Acórdão Nº 5004471-85.2019.8.24.0091 do Terceira Câmara de Direito Público, 25-10-2022

Número do processo5004471-85.2019.8.24.0091
Data25 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5004471-85.2019.8.24.0091/SC

RELATORA: Desembargadora BETTINA MARIA MARESCH DE MOURA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: LUCAS GARCIA DA ROSA (AUTOR) INTERESSADO: POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Por bem retratar o processado, adota-se o relatório da sentença (evento 119, SENT1):

"Trata-se de AÇÃO DE RITO COMUM ajuizada por LUCAS GARCIA DA ROSA em face do ESTADO DE SANTA CATARINA.

Sustentou o autor que participou do concurso público para ingresso no Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar de Santa Catarina, regido pelo Edital 042/CGCP/2019. Delineou que foi reprovado na etapa de avaliação psicológica por não possuir todas as características do perfil profissiográfico previstas na legislação de regência e no edital do certame.

Alegou que os testes psicológicos aplicados padecem de diversas irregularidades que prejudicaram a análise da aptidão do candidato, resultando em ato administrativo nulo.

Suscitou as seguintes teses para demonstrar a ilegalidade do laudo psicológico e a necessidade de revisão do ato administrativo na via judicial: a) reprovação decorrente da inadequação dos testes psicológicos utilizados; b) descumprimento das disposições do Decreto 1.479/13, uma vez que não foram realizados a entrevista individual e o questionário semiestruturado; c) descompasso com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, porquanto a resposta dada pela banca ao recurso administrativo não respeitou o requisito de validade "possibilidade de revisão do resultado"; d) ocorrência de violação das disposições editalícias do certame e das normativas do Conselho Federal de Psicologia; e) falhas no dia da aplicação da fase de avaliação psicológica e também na fase de entrevista devolutiva; f) ausência de estudos científicos para a montagem do perfil profissiográfico exigido; g) necessidade de análise conjunta das características avaliadas e não somente a aplicação de testagem psicológica; h) impossibilidade de utilização do exame psicotécnico como critério de eliminação do candidato do certame; i) ilegalidade de exigência de um perfil profissiográfico para ingresso em cargo público.

Dessa forma, requereu "que seja afastada a inaptidão do Autor na Avaliação Psicológica e, consequentemente, que o Autor, cumprindo os demais requisitos, seja incluso e matriculado no Curso de Formação de Soldado da Polícia Militar de Santa Catarina, com todos os seus consectários legais". Pediu justiça gratuita e juntou documentos (Evento 1, Docs. 1/10).

Intimada para juntar documentos que comprovem sua situação de hipossuficiência, a parte autora recolheu as custas processuais (Eventos 3 e 7).

Determinou-se a citação do réu (Evento 11).

Em contestação, o réu alegou a preliminar de litisconsórcio passivo necessário a ser formado com todos os participantes do certame. No mérito, defendeu a legalidade dos critérios de aplicação e correção dos testes psicológicos adotados pela Administração. Aduziu também que a revisão da conclusão dos psicólogos que compõem os quadros da Corporação Militar configura intromissão do Poder Judiciário no mérito do ato administrativo e viola o princípio da separação de poderes, bem como interfere no tratamento isonômico dado aos participantes do mesmo concurso público (Evento 14).

Houve réplica (Evento 17) e pedido pela juntada das atas das salas do certame (Evento 18).

Ato contínuo, a preliminar suscitada pelo réu foi afastada e deu-se o processo por saneado (Evento 20).

A parte autora apresentou quesitos (Evento 25).

Com a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 0300771-50.2018.8.24.0091/50000 (TEMA 21), houve a suspensão processual (Evento 31).

Posteriormente, o Grupo de Câmaras de Direito Público firmou as teses jurídicas do Tema 21 do IRDR/TJSC (autos 50095060820198240000). Na sequência, as partes foram intimadas para manifestarem-se sobre o novo entendimento firmado pela Corte de Justiça (Evento 39)

A parte autora sustentou a realização da perícia judicial nos moldes da tese fixada no IRDR (Evento 45).

Por sua vez, o réu pediu o julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, I, do CPC, com a improcedência dos pleitos iniciais. Sucessivamente, considerando que os exames psicológicos aplicados no concurso já foram atestados como regulares pelo Conselho Regional de Psicologia e por perícias judiciais, pugnou pela improcedência dos pleitos iniciais. Ainda, sustentou, caso se entenda pela necessidade de produção de prova pericial, que esta seja feita por amostragem, em casos paradigmas, relativas ao mesmo concurso público, com mesmas causas de pedir, devendo a parte autora arcar com o ônus financeiros decorrente (Evento 44).

Com vista dos autos, o Ministério Público deixou de exarar manifestação de mérito (Evento 48).

Nomeou-se perito para a atuação no feito (Evento 50).

O Estado de Santa Catarina e o autor apresentaram quesitos complementares (Evento 54 e 64).

O demandante anexou comprovante de pagamento dos honorários periciais (Evento 66).

Sobreveio parecer psicológico (Evento 91).

As partes se manifestaram sobre o laudo pericial (Eventos 96 e 97).

O Ministério Público manifestou ciência dos atos processuais praticados (Evento 101).

Intimou-se o experto para que procedesse à recorreção dos testes, a fim de concluir pela aptidão ou não (Evento 103).

O perito apresentou laudo complementar (Evento 108).

O réu pugnou a improcedência da ação (Evento 112).

Em sequência, a parte autora requereu a procedência dos pedidos (Evento 114).

O Ministério Público manifestou ciência dos atos processuais praticados (Evento 117)."

A sentença foi pela procedência dos pedidos iniciais, sob este dispositivo:

"[...] Ante o exposto, JULGAM-SE PROCEDENTES os pedidos formulados por LUCAS GARCIA DA ROSA, para se determinar: a) a anulação do ato que considerou o autor inapto na etapa psicológica; b) a reclassificação do demandante no certame, observando-se os demais critérios editalícios.

Destaca-se que o ingresso no curso de formação respectivo depende da aprovação do candidato em todas as etapas do certame, bem como figurar em classificação final dentro do número de vagas previstas no Edital.

Condena-se a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 85, § 2º e do CPC. A Fazenda Pública é isenta do pagamento de custas processuais." (grifo no original)

Irresignado, o Réu interpôs recurso de apelação (evento 133, APELAÇÃO1). Reitera a "impossibilidade da intervenção do Poder Judiciário no mérito da decisão administrativa (sob pena de ofensa aos arts. e 37, II, da Constituição Federal), ressalvado o controle da legalidade e a necessidade de observância estrita do princípio da isonomia". Sustenta que a avaliação está devidamente motivada e fundamentada e que foi aplicada dentro dos limites previstos nas normas de regência e procedimentos científicos. Menciona que "a perícia extrapolou seu mister" e, portanto, "não pode ser utilizada como fundamento para a procedência da ação". Isso porque, "o laudo não aponta qualquer mácula na avaliação psicológica objeto da ação que justifique sua anulação", todavia "a perícia entende que o autor por ser considerado 'apto' fazendo uma 'análise conjunta' com o teste NEO PI-R utilizado no concurso para avaliar outras características". Argumenta que "o edital do concurso não previu a utilização de mais de um teste para mensurar a mesma característica", devendo prevalecer, por conseguinte, a conclusão oficial. Ao final, requer a reforma do decisum, para que sejam julgados improcedentes os pedidos iniciais.

Intimado, o Autor deixou de oferecer contrarrazões (evento 135, EP1G) e na sequência, os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Plínio Cesar Moreira, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 6, PROMOÇÃO1).

Este é o relatório.

VOTO

1. Da admissibilidade

Inicialmente, consigno que a decisão recorrida foi publicada quando já em vigor o Código de Processo Civil de 2015, devendo este regramento ser utilizado para análise do recebimento da apelação.

Assim, presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso e da remessa necessária.

2. Do apelo e do reexame

Trata-se de remessa necessária e apelação cível interposta pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença que julgou procedente a "Ação Declaratória Constitutiva", deflagrada por Lucas Garcia da Rosa.

Em suas razões, reitera a "impossibilidade da intervenção do Poder Judiciário no mérito da decisão administrativa (sob pena de ofensa aos arts.2º e 37, II, da Constituição Federal), ressalvado o controle da legalidade e a necessidade de observância estrita do princípio da isonomia". Sustenta que a avaliação está devidamente motivada e fundamentada e que foi aplicada dentro dos limites previstos nas normas de regência e procedimentos científicos. Menciona que "a perícia extrapolou seu mister" e, portanto, "não pode ser utilizada como fundamento para a procedência da ação". Isso porque, "o laudo não aponta qualquer mácula na avaliação psicológica objeto da ação que justifique sua anulação", todavia "a perícia entende que o autor por ser considerado 'apto' fazendo uma 'análise conjunta' com o teste NEO PI-R utilizado no concurso para avaliar outras características". Argumenta que "o edital do concurso não previu a utilização de mais de um teste para mensurar a mesma característica", devendo prevalecer, por conseguinte, a conclusão oficial.

O inconformismo, adianta-se, comporta acolhimento.

Da avaliação psicológica realizada pela banca examinadora (evento 1, LAUDO7, fl. 3), infere-se que o Apelado/Autor foi considerado inapto, em razão de não ter obtido a pontuação necessária, na análise da característica Perseverança:

O Grupo de Câmara de Direito Público, em recente julgamento do IRDR n. 5009506-08.2019.8.24.0000 (Tema 21), firmou a seguinte tese: "É...

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