Acórdão Nº 5004922-76.2021.8.24.0015 do Quinta Câmara Criminal, 10-02-2022

Número do processo5004922-76.2021.8.24.0015
Data10 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5004922-76.2021.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: ALEXANDRO RODRIGUES DOS SANTOS NUNES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Alexandro Rodrigues dos Santos Nunes, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, §4º, II, do Código Penal, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (doc. 2 da ação penal):

No dia 4 de julho de 2021, por volta das 9:30 horas, no interior da distribuidora de gás denominada "Ligeirinho Gás", localizada na Rua Frei Menandro Kamps, s/n, Centro, município de Canoinhas/SC, o denunciado ALEXANDRO RODRIGUES DOS SANTOS NUNES, de forma livre e consciente da reprovabilidade de sua conduta, com o propósito de se assenhorear do patrimônio alheio, e mediante escalada, uma vez que pulou o muro do local, subtraiu para si, 1 (um) casco de botijão de gás, avaliado em R$200,001 (duzentos reais), de propriedade da vítima Valdemar Berlande Filho.

Recebida a denúncia (doc. 4 da ação penal) e encerrada a instrução processual, sobreveio sentença (doc. 22 da ação penal), na qual foi julgada procedente a pretensão Ministerial para condenar o réu à pena de 3 (três) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, pela prática do delito descrito no art. 155, § 4º, II, do Código Penal.

Irresignado, o réu interpôs recurso de apelação (doc. 27 da ação penal), no qual pleiteou o reconhecimento do princípio da insignificância, tendo em vista a inexpressividade da lesão jurídica provocada e a situação de miserabilidade do réu.

Subsidiariamente, postulou a desclassificação do delito para a modalidade de furto simples, porque o laudo pericial informou que havia apenas vestígios de furto mediante escalada, em oposição ao alegado pelo acusado.

Requereu, ainda, readequação da pena, com o afastamento da valoração negativa da culpabilidade, pois esta teve como fundamento ação penal em curso, o que é vedado pela Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça. Postulou também a exclusão da negativação dos antecedentes criminais, porque suas condenações pretéritas foram consideradas tanto na primeira quanto na segunda fase da dosimetria, configurando bis in idem. Ainda, requereu a compensação integral entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, porque a exasperação da pena na segunda fase não teria sido devidamente justificada pelo Juízo de origem.

Por fim, pugnou pela fixação de honorários recursais ao defensor dativo nomeado.

Foram apresentadas contrarrazões no doc. 29 da ação penal.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Excelentíssimo Senhor Doutor Marcílio de Novaes Costa, o qual se manifestou pelo conhecimento e parcial provimento do apelo (doc. 3).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANTONIO ZOLDAN DA VEIGA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1624256v13 e do código CRC 3189e4ad.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANTONIO ZOLDAN DA VEIGAData e Hora: 24/1/2022, às 17:5:20





Apelação Criminal Nº 5004922-76.2021.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: ALEXANDRO RODRIGUES DOS SANTOS NUNES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

1 Absolvição

O apelante postulou, inicialmente, sua absolvição, pela aplicação do princípio da insignificância, diante de ofensividade mínima da conduta, tendo em vista o valor irrisório do item furtado e a condição de miserabilidade do réu.

A insurgência, contudo, não merece guarida.

De início, registra-se que a materialidade do delito é inconteste e desponta dos documentos anexos ao doc. 7 do inquérito policial 5004870-80.2021.8.24.0015 - os quais compreendem o Auto de Prisão em Flagrante (fl. 2), o Boletim de Ocorrência (fls. 3-4), o Auto de Exibição e Apreensão (fl. 10), o Auto de Avaliação (fl. 11), o Termo de Reconhecimento e Entrega (fls. e 17) - e do Laudo Pericial do doc. 7 da ação penal.

A autoria, da mesma forma, está consubstanciada nos respectivos documentos, bem como na prova oral produzida nas duas etapas da persecutio criminis (docs. 2-6 do inquérito e doc. 20 da ação penal).

Sobre o tema do pleito, consoante o entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, "a incidência do princípio da insignificância pressupõe a concomitância de quatro vetores: a mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação; o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada" (HC 543.102/SP, Rel. Ministro Nefi Codeiro, Sexta Turma, j. 4-2-2020, grifou-se).

Nessa perspectiva, Cleber Masson leciona:

O reconhecimento do princípio da insignificância depende de requisitos objetivos, relacionados ao fato, e de requisitos subjetivos, vinculados ao agente e à vítima. Por esta razão, seu cabimento deve ser analisado no caso concreto, de acordo com as suas especificidades, e não no plano abstrato.São quatro os requisitos exigidos pelo princípio da insignificância: (a) mínima ofensividade da conduta; (b) ausência de periculosidade social da ação; (c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e (d) inexpressividade da lesão jurídica. (Direito penal: parte geral. 13. Ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2019, p. 24, grifei).

A partir disso, percebe-se que o princípio da insignificância encontra fundamento em valores de política criminal, objetivando diminuir a intervenção do Direito Penal em situações de ofensa mínima à ordem social. Contudo, sua aplicação deve ser analisada com cautela, sempre levando-se em consideração as peculiaridades do caso concreto e as circunstâncias de fato relacionadas à pessoa do agente, a fim de evitar o incentivo da prática reiterada de pequenos delitos.

Na hipótese, verifica-se que não se encontram preenchidos os pressupostos necessários ao reconhecimento do princípio da bagatela.

O apelante argumentou que o valor do botijão de gás no montante exposto na denúncia carece de embasamento técnico, afinal, em pesquisa realizada pelo defensor à tabela da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o preço médio do gás em Santa Catarina era R$ 90,33 (noventa reais e trinta e três centavos).

Argumento, no entanto, infundado.

Isso porque o valor do metro cúbico do gás não se confunde com o preço do botijão que o armazena. No caso vertente, o réu subtraiu não apenas o gás, vide a impossibilidade do feito, mas também o recipiente, o botijão.

Ademais, além do auto de avaliação (doc. 7, fl. 11, do inquérito), o valor do bem subtraído foi corroborado pelo proprietário da empresa de revenda de gás, em juízo, conforme doc. 20 da ação penal, a partir de 4'54". Nesse sentido, ao se considerar que a vítima era justamente profissional do ramo de venda de gás e botijões, é evidente seu conhecimento sobre o tema, de modo que não há dúvidas acerca do acertado valor do bem, em acordo com o valor disposto na denúncia.

Assim sendo, o valor da res furtiva não condiz com a definição de irrelevância, tendo em vista que foi avaliada em R$ 200,00 (duzentos reais) conforme o auto de avaliação e o depoimento da vítima na Delegacia, além do testemunho prestado pelo proprietário da empresa ofendida em Juízo (doc. 20 da ação penal, a partir de 4'54").

A propósito, sabe-se que o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, como parâmetro para a incidência do princípio da bagatela, o valor equivalente a 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente à época do cenário fático - estabelecido no patamar de R$ 1.100 (mil e cem reais) no ano de 2021 -, de modo que a res que superar o percentual estipulado prejudica a aplicação do referido princípio, porquanto a conduta não pode ser considerada de mínima ofensividade.

Veja-se:

PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DA RES FURTIVA. INAPLICABILIDADE. DECISÃO MANTIDA.I - A jurisprudência desta Corte Superior se firmou no sentido de que são requisitos para a incidência do princípio da insignificância a mínima ofensividade da conduta do agente, a inexistência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.II - Esta Corte Superior de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que, não se há falar em aplicação do princípio da insignificância quando o valor da res furtivae ultrapassar o montante de 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente à época do fato. Precedentes. (AgInt no HC n. 299.297/MS, Sexta Turma, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, DJe de 31/5/2016).Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 1472928/MG, Rel. Ministro Leopoldo de Arruda Raposo, Quinta Turma, j. 1º-10-2019, grifei).

Somado a isso, o fato de o apelante ser reincidente na prática de ilícitos, conforme certidões de antecedentes criminais (docs. 9 e 10 do inquérito), desautoriza, definitivamente, o reconhecimento da atipicidade material da conduta pelo princípio da bagatela.

Ademais, o Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina já se manifestou anteriormente sobre a vedação do reconhecimento da insignificância em delitos...

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