Acórdão Nº 5004867-73.2021.8.24.0000 do Quinta Câmara de Direito Público, 17-08-2021

Número do processo5004867-73.2021.8.24.0000
Data17 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5004867-73.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

AGRAVANTE: AMAURY MEDEIROS DE FIGUEIREDO E OUTRO AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Amaury Medeiros de Figueiredo e Denise Mendes de Figueiredo interpõem agravo de instrumento em relação a decisão havida na Vara da Fazenda Pública da Comarca de Palhoça.

Relatam que ajuizaram ação de rito comum buscando a anulação de auto de infração ambiental (que gerou a imposição de multa) e de embargo de obra por falta de licença ambiental do Loteamento Farol. A tutela de urgência foi deferida apenas para suspender a exigibilidade da multa. Insistem, porém, na necessidade de suspensão dos efeitos do embargo administrativo sobre o empreendimento imobiliário.

Narram que são proprietários de um terreno localizado na Praia do Sonho, no Município de Palhoça. Uma parte dessas terras estava inserida no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e foi objeto de desapropriação judicial; no entanto, sobre a parte remanescente criaram, em 1976, o Loteamento Farol, cuja implantação se deu em 1987, mediante parcelamento do solo, registro individualizado dos lotes, obtenção de licenças e pagamento de impostos territoriais. O empreendimento imobiliário está localizado dentro do perímetro urbano, em área densamente povoada e completamente antropizada, e foi novamente aprovado em 2012 com algumas modificações no projeto.

Apesar de toda regularidade formal, urbanística e ambiental do loteamento, foram autuados pela Polícia Militar Ambiental em 30-1-2017, sob argumento de promoverem o parcelamento do solo sem autorização do órgão ambiental. Apresentaram defesa administrativa, mas o auto de infração foi homologado e culminou na imposição de multa e embargo total da área até que seja obtida licença ambiental. Além disso, houve remessa de termo circunstanciado ao Ministério Público para apuração de responsabilidade criminal, tendo sido arquivado por atipicidade da conduta. Aliás, o Curador do Meio Ambiente, um dos maiores conhecedores daquela área, reconheceu a regularidade do loteamento e ausência de dano ao meio ambiente ou à ordem urbanística.

Ocorre que o magistrado se baseou na afirmativa do policial militar no sentido de que o loteamento está inserido em Área de Preservação Ambiental (APA) do Entorno Costeiro do Parque Estadual da Serra Tabuleiro (PEST) e por isso necessitaria de nova licença ambiental. Só que o parecer do Ministério Público, o curador do referido Parque, vai em sentido contrário, apontando que "o zoneamento municipal estabelece para aquele local a classificação como possível de ocupação para habitações", de modo que não prevalece a presunção de veracidade da alegação do policial.

Sustentam, ainda, que o fato pelo qual se deu a autuação vincula as autoridades administrativa e judiciária em relação à análise de legalidade do ato administrativo. Dessa forma, como o embargo da obra está amparado na divisão dos lotes, abertura de ruas e instalação de energia elétrica, fica evidente que inexiste conduta recente para justificar a paralisação da obra, uma vez que tais providências já tinham sido praticadas há muitos anos.

Relaciona prova documental demonstrando que o parcelamento do solo é antigo e foi realizado mediante licença válida do órgão ambiental da época (a Fatma), pelo que inexistiria o fato apontado pela autoridade administrativa para justificar o ato sancionador.

Reitera que a localização da gleba está inserida em área urbana consolidada e, como apontou o Parquet, não conta com cursos d'água, dunas ou restingas. Ainda que se tratasse de APP, o que não é o caso, é pacífico o entendimento deste Tribunal quanto à flexibilização da proteção ambiental em áreas antropizadas.

Por fim, destaca que não é possível exigir novas licenças com base em aplicação retroativa de lei ambiental, como preconizado na decisão agravada, haja vista que isso fere o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.

Quer a suspensão do embargo administrativo da área.

A tutela recursal foi negada.

O Estado diz que o imóvel está localizado em área de preservação ambiental - APA do Entorno Costeiro - e envolve atividade potencialmente poluidora (de acordo com o disposto no item 71.11.01 da Resolução 13/2012 do Consema), além de estar inserido em município de Zona Costeira (item 71.11.00 da Resolução 98/2017 do Consema), razões pelas quais depende de prévio licenciamento ambiental (art. 10 da Lei 6.938/1981 e 29 da Lei Estadual 14.675/2009).

Defende que "todo procedimento realizado pela Polícia Militar Ambiental está adstrito à legislação aplicável ao caso". Como a licença para implementação do projeto de loteamento foi concedida há mais de 30 anos, operou-se a caducidade, uma vez que não houve execução no prazo do cronograma (arts. 12, §1º da lei 6.766/1979 e 34, p. único, da Lei Municipal 18/1993). A certidão de zoneamento não se refere ao mesmo imóvel e o arquivamento da apuração criminal não interfere na esfera administrativa.

Além disso, "não há que se falar em situação consolidada, já que a implantação do loteamento está apenas iniciando. Se fosse consolidada não estariam sendo feitas, agora, as obras para implantação do parcelamento de solo". Dessa forma, "considerando que o empreendimento está sendo, de fato, implementado na atualidade, devem ser aplicadas todas as normas de proteção ambiental vigentes neste momento, sendo de fundamental importância a realização do licenciamento ambiental, conforme indicou a fiscalização da Policia Militar Ambiental". Inexiste desrespeito à legalidade, segurança jurídica ou irretroatividade da lei, até porque deve prevalecer a presunção de legitimidade do ato administrativo e os princípios da precaução e prevenção que visam ao desenvolvimento sustentável e equilibrado do meio ambiente.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

VOTO

1. Os fatos, muito resumidamente, são estes:

Os agravantes adquiriram 104.475,30m² de terras localizadas no Município de Palhoça (registro n. 29.788. Parte do imóvel foi desapropriada para abertura da SC 433 (autos 045.91.000079-2) e outra parte, com 29.775,88m², foi indenizada pelo Estado de Santa Catarina por estar inserida no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro - PEST (autos 045.91.000165-9). A área remanescente de 66.710,75m², por sua vez, foi registrada sob a matrícula 20.821, na qual foi constituído e averbado o Loteamento Farol, composto de 131 glebas já individualizados (evento 1, informação 19), cujo projeto foi aprovado administrativamente pelo Município de Palhoça em 23-2-1976 (evento 1, informação 12, fl. 2), tendo, ainda, sido objeto da Lei Municipal 726 de 15-4-1987 (evento 1, informação 14), e reaprovado em 12-12-2012 (evento 1, informação 20),

Ocorre que em 30-1-2017 a Polícia Militar Ambiental esteve no local e lavrou o termo de embargo n. 6082 (evento 1, informação 6) e o auto de infração n. 45545-A com base no seguinte fato:

Promover o parcelamento do solo - atividade potencialmente poluidora - em uma área de 66.710 m2 (sessenta seis mil setecentos e dez) com divisão em lotes, abertura de rua, instalação de energia elétrica, etc., sem autorização do órgão ambiental competente. (evento 1, informação 5).

Houve abertura do processo administrativo de infração ambiental no qual foi exercido o contraditório, mas a autoridade administrativa decidiu homologar o auto de infração e o termo de embargo, impondo multa de R$ 2.000,000 e mantendo a área embargada até que fosse realizada a reparação do dano ou legalizada a atividade. Ainda abriu 120 dias para apresentação do licenciamento ambiental do parcelamento do solo (evento 1, informação 48).

Paralelamente, tramitou o termo circunstanciado n. 0001202-38.2017.8.24.0045 para apurar a responsabilidade criminal quanto à promoção do parcelamento do solo sem autorização, que acabou sendo arquivado por atipicidade da conduta (evento 1, informação 46), diante do acolhimento do seguinte parecer ministerial:

(...) verifico que o loteamento é regular, conforme demonstra a petição e os documentos apresentados pelo autor do fato e juntados aos autos (fls. 24/113). Os lotes estão regulares e numerados conforme a matrícula (fls. 55 e 56).

O loteador detém as autorizações administrativas necessárias (fis. 30/32; 38; 47/48; 53/92; 101, 112/113), manteve desde longa data o imóvel sempre limpo, cercado e com o arruamento definido (conforme imagens de fl. 40). Não existem cursos d'água nem complexos dunares ou outros bens ambientais presentes e que mereçam conservação integral.

Não ocorrem invasões na grande área de terras que compõem o loteamento, graças à diligente ação fiscalizatória do loteador. O zoneamento municipal estabelece para aquele local a classificação como possível de ocupação para habitações. Naquele local, um empreendimento planejado, legalizado, e com padrão elevado de respeito às normas urbanísticas e...

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