Acórdão Nº 5004462-58.2020.8.24.0069 do Quinta Câmara Criminal, 15-12-2022

Número do processo5004462-58.2020.8.24.0069
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5004462-58.2020.8.24.0069/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: DIELISON DA SILVA TERRES (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Ramon Maciel Espíndula e Diélison da Silva Terres, imputando-lhes a prática do crime tipificado no art. 121, § 2°, I, IV e V, do Código Penal, conforme o seguinte fato narrado na inicial acusatória (autos da Ação Penal - AP, doc. 3):

PRELIMINARMENTE

Inicialmente, para fins de contextualização, registra-se que a autoridade policial, no curso das investigações realizadas nos autos n. 5003848-53.2020.8.24.0069 e 5004399-33.2020.8.24.0069, obteve informações de que os denunciados RAMON MACIEL ESPÍNDULA, vulgo "RATO" e DIÉLISON DA SILVA TERRES associaram-se no intento de matar faccionados inadimplentes e descumpridores das normas da organização criminosa conhecida por "Primeiro Grupo Catarinense (PGC)", atuante nesta Comarca, da qual os denunciados fazem parte.

Ainda, restou apurado que o denunciado RAMON MACIEL ESPÍNDULA, vulgo "RATO", era o responsável por receber "a ordem" da facção criminosa e planejar a execução dos assassinatos, ao passo que o denunciado DIÉLISON DA SILVA TERRES, vinculado a ele, auxiliava-lhe materialmente, fornecendo-lhe arma de fogo, veículo, motocicleta e "mão de obra" nas empreitadas criminosas.

ATO I - DO HOMICÍDIO DE LUIZ FERNANDO DA SILVA

Foi assim que, no dia 03 de maio de 2020, por volta das 12hs20min, no interior da residência localizada na Rua W3, no bairro Jardim Ultramar, na cidade de Balneário Gaivota, o denunciado DIÉLISON DA SILVA TERRES, de posse de uma arma de fogo, agindo em conjunto e em comunhão de esforços com um indivíduo ainda não identificado, ambos com evidente intenção homicida, cumprindo as ordens e seguindo o plano arquitetado por RAMON MACIEL ESPÍNDULA, vulgo "RATO", deram início ao ato de matar a vítima Luiz Fernando da Silva, que se consumou em 18 de maio de 2020, na cidade de Criciúma.

Na ocasião, a mando do denunciado RAMON MACIEL ESPÍNDULA, vulgo "RATO" - que tinha total domínio do fato, tendo poder tanto para frear quanto para impulsionar o ato criminoso - o acusado DIÉLISON DA SILVA TERRES e um terceiro ainda não identificado, embarcados numa motocicleta, dirigiram-se até a frente da casa da vítima, que se encontrava no interior da residência, e quando esta abriu a porta de sua casa - notadamente para atender quem estava lhe chamando -, os agentes efetuaram diversos disparos de arma de fogo contra seu corpo, dentre os quais, 1 (um) lhe atingiu a cabeça, na região maxilar direita da face, 3 (três) lhe atingiram o abdômen, na face anterior abdominal à direita, e outros 2 (dois) lhe atingiram o antebraço direito e a face lateral da coxa esquerda (conforme Laudo Pericial n. 9412.20.00966).

Em ato contínuo o denunciado DIÉLISON DA SILVA TERRES e o terceiro indivíduo ainda não identificado, evadiram-se do local do crime na condução da referida motocicleta.

A vitima Luiz Fernando da Silva, por conta dos diversos ferimentos que sofreu, foi encaminhada, ainda com vida, pelo corpo de bombeiros ao hospital de Sombrio, e posteriormente, ao hospital em Criciúma, vindo a óbito em 18 de maio de 2020, em razão de "choque séptico - Traumatismo de múltiplos órgãos intra abdominais, por agressão por disparo de arma de fogo [...]", conforme descrito no Laudo Pericial n. 9412.20.00966.

Enfatiza-se que o crime foi praticado para assegurar a ocultação da organização criminosa "Primeiro Grupo Catarinense (PGC)" e do delito de tráfico de drogas praticado pelos denunciados, porquanto o ofendido Luiz Fernando da Silva - que traficava naquela região, sob os comandos do denunciado RAMON MACIEL ESPÍNDULA, vulgo "RATO", ambos integrantes da mencionada facção -, teria "caguetado" seu "chefe" e o grupo criminoso às autoridades policiais. Da mesma forma, foi praticado por motivo torpe porque a morte da vítima era necessária para o fortalecimento da organização criminosa.

O crime, ainda, foi praticado mediante circunstância que impossibilitou a defesa do ofendido, uma vez que os agentes surpreenderam a vítima chamando-a para fora de casa e atirando de inopino assim que o visualizaram.

Recebida a denúncia (autos da AP, doc. 7), devidamente citados (autos da AP, docs. 23-24), os réus apresentaram resposta à acusação (autos da AP, docs. 25 e 43).

Processado o feito, sobreveio decisão que admitiu a acusação e pronunciou "os acusados Ramon Maciel Espíndula e Dielison da Silva Terres nas sanções do art. 121, §2º, I, IV e V do CP; para submetê-los a julgamento perante o Tribunal do Júri" (autos da AP, doc. 123).

Submetidos a julgamento perante o Tribunal do Júri, a acusação foi julgada parcialmente procedente para: a) "absolver o réu Ramon Maciel Espíndula, nos termos do artigo 492, II, do CPP": b) condenar "o acusado Diélison da Silva Terres, qualificado, ao cumprimento da pena de 19 (dezenove) anos e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, ante o incurso nas penas do artigo 121, §2º, incisos I, IV e V, do Código Penal" (autos da AP, doc. 274).

Irresignado com a decisão, o acusado Diélison interpôs recurso de apelação (autos da AP, doc. 276 e 285).

Em suas razões (doc. 6), porque a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, requereu ser absolvido (fls. 2 e 7).

De maneira subsidiária, no que tange à segunda etapa dosimétrica, pretendeu, em razão da multiplicidade de agravantes, a aplicação de fração conforme o critério progressivo ou outra mais justa, de modo que a majoração no patamar de 1/6 para cada circunstância agravante, operada no decisum, se mostrou desproporcional, imotivada e inidônea (fl. 8).

Foram apresentadas contrarrazões pelo órgão ministerial (doc. 8).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Henrique Limongi, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (doc. 10).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANTONIO ZOLDAN DA VEIGA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2987922v23 e do código CRC b2cb8d1a.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANTONIO ZOLDAN DA VEIGAData e Hora: 7/12/2022, às 6:29:41





Apelação Criminal Nº 5004462-58.2020.8.24.0069/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: DIELISON DA SILVA TERRES (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

O acusado interpôs a presente apelação visando, em suma, absolvição, por ser a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos, bem como pretendeu, subsidiariamente, a alteração do cálculo utilizado no decisum no que se refere às circunstâncias agravantes.

Ab initio, pontuo que é consubstanciado que, na hipótese de ser a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos, cabe apenas ao Tribunal ad quem anular e submeter o réu a novo julgamento, conforme dicção do § 3º do art. 593 do Código de Processo Penal, e não simplesmente absolver o acusado, reformando a decisão proferida pelo Tribunal Popular.

Nesse diapasão:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA E CONEXOS. TRIBUNAL DO JÚRI. CRIMES DE HOMICÍDIO TENTADO QUALIFICADO (POR DUAS VEZES), DE AMEAÇA E CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO (ART. 121, § 2º, I, II e III C/C § 4º C/C ART. 14, II; ART. 147, AMBOS DO CÓDIGO PENAL; ART. 21 DO DEC.-LEI N. 3.688/41). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA [...] AINDA, PLEITO SUBSIDIÁRIO PARA APLICAÇÃO DA FIGURA DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR OU DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA. RECURSO DE APELAÇÃO NO PROCEDIMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI POSSUI HIPÓTESES RESTRITAS DAS ALÍNEAS DO INCISO III, DO ART. 593, DO CPP. COMPETÊNCIA DESTE TRIBUNAL QUE SE RESUME A ANULAR O JULGAMENTO SE CONSIDERADO CONTRÁRIO A PROVA DOS AUTOS, PEDIDO QUE NÃO FOI REALIZADO PELA DEFESA. INVIOLABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SOBERANIA DO JULGAMENTO DOS JURADOS. "O princípio regente dos processos de competência do Tribunal do Júri é o da soberania dos vereditos populares e, portanto, os recursos interpostos contra tais decisões possuem fundamentação vinculada, ou seja, devem basear-se nas hipóteses previstas nas alíneas do inciso III e § 3º do art. 593 do CPP. O Tribunal de Justiça não possui competência para analisar se o Conselho de Sentença valorou de forma adequada as provas, mas apenas verificar se a decisão é arbitrária e dissociada do conjunto fático-probatório, conforme art. 593, III, "d", do CPP (TJSC, Apelação Criminal n. 0002052-89.2015.8.24.0004, de Araranguá, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 16-02-2017)" [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0000263-95.2016.8.24.0044, de Orleans, rel. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, Quinta Câmara Criminal, j. 22-02-2018, grifei).

Portanto, registro que eventual acolhida da pretensão fulcrada no art. 593, III, "d", do Código de Processo Penal, enseja a aplicação imediata do viés do § 3º do art. 593 do Código de Processo Penal, sendo que o pedido será sob tal ótica apreciado.

Pois bem.

Ressalto que a insurgência baseada em ser a decisão dos jurados, manifestamente contrária à prova dos autos, somente é possível quando o veredito do Tribunal Popular for completamente divorciado dos elementos probatórios presentes no processo. Existindo uma versão que ampare a decisão do Conselho de Sentença, não é possível anulá-la.

Assim, não cabe ao Tribunal ad quem escolher a melhor tese, mas apenas avaliar se aquela encampada pelos juízes populares está refletida em alguma (ou algumas) prova(s) do processo.

Nesse sentido, ensina Renato Brasileiro de Lima:

para que seja cabível apelação com base nessa alínea e, de modo a se...

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