a fidedignidade dos atos e enaltecendo o princípio da oralidade, a Lei n. 11.719/2008, dentre outras inovações, conferiu nova redação aos arts. 403 e 405 do CPP, assim dispondo:

Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. [...]

Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos.

§ 1º Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.

§ 2º No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.

Em comentários ao art. 403 do CPP, colhe-se da obra de Guilherme de Souza Nucci:

Em homenagem à celeridade processual e ao princípio da oralidade, que traz consigo a concentração e a identidade física do juiz, devem as alegações finais ser feitas oralmente. [...] Esse relato oral, formulado pela acusação e pela defesa, não será reduzido a termo, pois não é escrito. Findas as alegações orais, constará do termo apenas o resumo (quem pediu o quê). O juiz deve, então, proferir a sentença. Não lhe cabe chamar o processo à conclusão. Se as partes expõem as suas razões oralmente, nada impede que o magistrado profira decisão, igualmente, na sequência, em respeito à oralidade (Código de Processo Penal Comentado. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 781-782).

A fim de orientar os magistrados, a Corregedoria-Geral de Justiça deste Estado, por intermédio do Provimento n. 20, de 07 de agosto de 2009, propagou a utilização do sistema audiovisual, possibilitando a prolação da sentença na forma oral, assim regulamentando o procedimento:

Art. 241-A. As audiências, sempre que possível, serão registradas mediante gravação fonográfica ou audiovisual em meio eletrônico.

§ 1º A gravação deverá compreender todos os atos da audiência, do início até o término, facultando-se, a critério do juiz, o registro daqueles relacionados com a fase conciliatória.

§ 2º Caso parte ou testemunha tenham dificuldade de se expressar, a audiência, ou ato dela, poderão ser realizados na forma tradicional, registradas as razões no termo de audiência.

§ 3º Em situações excepcionais, para a preservação da honra, da imagem e da intimidade do depoente, ou na hipótese do art. 217 do Código de Processo Penal, o magistrado poderá fundamentadamente autorizar que o registro seja feito apenas em áudio, ou, em último caso, na forma tradicional.

§ 4º O registro das manifestações de advogados, promotores e juízes, tais como alegações finais, pareceres, contraditas, requerimentos, decisões e sentenças, deverá ser feito apenas em áudio, observadas as demais regras previstas nesta subseção.

§ 5º O registro fonográfico ou audiovisual de audiências poderá ser empregado para o cumprimento de cartas precatórias, rogatórias e de ordem, observando-se que na devolução à origem o registro da audiência deverá ser em CD/DVD não regravável, acompanhado de seu termo e de comparecentes.

§ 6º Os locutores/participantes da audiência deverão ser previamente identificados no registro fonográfico ou audiovisual.

§ 7º Durante as gravações, o juiz deverá utilizar os marcadores temáticos disponibilizados pelo sistema, para facilitar a localização de trechos importantes do depoimento ou manifestação.

§ 8º O juiz, o representante do Ministério Público e a parte, ao citar trecho de depoimento ou manifestação para fundamentar decisão, sentença ou alegações, deverão indicar o tempo exato em que o trecho ocorreu, utilizando o relógio marcador da gravação.

[...]

Art. 241-C. É indispensável a lavratura do termo da audiência, devendo nele constar:

I - a natureza da ação, o número dos...

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