Acórdão Nº 5004424-52.2021.8.24.0282 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 08-12-2022

Número do processo5004424-52.2021.8.24.0282
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5004424-52.2021.8.24.0282/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: MARIA IZABEL NUNES (AUTOR)

RELATÓRIO

Banco BMG S/A interpôs recurso de apelação cível, em face da sentença proferida pelo juiz de direito, Dr. José Antonio Varaschin Chedid, da 1ª Vara da Comarca de Jaguaruna, que julgou parcialmente procedentes os pedidos da "ação de restituição de valores c/c indenização por danos morais com pedido de tutela provisória de urgência antecipada", nos seguintes termos:

Cuida-se de ação ajuizada por MARIA IZABEL NUNES contra BANCO BMG S.A, ambos já qualificados nos autos, alegando, em síntese, que ao tentar celebrar contrato de empréstimo consignado, a parte requerida efetivou negócio diverso, nominado Reserva de Margem Consignável para Cartão de Crédito em seu benefício previdenciário, oportunidade em que objetiva: (i) a declaração de nulidade do contrato e retirada da reserva de margem de crédito de seu benefício; ou, subsidiariamente, a conversão do contrato em simples empréstimo consignado, ajustando-o às regras pertinentes; (ii) a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados; (iii) a indenização por danos morais.

Indeferida a antecipação dos efeitos da tutela (Evento 9), oportunidade em que se inverteu o ônus probatório em desfavor da parte requerida e foi deferida a gratuidade da justiça em favor da autora.

Citada, a parte requerida apresentou contestação (Evento 15), em que alegou preliminarmente irregularidades na representação da parte autora; prescrição; decadência. No mérito pugnou pela total improcedência dos pedidos, ante a regularidade na contratação.

A parte requerida apresentou réplica (Evento 18).

Intimados para especificarem as provas que pretendem produzir, a autora nada postulou e o requerido pugnou pela audiência de instrução e julgamento.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

[...]

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, inciso I, do CPC, para:

I - DETERMINAR

(a) a adequação do contrato de cartão de crédito de margem consignável para contrato de empréstimo consignado, no valor obtido pela parte autora por meio de transferência bancária (Evento 15, OUT9, Evento 15, OUT10, Evento 15, OUT11, Evento 15, OUT12, Evento 15, OUT13, Evento 15, OUT14);

(b) a incidência de juros remuneratórios conforme os parâmetros definidos pelo Banco Central para a referida modalidade de empréstimo, na data da contratação;

(c) o ajuste do número de parcelas para que elas sejam suficientes para a quitação do débito, considerando um valor fixo de prestação e limitada ao máximo de 5% (cinco por cento) do total do benefício do consumidor, devendo ser realizado da margem consignável com taxa de empréstimo consignável ou, excepcionalmente, caso não haja margem disponível, mediante compensação da dívida com o crédito advindo desta demanda, observada a taxa de empréstimo consignável até a data da efetiva satisfação antecipada, bem como decotados proporcionalmente os juros das parcelas vincendas;

(d) a restituição do que foi pago a maior deve se dar na forma simples, caso cerificado crédito em favor da parte autora, com correção monetária pelo INPC desde cada desconto e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

(e) o cancelamento do cartão de crédito contratado.

II - CONDENAR a parte requerida ao pagamento, a título de indenização por danos morais, a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), acrescida de juros de mora na base 1% ao mês a contar da citação e de correção monetária pelo INPC a partir da presente decisão (Súmula 362 do STJ).

III - DEFERIR a antecipação dos efeitos da tutela para DETERMINAR que os descontos no benefício previdenciário sejam realizados exclusivamente na forma delineada no item I.c desta decisão, cessando a atual forma de desconto, sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), limitada ao montante de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais). Intime-se pessoalmente a requerida a esse respeito para cumprimento imediato desta cessação.Considerando que a parte autora sucumbiu em parte mínima do pedido, condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação (art. 85, § 2º, do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com a interposição de recurso voluntário que atenda aos requisitos objetivos, intime-se a parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. Após as formalidades previstas nos §§ 1º e 2º do art. 1.010 do CPC os autos deverão remetidos ao Tribunal (§ 3º), para recebimento do recurso de apelação (art. 1.011).

Oportunamente, arquivem-se. (evento 34/1G)

Em sua insurgência, o recorrido sustentou, em síntese: a) a ocorrência da prescrição e da decadência do direito de ação; b) que o contrato é válido e foi assinado pela autora e, ela em momento algum negou a contratação, o que faz presumir a sua veracidade; c) o contrato traz em todas as cláusulas a modalidade contratada, e a sua clarividência refuta qualquer vício de consentimento no momento da contratação, pois divulgadas todas as informações necessárias para a correta compreensão do produto que estava sendo adquirido; d) os documentos anexados à peça contestatória não deixaram a menor dúvida de que os descontos mensais refletem, apenas e tão somente, os valores mínimos das faturas do "Cartão de Crédito Consignado" contratado entre as partes, não podendo ser confundidos ou tratados como amortizações sucessivas de um empréstimo consignado; e) a autora não devolveu os valores creditados em sua conta corrente, o que também demonstraria a regularidade da contratação; f) a autora não questionou a veracidade da assinatura aposta no contrato ou negou o recebimento do crédito, evidenciando, assim, a sua expressa adesão ao cartão de crédito consignado; g) requer a reforma da sentença, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na inicial, com a condenação da autora em custas processuais e honorários advocatícios ou, em caso diverso, a compensação de créditos e a devolução dos valores recebidos pela autora (evento 42/1G).

A autora deixou transcorrer in albis o prazo das contrarrazões (evento 51/1G).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça e foram distribuídos a esta relatoria por sorteio.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade do recurso

Inicialmente, registre-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

1.1 Prejudicial de mérito - prescrição e decadência

Sustenta o banco apelado a ocorrência da prescrição, pois, no seu entender, o prazo prescricional aplicável à espécie seria de três anos, conforme dispõe o art. 206, §3º, IV, do CPC.

Defende, ainda, a ocorrência da decadência do direito da autora em requerer a restituição dos valores que entende teriam sido indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, argumentando que o prazo decadencial aplicável à espécie seria de quatro anos e, levando-se em conta que o contrato impugnado foi celebrado entre as partes no ano de 2015, a autora teria decaído do direito de ação, uma vez que ajuizou a demanda no ano de 2021.

Entretanto, sem razão a instituição financeira.

No caso em tela, tratando-se de ação com pedido de reparação de danos fundada em responsabilidade contratual, o exercício da pretensão de direito material submete-se ao prazo ordinário de dez anos previsto no art. 205 do Código Civil, nestes termos: "A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor."

Esta posição consoa com o atual entendimento emanado do Superior Tribunal de Justiça, que assim tem decidido:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. NULIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO DECENAL. 1. Em se tratando de responsabilidade contratual, como sucede com os contratos bancários, salvo o caso de algum contrato específico em que haja previsão legal própria, especial, o prazo de prescrição aplicável à pretensão de revisão e de repetição de indébito será de dez anos, previsto no artigo 205 do Código Civil. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1769662/PR, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 25-06-2019).

Pela teoria da actio nata, o direito à reparação surge quando lesado o direito do ofendido, de sorte que, no caso em exame, o termo inicial do cômputo do prazo prescricional dá-se na data da assinatura do contrato, pois, a partir de então nasce a pretensão referente ao contrato em si, que a autora alega ter pactuado sob outra modalidade, com cláusulas e encargos diversos.

Quanto à decadência, o pleito inicial formulado pela demandante consiste na declaração de nulidade de contratação decorrente de suscitado vício de consentimento na contratação, ou seja, o pleito almejado pela demandante não se trata de um direito potestativo, motivo pelo qual, ao caso, apenas é cabível a aplicação de prazo prescricional.

Na hipótese, constata-se que a contratação ocorreu, a princípio, em 17-11-2015 (evento 15/1G, CONTR6) e o ajuizamento da ação subjacente foi...

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