Acórdão Nº 5004695-30.2020.8.24.0045 do Terceira Câmara Criminal, 02-03-2021

Número do processo5004695-30.2020.8.24.0045
Data02 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5004695-30.2020.8.24.0045/SC



RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN


APELANTE: LUCAS LUNELLI DE CAMPOS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Palhoça, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Lucas Lunelli de Campos, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/06, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:
No dia 11 de abril de 2020, por volta da 20h30mim, policiais militares receberam informações que em um imóvel situado na rua Carlos Steinmetz, s/n., Barra do Aririú, Palhoça, haveria drogas armazenadas, e, ao chegarem em frente ao local, avistaram o denunciado LUCAS LUNELLI DE CAMPOS em atitudes suspeitas, buscando se afastar da viatura, oportunidade em que foi abordado e localizado em seu bolso um cigarro de maconha, admitindo ter drogas em casa.
Foi, então, que os agentes públicos, diante do forte odor de maconha em torno do imóvel e com o aval do denunciado e da esposa dele, adentraram no imóvel, oportunidade em que encontraram embaixo do sofá a quantia aproximada de 1.850g (mil oitocentos e cinquenta gramas) de maconha, e uma faca com resquícios da droga. Já no quarto do denunciado LUCAS LUNELLI DE CAMPOS foi localizado um telefone celular, a quantia de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais), uma balança de precisão e um caderno com anotações de tráfico, tudo conforme Auto de Apreensão e Auto de Constatação Provisória de Substância Entorpecente dos autos do APF (Evento 1 - fls. 5 e 6).
Desse modo, constatou-se que o denunciado LUCAS LUNELLI DE CAMPOS guardava/mantinha em depósito, substância entorpecente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, com destinação diversa do consumo próprio, cuja composição é capaz de causar dependência física e/ou psíquica, estando proibido o comércio em todo território nacional (Evento 1).
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado às penas de 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 682 (seiscentos e oitenta e dois) dias-multa, por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06. Foi-lhe negado o direito de apelar em liberdade (Evento 106).
Irresignada, a defesa do acusado interpôs recurso de apelação, no qual requereu, em preliminar, a nulidade das provas obtidas, em razão da violação de domicílio. No mérito, pugnou pela sua absolvição diante da insuficiência probatória, e, alternativamente, a desclassificação do crime de tráfico de drogas para aquele previsto no artigo 28 da Lei n. 11.343/06 (Evento 10).
Juntadas as contrarrazões (Evento 13), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto Speck, opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 16).
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o apelante às sanções previstas pelo art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06.
O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Da violação de domicílio
Preliminarmente, suscita a defesa a nulidade das provas coligidas nos autos em decorrência da violação de domicílio, porque a diligência ocorreu sem o consentimento do morador, mandado judicial ou estado de flagrância.
Sem razão.
Isso porque, a partir da leitura atenta dos autos, como se verá em seguida, extrai-se que os policiais militares, ao receberem informações de que haveria drogas armazenadas em um imóvel, dirigiram-se ao local e avistaram Lucas Lunelli de Campos em frente à residência, em atitudes suspeitas, esquivando-se da viatura, momento em que foi abordado e localizado em seu bolso um cigarro de maconha. Em razão disso, e diante do forte odor da substância em torno do imóvel, com o consentimento do denunciado, adentraram na residência e apreenderam 1.801,5g (um mil, oitocentos e um gramas e cinco decigramas) de maconha [consoante infere-se do laudo pericial acostado ao Evento 43] e uma faca com resquícios da droga, localizadas embaixo do sofá, além da quantia de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais), uma balança de precisão e um caderno com anotações contábeis do tráfico.
Desse modo, diante da evidente situação flagrancial do crime de tráfico de drogas, delito de natureza permanente -, era prescindível autorização judicial para realização de busca e apreensão em domicílio, pelo que as provas decorrentes da referida diligência não estão tomadas de nulidade.
O art. 5º, XI, da Constituição da República ressalva a possibilidade: "XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial" (grifou-se).
O Supremo Tribunal Federal, em recurso representativo de controvérsia, confirmou a desnecessidade de autorização judicial para a violação domiciliar, nas hipóteses de crimes permanentes. Veja-se:
Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2. Inviolabilidade de domicílio - art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residência em caso de flagrante delito. No crime permanente, a situação de flagrância se protrai no tempo. 3. Período noturno. A cláusula que limita o ingresso ao período do dia é aplicável apenas aos casos em que a busca é determinada por ordem judicial. Nos demais casos - flagrante delito, desastre ou para prestar socorro - a Constituição não faz exigência quanto ao período do dia. 4. Controle judicial a posteriori. Necessidade de preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da Constituição. Proteção contra ingerências arbitrárias no domicílio. Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente. A inexistência de controle judicial, ainda que posterior à execução da medida, esvaziaria o núcleo fundamental da garantia contra a inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger contra ingerências arbitrárias no domicílio (Pacto de São José da Costa Rica, artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo 17, 1). O controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição, quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico. Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa. A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso,...

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