Acórdão Nº 5005010-42.2021.8.24.0039 do Quarta Câmara de Direito Público, 19-05-2022

Número do processo5005010-42.2021.8.24.0039
Data19 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5005010-42.2021.8.24.0039/SC

RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI

APELANTE: MUNICÍPIO DE LAGES/SC (RÉU) APELADO: TERRA NOVA RODOBENS INCORPORADORA IMOBILIARIA - LAGES I - SPE LTDA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Município de Lages, nos autos da ação anulatória n. 5005010-42.2021.8.24.0039 proposta por Terra Nova Rodobens Incorporadora Imobiliaria - Lages I - SPE LTDA., inconformado com a sentença que julgou procedente a ação para anular a aplicação da multa indicada na petição inicial e o condenou ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados 10% sobre o valor atualizado da causa (Evento 35).

Nas razões do recurso, alega, em suma, que a sentença padece de error in judicando, posto que a multa aplicada pelo Procon decorre de atuação legítima (pela teoria dos poderes implícitos) diante da violação à legislação consumerista, por ausência de informações claras ao consumidor, com cláusulas de difícil compreensão, nos termos do art. 6, III e art. 46, ambos do Código de Defesa do Consumidor, bem como, constatou a ilegalidade do ato de recusar a entrega das chaves quando substancialmente adimplido o contrato. Aduz que, "considerando-se que pela teoria dos poderes implícitos é possível ao Procon interpretar cláusulas contratuais e exercer controle de legalidade, não se pode negar a tal órgão a possibilidade de constatar a ilegalidade do ato de recusar a entrega das chaves quando substancialmente adimplido o contrato, sob pena de indevidamente impedir sua atuação regular, prejudicando os próprios consumidores". Nestes termos, pugna pela reforma da sentença, julgando-se improcedente a ação, com a inversão dos ônus sucumbenciais (Evento 40).

Terra Nova Rodobens Incorporadora Imobiliaria - Lages I - SPE LTDA. apresentou contrarrazões, defendendo a manutenção da sentença, com a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência (Evento 44).

A Douta-Procuradoria de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. César Augusto Grubba, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (Evento 6, nesta instância).

Após, vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Quanto ao juízo de admissibilidade, verifica-se que a pretensão recursal preenche todos os pressupostos processuais intrínsecos e extrínsecos, razão pela qual deve ser conhecida.

Cuida-se, na origem, da ação anulatória n. 5005010-42.2021.8.24.0039 proposta por TERRA NOVA RODOBENS INCORPORADORA IMOBILIARIA - LAGES I - SPE LTDA., objetivando a desconstituição de multa aplicada pelo PROCON do Município de Lages, no valor R$ 104.468,00 (cento e quatro mil, quatrocentos e sessenta e oito reais), pela prática de ato contrário à legislação consumerista.

Referida sanção pecuniária originou-se dos processos administrativos ns. 1151/2012 e 1094/2012, instaurados em decorrência de reclamações formuladas por diversos consumidores perante o Procon de Lages, ocasião em que alegaram ter adquirido imóveis junto à empresa reclamada para pagamento através de financiamento da Caixa Econômica Federal. Aduziram que o financiamento fora aprovado para pagamento total do imóvel, com subsídios do programa "minha casa minha vida", porém, a reclamada estaria condicionando a entrega das chaves dos imóveis ao pagamento da diferença relativa a saldo do financiamento. Informaram, ainda, que a reclamada estaria induzindo os consumidores a assinar um termo de confissão de dívida e que o valor concedido e pago pela Caixa Econômica Federal à reclamada seria inclusive superior ao previsto no contrato de compra e venda (Evento 18, OUT2 a OUT11).

Terra Nova Rodobens Incorporadora Imobiliaria - Lages I - SPE LTDA. pronunciou-se acerca das reclamações, aduzindo, em síntese, que, no contrato ajustado entre as partes, consta a previsão no sentido de que "caso o valor do crédito obtido pelo comprador junto ao agente financeiro não fosse suficiente para a quitação do débito atualizado verificado à época, o mesmo deveria efetuar o pagamento da diferença encontrada sob pena de não receber a posse do imóvel", conforme cláusulas 2.5.5 e 2.5.5.1 do instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóveis. Alega que, em razão da atualização dos valores dos imóveis pelo INCC, há diferença entre os valores aprovados nos financiamentos em relação aos valores atualizados dos respectivos imóveis. Logo, não havendo o pagamento das diferenças apontadas, a reclamada reserva-se o direito de não entregar as chaves dos imóveis (Evento 18, OUT12 e OUT13, fls. 1\26).

Posteriormente, foi designada e realizada audiência para a tentativa de conciliação, contudo, a mesma restou inexitosa, conforme cópia da Ata juntada (Evento 18, OUT13, fl. 32).

Na sequência, instaurou-se o processo administrativo, notificando-se a reclamada para impugnação (Evento 18, OUT13, fls. 34\37). Concluidos os atos do procedimento nos autos do Processo Administrativo, o Procon entendeu subsistentes as reclamações dos consumidores, por infração ao Código de Defesa do Consumidor, proferindo a decisão, da qual se extrai (Evento 18, OUT13, fls. 39\42):

Fica evidenciado por este Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor que, a Reclamada cometeu prática abusiva prevista no inciso V, do art. 39, do CDC, c/c art. 12, VI, do Decreto 2181/97, ao condicionar a entrega das chaves dos imóveis aos respectivos compradores, ao pagamento de 'diferenças encontradas', entre os valores dos créditos obtidos através dos financiamentos em relação aos valores dos imóveis avençados no compromisso de venda e compra, visto que essas possíveis diferenças tratam-se de valores ínfimos aos valores já garantidos à Reclamada através dos financiamentos aprovados.

Ora, não havia razão para os financiamentos serem de valores inferiores aos valores reais dos imóveis, especialmente porque a correção dos valores de venda estava estabelecida nos próprios instrumentos contratuais e esses valores, corrigidos, deveriam ser apresentados à Caixa Econômica Federal.

Ressalta-se que o direito básico...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT