Acórdão Nº 5005446-66.2021.8.24.0082 do Primeira Câmara de Direito Civil, 11-08-2022

Número do processo5005446-66.2021.8.24.0082
Data11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5005446-66.2021.8.24.0082/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

APELANTE: VALDIR EDSON LACERDA (AUTOR) APELADO: BANCO AGIBANK S.A

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por V. E. L. em face da sentença proferida pelo juízo da 7ª Vara Cível da comarca da Capital que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Compensação por Danos Morais, Repetição de Indébito e Pedido de Tutela de Urgência n. 50054466620218240082, ajuizada por si contra B. A. S.A., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos (Evento 31 - autos de origem):

Ante o exposto, revogo a liminar e JULGO IMPROCEDENTE, com resolução de mérito, nos moldes do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, os pedidos formulados por VALDIR EDSON LACERDA em face de AGIBANK FINANCEIRA S.A- CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMO.

Sucumbente a parte autora, condeno-a ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, em observância ao art. 85, § 2º, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa ao autor pois beneficiário da justiça gratuita, o que faço com espeque no art. 98, § 3°, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Passada em julgado, arquivem-se.

Inconformado, o apelante sustentou a inexistência de provas da contratação do empréstimo consignado, uma vez que a ré anexou apenas uma fotografia, sem assinatura do contrato. Argumenta que um dos requisitos para formação do contrato é a assinatura, não bastando uma simples fotografia para autorizar transações sem o consentimento do autor. Ainda, que os arquivos anexados pela ré sequer possuem informações de valores, tampouco de anuência do consumidor, sendo nulo. Defende a inexistência de esclarecimento quanto a forma de contratação e da expressa declaração de vontade, não sendo crível que a posse de uma fotografia baste para confirmar qualquer contrato ou documento, pois ausente o dever de informação. Alega que a fotografia não possui data, certificação ou geolocalização, não podendo servir para validação infinita de contratos. Por fim, pugna pelo provimento do recurso a fim de ver a sentença reformada, para procedência dos pedidos da inicial (Evento 37 - autos de origem).

Em resposta, o apelado apresentou contrarrazões (Evento 46 - autos de origem), arguindo preliminar de ausência de dialeticidade, ante a contrariedade aos fundamentos da sentença. No mérito, defende a regularidade do contrato, mediante validação por biometria facial, sendo esta a assinatura eletrônica, estando presente no caso os documentos pessoais e a biometria fácil capturada no momento da contratação. Aduz a inexistência do direito de arrependimento, pela celebração válida do contrato, com o recebimento dos valores em conta bancária; a aplicação do princípio da conservação dos negócios jurídicos. Alternativamente, em caso de procedência dos pedidos, alega a impossibilidade de devolução em dobro dos valores, eis que ausente a má-fé; a inexistência do dano moral, pugnando pela manutenção da sentença.

Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade recursal

Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à sua análise.

Preliminar de Ausência de Dialeticidade

Em preliminar, o apelado arguiu a ausência de dialeticidade do recurso de apelação, ante a ausência de contrariedade aos fundamentos da sentença.

O art. 1.010 do Código de Processo Civil prevê que:

Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:

I - os nomes e a qualificação das partes;

II - a exposição do fato e do direito;

III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade;

IV - o pedido de nova decisão.

Todavia, analisando as razões recursais, não há teses divergentes da fundamentação utilizadas na sentença, motivo pelo qual não há falar em ofensa ao princípio da dialeticidade.

Nesse sentido, colhe-se precedente desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL CUMULADA COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PRELIMINAR EM CONTRARRAZÕES. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTOS QUE GUARDAM RELAÇÃO COM A SENTENÇA COMBATIDA. (...) (Apelação n. 5001123-33.2020.8.24.0056, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Machado Junior, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 5-5-2022).

Assim, a prefacial deve ser afastada.

Mérito

O cerne da questão jurídica cinge-se quanto a regularidade da contratação de empréstimo consignado.

O recurso, adianta-se, comporta provimento.

Relação de Consumo

De plano, registre-se, que ao caso se aplica o Código de Defesa do Consumidor porquanto se trata de relação consumerista, estando de um lado o consumidor e de outro o fornecedor de serviços.

A defesa dos direitos básicos do consumidor deve ser resguardada e, em especial, o previsto no art. 6º, incisos VI, VIII e X, do CDC, que assim dispõem: "São direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; e a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral".

Dessarte, o julgamento da presente demanda está adstrito às regras de proteção ao consumidor, em especial, à inversão do ônus da prova, pois ele é parte hipossuficiente e merece especial tratamento.

Validade do Contrato

Extrai-se dos autos que a controvérsia cinge-se na contratação de empréstimo consignado, na qual o autor alega a inexistência de relação jurídica e o réu a regularidade da contratação.

Consoante as informações dos autos, o contrato em questão foi registrado sob o n. 1501335062, no valor de R$ 1.361,23, em parcelas mensais de R$ 27,11, com início de desconto em 8/2021 (Evento 17, Extrato 6 - autos de origem).

A ré anexou o contrato de empréstimo, cópia da CNH e fotografia (selfie) do autor, alegando que a contratação se deu por meio digital e que o documento foi assinado eletronicamente por meio de WhatsApp com biometria facial, em 5/7/2021, conforme dispõe no rodapé do contrato (Evento 17, Contrato 2 - autos de origem).

Sobre tal modalidade de contratação (eletrônica), importante mencionar que o Código Civil não prevê forma específica para sua validade, prevalecendo a liberdade de forma, desde que respeitado a regra geral prevista no art. 104, que assim dispõe: "A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei".

A Instrução Normativa do INSS n. 28, de 16 de maio de 2008 prevê requisitos para a autorização do desconto. Vejamos:

Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte do RGPS e do BPC, de que trata o art. 20 da Lei nº 8.742, de 1993, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de crédito consignado, concedidos por instituições consignatárias acordantes, desde que:

I - o crédito consignado seja realizado com instituição consignatária que tenha celebrado ACT com o INSS e contrato com a Dataprev, para esse fim;

II - mediante contrato firmado e assinado com apresentação do documento de identidade e/ou Carteira Nacional de Habilitação - CNH, e Cadastro de Pessoa Física - CPF, junto com a autorização de consignação assinada, prevista no convênio; e

III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT