Acórdão Nº 5004112-03.2019.8.24.0038 do Quinta Câmara de Direito Público, 22-06-2021

Número do processo5004112-03.2019.8.24.0038
Data22 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 5004112-03.2019.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA


APELANTE: MUNICÍPIO DE JOINVILLE (INTERESSADO) E OUTRO APELADO: PLASBOHN INDUSTRIA DE PLASTICOS LTDA (IMPETRANTE) E OUTROS


RELATÓRIO


O Ministério Público opõe embargos de declaração em relação a acórdão desta 5ª Câmara de Direito Público que contou com esta ementa:
MANDADO DE SEGURANÇA - EXTENSÃO DE APP A PARTIR DE CURSO D'ÁGUA EM ÁREA URBANA CONSOLIDADA - APLICAÇÃO DO ART. 119-C DO CÓDIGO AMBIENTAL ESTADUAL - RIO CANALIZADO - NÃO INCIDÊNCIA DO ESPAÇO TERRITORIALMENTE PROTEGIDO - JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA - RECURSOS E REEXAME DESPROVIDOS.
1. O Código Estadual do Meio Ambiente desobriga a manutenção de APP na hipótese de curso d´água canalizado (art. 119-C). É dizer, a função ambiental desempenhada pela zona de não interferência perde sua conotação original: se o objetivo principal da preservação das margens dos rios é resguardar a mata ciliar, como meio indispensável à estabilização ecológica do local, é mesmo custoso imaginar equivalente serventia para um corpo hídrico confinado em uma galeria determinada.
Trata-se de norma especial, a qual regula hipótese de incidência não contemplada pelo Código Florestal, conforme jurisprudência consolidada nesta Corte de Justiça.
2. O trecho fluvial que passa pelo imóvel se encontra canalizado: seu trajeto original foi modificado pela ação humana, em intervenção antiga, e atualmente tem seu fluxo tubulado - ao menos na porção contígua à propriedade. Sob outro ângulo, o estabelecimento da impetrante está localizado parcialmente em área urbana consolidada, assim como não é considerado como área de risco.
Se houve permissão da municipalidade para a interferência no recurso ambiental no sentido de promover a canalização, não pode agora negar as consequências jurídicas que advêm inevitavelmente dessa conduta liberatória.
Inviável, a partir daí, o condicionamento da conservação da APP para a expedição da licença operacional correspondente.
3. Recursos e remessa necessária desprovidos.
Suscitou omissão no acórdão quanto à aplicação do art. 6º da Lei Complementar 551/2019 do Município de Joinville, o qual estabelece a faixa não edificável próxima aos cursos d´água canalizados. Nessa hipótese, o tal dispositivo concebe uma margem mínima de 5 metros. Há divergência, então, com a desnecessidade de observância de recuo, entendimento firmado na decisão embargada. Ponderou que todas pressupostos concebidos pela norma local estão devidamente preenchidos, notadamente a inserção do imóvel em área urbana consolidada, assim como tubulação em período anterior a 22 de dezembro de 2016.
Quer, então, seja sanada a lacuna para, admitidos os efeitos infringentes, seja reconhecida "a necessidade de respeitar o recuo mínimo de 5 (cinco) metros, a partir da margem do curso hídrico, para realização de qualquer construção".
O embargado apresentou contrarrazões.
Defendeu ser inviável a aplicação da Lei Complementar Municipal 551/2019, tendo em vista que a sentença foi proferida em outubro de 2019, enquanto a norma local somente foi publicada em dezembro daquele ano. Nesse caso, não foi sequer discutida pelas partes. Não somente, o Superior Tribunal de Justiça ao analisar o Tema 1.010 dos Recursos Repetitivos decidiu pela incidência do Código Florestal em detrimento da Lei de Parcelamento do solo, referendando indiretamente as disposições contidas no Código Ambiental Estadual. Mencionou, ainda, que a 21ª Promotoria de Justiça recomendou ao Poder Público municipal a não aplicação da norma local por contrariar os preceitos contidos na Lei 12.651/12

VOTO


1. O Ministério Público protesta pela omissão a respeito da Lei Complementar Municipal 551/2019. Na norma local, especialmente em seu art. 6º, se concebeu uma margem mínima de 5 metros para os cursos hídricos canalizados, mas no acórdão dispensou-se a impetrante de equivalente resguardo ao se aplicar o Código Ambiental Estadual. Deveria preponderar, na sua ótica, a lei municipal.
Antes de tudo, eis o que dispõe o tal art. 6º mencionado pelo Parquet:
Art. 6º Fica estabelecida uma área "non aedificandi", como faixa de serviço, de no mínimo 5,00 (cinco) metros para cada lado das margens dos corpos d`água tubulados, em galeria fechada, ou em canais, localizados em Área Urbana Consolidada (AUC), integrados como microdrenagem no sistema de drenagem do município, anteriormente a 22 de dezembro de 2016.
De fato, não houve abordagem dessa específica norma, mas por uma razão particular: a tal lei municipal que agora protesta pela imperativa incidência foi publicada em... 20 de dezembro de 2019. É posterior à sentença, aos apelos (do Ministério Público e Município) e inclusive às contrarrazões da acionante. O tema, aliás, não foi sequer suscitado pelas partes posteriormente à vigência da lei local, de modo que o pedido foi então analisado sob o marco normativo debatido nos autos, ou seja, a controvérsia quanto à incidência do Código Florestal ou Código Estadual do Meio Ambiente.
Seja como for, a inovação legal ocorreu no curso do feito, e com isso tem incidência o art. 493 do Código de Processo Civil: "Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão". Independentemente do conteúdo de direito municipal, é questão que poderia (rectius, deveria) ser trazida inclusive de ofício pelo juízo e, portanto, demanda análise.
2. Ainda que se reconheça a lacuna, considero que o desfecho do julgamento deva ser mantido.
Há, estimo, uma antinomia apenas aparente entre a norma estadual e aquela de matriz local. Isso porque se ocupam de objetos distintos. O preceito regional disciplina a proteção das matas ciliares sob o ponto de vista ambiental, já a lei municipal ao conceber área não edificável dispõe sobre a ordenação do território trazendo uma limitação administrativa, competência constitucionalmente atribuída aos municípios (art. 30, inc. VIII). É o que se depreende do texto da norma local: "Fica estabelecida uma área "non aedificandi", como faixa de serviço, de no mínimo 5,00 (cinco) metros para cada lado das margens dos corpos d`água tubulados, em galeria fechada". Quer dizer, não apresentam posições antagônicas, mas se complementam. O particular ao pretender interferir no espaço deverá observar as...

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