Acórdão Nº 5004790-53.2022.8.24.0930 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 04-04-2023

Número do processo5004790-53.2022.8.24.0930
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5004790-53.2022.8.24.0930/SC



RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN


APELANTE: IVANDRA MARCIA VEZARO (AUTOR) ADVOGADO(A): MONICA MELLA (OAB SC055977) ADVOGADO(A): JEAN CARLO CABRERA (OAB SC040682) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO(A): SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478)


RELATÓRIO


IVANDRA MARCIA VEZARO ajuizou ação declaratória de nulidade de desconto em folha de pagamento/ ausência do efetivo proveito c/c repetição de indébito e danos morais, com pedido de tutela provisória antecipada de urgência em carater incidental (RMC) em face de BANCO PAN S.A., ao argumento de que, em síntese, está sofrendo descontos indevidos em seu benefício previdenciário, os quais são realizados a título de reserva de margem consignável oriunda de contrato de cartão de crédito que aduz ter sido contratado mediante um desvirtuamento da real operação de crédito que pretendia contratar.
Concedido o benefício da justiça gratuita à parte autora (evento 9).
Contestação apresentada (evento 21).
Réplica no evento 29.
Sobreveio sentença de mérito, com o seguinte dispositivo (evento 31):
Ante o exposto, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo improcedentes os pedidos consubstanciados na inicial.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios do patrono do réu, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), ex vi o artigo 85, §8º, do Código de Processo Civil.
A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à(s) parte(s) ativa, durante o prazo extintivo de 5 (cinco) anos, em face da concessão dos benefícios da Gratuidade da Justiça, nos termos dos arts. 98 a 102 do CPC e da Lei 1.060/1950.
Os litigantes estão obrigados a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo, observada a mesma proporção antes fixada, admitida a compensação, conforme art. 82, § 2º, do CPC.
Publique-se Registre-se Intime-se.
Em caso de apelação, verificado o cumprimento dos requisitos dos parágrafos 1º e 2º do art. 1.009 do CPC, ascendam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, nos termos do parágrafo 3º do art. 1.010.
Transitada em julgado, arquive-se.
Irresignada, a parte requerente interpôs recurso de apelação (evento 37), no qual requer: a) seja declarada a inexistência da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito e da reserva de margem consignável, a título de RMC (cartão de crédito); b) a condenação da instituição financeira ré ao pagamento de danos morais e à repetição do indébito simples; c) a inversão do ônus sucumbenciais, com a condenação do banco demandado ao pagamento integral das custas processuais.
Contrarrazões no evento 39.
É o relatório

VOTO


Realizada a admissibilidade recursal, passa-se à análise das insurgências levadas ao duplo grau de jurisdição.
1 Legalidade do contrato firmado entre as partes
Sustenta a parte apelante que a sentença singular deve ser reformada para declarar a inexistência da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito, o qual originou os descontos a título de reserva de margem consignável, realizados no seu benefício previdenciário.
Para tanto, alega que sua intenção era apenas a de fazer um empréstimo consignado simples e jamais a de contratar cartão de crédito, o qual aduz nunca sequer ter utilizado ou desbloqueado. Argumenta, ainda, que a manutenção dos termos do contrato sub judice implicará em uma dívida vitalícia e impagável, a qual representa obrigação totalmente desproporcional ao consumidor.
Depreende-se, portanto, que a celeuma principal cinge-se na verificação da (i)legalidade da contratação de empréstimo de numerário, por meio de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e, também, na averiguação da existência de eventual vício de consentimento em relação à referida contratação.
Compulsando detidamente o caderno processual, verifica-se, por incontroverso, que houve uma transação formalizada pelas partes para realização de empréstimo de dinheiro, o qual se consolidou por meio do documento "Termo de Adesão ao Regulamento para Utilização do Cartão de Crédito Consignado Pan", acostados no evento 21, ANEXO3.
Entretanto, apesar de os referidos documentos estarem formalmente perfeito e possuírem a assinatura da ora parte recorrente, o contexto fático-probatório coligido nos autos, revela uma ilicitude na referida contratação, a qual se materializa no fato de que a parte autora foi induzida a contratar o cartão de crédito em questão com o fim único e exclusivo de viabilizar uma operação financeira de mútuo, qual seja, o empréstimo na modalidade consignado, o qual lhe é disponibilizado em razão da sua condição de aposentado pelo Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.
Oportunamente, cabe destacar que a casa bancária não apresentou as faturas do cartão de crédito supostamente contratado pela parte autora para fins de aquisição de produtos ou pagamento de serviços.
Doutro vértice, dessume-se dos autos que a instituição financeira recorrida sequer comprovou o envio ou a efetiva entrega do aludido cartão no endereço do demandante, o que poderia ser facilmente provado por meio da apresentação de documento idôneo assinado pela parte.
Sendo assim, tem-se por evidente que a pretensão da parte autora, ora apelante, era firmar, tão somente, o denominado "empréstimo consignado puro e simples", com parcelas fixas e preestabelecidas e não a de adquirir cartão de crédito que, conforme já salientado, não foi sequer utilizado para aquisição de produtos e serviços de consumo (fim específico de um cartão de crédito).
Com efeito: "O consumidor firma o negócio jurídico acreditando tratar-se de um contrato de empréstimo consignado, com pagamento em parcelas fixas e por tempo determinado, no entanto, acaba por aderir a um cartão de crédito, de onde é realizado um saque imediato e cobrado sobre o valor sacado, juros e encargos bem acima dos praticados na modalidade de empréstimo consignado, gerando assim, descontos por prazo indeterminado [...]" (Tribunal de Justiça do Maranhão, Apelação Cível n. 043633, de São Luis, Rel. Cleones Carvalho Cunha). [...]" (Apelação Cível n. 0300673-62.2018.8.24.0092, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 20-11-2018).
Tendo em vista os esclarecimentos alhures, é muito improvável que o consumidor submeter-se-ia a um contrato de cartão de crédito sem a intenção de fazer uso deste, simplesmente porque não o queria ou porque não saberia da sua finalidade. Ora, se a intenção do requerente era empréstimo de pecúnia, não haveria razão lógica para contratar um cartão de crédito com desconto de margem consignável apenas para esse fim específico.
De mais a mais, não é crível que a casa bancária demandada tenha prestado informações claras e adequadas sobre a viabilidade da parte requerente formalizar contrato de empréstimo por outros meios (menos onerosos), destacando as diferenças dos custos e encargos. Fosse assim, não haveria dúvidas que o ora apelante iria utilizar-se do meio menos custoso, ou seja, o empréstimo consignado "simples", com juros reduzidos, números de prestações e, principalmente, com termo final.
A propósito, em consonância com a Instrução da Normativa INSS/PRES, n.100, de 28-12-2018, que alterou a Instrução Normativa do n. 28/2008, disciplinadoras da modalidade contratual sob enfoque (saque via cartão de crédito consignado), são necessários os seguintes requisitos:
"Art. 21-A Sem prejuízo das informações do art. 21, nas autorizações de descontos decorrentes da celebração de contratos de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável, o contrato firmado entre o beneficiário do INSS e a instituição consignatária deverá, obrigatoriamente, nos termos da decisão homologatória de acordo firmado na Ação Civil Pública n. 0106890-28.2015.4.01.3700, ser acompanhado de Termo de Consentimento Esclarecido - TCE, que constará de página única, reservada exclusivamente para tal documento, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação do Cartão de Crédito Consignado, e conterá, necessariamente:
I - expressão "TERMO DE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO", inserida na parte superior do documento e com fonte em tamanho quatorze;I
I - abaixo da expressão referida no inciso I do 'caput', em fonte com tamanho onze, o texto: "Em cumprimento à sentença judicial proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 106890-28.2015.4.01.3700, 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de São Luís/MA, proposta pela Defensoria Pública da União";
III - nome completo, CPF e número do beneficio do cliente;
IV - logomarca da instituição financeira;
V - imagem em tamanho real do cartão de crédito contratado, ainda que com gravura meramente ilustrativa;
VI - necessariamente como última informação do documento, espaço para preenchimento de local, data e assinatura do cliente;
VII - as seguintes inscrições, todas registradas em fonte com tamanho doze e na ordem aqui apresentada:
a)"Contratei um Cartão de Crédito Consignado";
b)"Fui informado que a realização de saque mediante a utilização do meu limite do Cartão de Crédito Consignado ensejará a incidência de encargos e que o valor do saque, acrescido destes encargos, constará na minha próxima fatura do cartão"; c)"A diferença entre o valor pago mediante consignação (desconto realizado diretamente na remuneração/beneficio) e o total da fatura poderá ser paga por meio da minha fatura mensal, o que é recomendado pelo (nome da instituição financeira), já que, caso a fatura não seja integralmente paga até a data de vencimento, incidirão encargos sobre o...

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