Acórdão Nº 5005541-82.2021.8.24.0022 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 27-10-2022

Número do processo5005541-82.2021.8.24.0022
Data27 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5005541-82.2021.8.24.0022/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: MARILZA DO DIVINO APARECIDA (REQUERENTE) ADVOGADO: JIAN LEOCIR LIMA (OAB SC037894) ADVOGADO: THIAGO SCHMIDT FURTADO (OAB SC046448) APELANTE: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (REQUERIDO) ADVOGADO: DENIO MOREIRA DE CARVALHO JUNIOR (OAB SC060859A) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 19), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Marilza do Divino Aparecida qualificada, ajuizou AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC), INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA C/C RESTITUIÇÃO DE INDEBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL contra Banco Ole Bonsucesso Consignado S.A. também qualificado, ao argumento de que percebe benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, NB 604.009624-5 e, nesta condição, realizou contrato de empréstimo consignado junto ao Réu. Entretanto, informa que foi surpreendida com o desconto de Reserva de Margem Consignável de Cartão de Crédito - RMC, dedução muito diferente do mútuo almejado. Afirma que nunca recebeu o cartão de crédito, tão pouco utilizou-se dele para algo, e mesmo assim estão ocorrendo descontos em seu benefício. Esclarece que os serviços em momento algum foram solicitados ou, contratados, já que apenas requereu e autorizou empréstimo consignado e não via cartão de crédito. Aduz que a modalidade de empréstimo via cartão, na prática, é impagável, pois, ao realizar a reserva da margem de 5% e efetuar o desconto do valor mínimo diretamente nos proventos da autora, debita-se mensalmente apenas os juros e encargos de refinanciamento do valor total da dívida. Postula a tutela de urgência. Apresenta sua fundamentação jurídica e demais argumentos a seu favor. Junta documentos. Pede a procedência.

Citado, evento n. 10, o réu deixou fluir in albis o prazo para resposta, consoante evento 12.

Da sentença

O Juiz de Direito, Dr. ELTON VITOR ZUQUELO, da 1ª Vara Cível da Comarca de Curitibanos, julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 19):

Isto posto, ACOLHE-SE a pretensão para DECLARAR a nulidade do contrato de n.° 862309639-6 e a averbação da margem consignável junto ao benefício da autora, n.° 604.009.624-5, declarando vigente contrato de empréstimo consignado pelo valor creditado à postulante, no mês de junho de 2019, com a taxa de juros divulgada pelo BACEN para a espécie contratual no mês da contratação de 23,99%1 a.a., com capitalização anual.

CONDENAR o réu ao pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de compensação pecuniária por dano moral. Valor é atual, reajustável pela SELIC a partir desta data. Estabelece-se a compensação com eventual saldo devedor do contrato, após a sua conversão para empréstimo consignado.

Em verificando-se adimplemento superior ao valor do débito com os juros incidentes, condena-se o réu na restituição simples do valor excedente, incidindo juros de 1,0% ao mês e correção monetária dos valores cobrados indevidamente.

CONDENAR o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor da condenação.

Ao trânsito em julgado, arquivar.

P.R.I.

Da Apelação do Banco

Inconformado com a prestação jurisdicional, o BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. interpôs recurso de Apelação (Evento 35). Preliminarmente, o Banco aventa a nulidade da sentença, em face da nulidade de citação. Argumenta que a carta de citação foi enviada para o endereço do antigo Banco Olé Bonsucesso Consignado S.A., enquanto deveria ter sido direcionada ao Banco Santander (Brasil) S.A., seu incorporador; situação esta que fez ter tolhido seu direito de defesa.

No mérito, alega, em suma, a legalidade do contrato celebrado.

Aduz que o contrato de cartão de crédito consignado com possibilidade de saque é suficientemente claro e preciso ao identificar a modalidade que está se contratando, os mecanismos de pagamento e a cobrança dos débitos correspondentes.

Acrescenta que os documentos anexados aos autos demonstram que o contrato não dá margem a interpretação equivocada, pois existe autorização expressa da Autora para o desconto em folha de pagamento.

Assevera que inexistente a prática de ato ilícito, sendo indevida a condenação por dano moral. Ainda, sustenta que a situação fática descrita não caracteriza abalo moral indenizável, uma vez que o dano alegado sequer foi comprovado.

Argumenta que a restituição dos valores descontados somente é possível quando há cobrança de quantia indevida, o que não é o caso dos autos.

Ao final, requer o provimento do Apelo, para reconhecer a validade da contratação, e a inexistência dos danos morais e materiais. Subsidiariamente, pugna pela minoração da indenização por abalo moral.

Da Apelação do Autor

A Autora manejou recurso de Apelação com intuito de reforma da sentença para declarar a nulidade contratual, pois a sentença determinou a conversão da avença; bem como condenar o Banco à repetição do indébito, em dobro, e a majoração da indenização por danos morais (Evento 31).

Das contrarrazões

As partes foram devidamente intimadas, mas somente o Banco apresentou contrarrazões (Evento 39). Aventa a preliminar de inobservância ao princípio da dialeticidade.

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Com a redistribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

a) Do conhecimento parcial do Recurso do Banco

De início, adianto que a preliminar de nulidade da sentença do Banco não será acolhida. Dessa forma, mantenho a decretação da revelia e seus efeitos.

Conforme relatado, a Autora ajuizou a presente demanda alegando que tinha pretensão de firmar contrato de empréstimo consignado, com desconto direto em seu benefício previdenciário, porém, foi surpreendida com a liberação de um cartão de crédito com reserva de margem consignado (Cartão de Crédito Consignado), com juros claramente mais onerosos.

Assim, a controvérsia "cinge-se à falta de informação da operação bancária ao adquirente do crédito: se este detinha, ou não, conhecimento acerca da modalidade contratada e de suas consequências contratuais" (TJSC, Apelação Cível n.0308281-70.2017.8.24.0020, de Meleiro, rel. Des. MONTEIRO ROCHA, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21/02/2019).

Trata-se de matéria recorrente, sobre a qual este Órgão Julgador decide reiteradamente, em casos análogos, que configurada a prática abusiva na contratação, pois não foram prestados os esclarecimentos necessários ao consumidor no tocante ao tipo de empréstimo, à forma de cobrança e aos encargos incidentes, sendo que a violação ao dever de informação e o fornecimento de modalidade contratual mais onerosa do que a pretendida pelo consumidor gera a nulidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, pois viciada a manifestação de vontade do contratante.

Nesse sentido: Apelação n. 5000085-48.2021.8.24.0218, rel. Des. JAIME MACHADO JUNIOR, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 26-08-2021; Apelação n. 0304325-55.2018.8.24.0038, rel. Des. GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 26-08-2021.

No entanto, na hipótese em análise, verifico que a Instituição Financeira não apresentou contestação, motivo pelo qual foi reconhecida a revelia, o que acarreta a incidência da preclusão das matérias de fato e de direito que comportariam análise na contestação.

Sobre o assunto, elucidou o Exmo. Des. JAIME MACHADO JUNIOR em julgamento de caso análogo:

[...]

Por consequência, encontram-se acobertadas pelo efeito da preclusão as matérias fáticas e de direito que deveriam ter sido apresentadas necessariamente na peça de contestação, oportunidade em que competia à parte ré alegar toda a matéria de defesa a fim de impugnar os pedidos formulados, nos termos do art. 336 do Código Processual.

Assim é que, consoante ensinamentos de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

[...] o réu deve alegar, na contestação, todas as defesas que tiver contra o pedido do autor, ainda que sejam incompatíveis entre si, pois na eventualidade de o juiz não acolher uma delas passa a examinar a outra. Caso o réu não alegue, na contestação, tudo o que poderia, terá havido preclusão consumativa, estando impedido de deduzir qualquer outra matéria de defesa depois da contestação, salvo o disposto no CPC 303. A oportunidade, o evento processual para que ele possa defender-se, é a contestação. (In Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 14 ed., rev., ampl. e atual., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 704).

Ainda, nos ditames do art. 342 do Código de Processo Civil, verifica-se que, após a contestação, a parte ré só pode deduzir novas alegações quando se tratar de direito superveniente, matéria de ordem pública ou outra que, por expressa autorização legal, possa ser formulada em qualquer tempo e juízo.

A propósito, sobre a temática, é entendimento deste egrégio Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL. REVELIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ. ADMISSIBILIDADE. TEMÁTICA RECURSAL - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - ACOBERTADA PELA PRECLUSÃO, EIS QUE TRATA-SE DE ARGUMENTO DE DEFESA E DEVERIA TER SIDO ARGUIDO EM MOMENTO OPORTUNO, OU SEJA, QUANDO DO OFERECIMENTO DA CONTESTAÇÃO. AUSÊNCIA DE RESPOSTA. DECRETAÇÃO DA REVELIA QUE SE MOSTROU ESCORREITA. EXEGESE DOS ARTS. 355 E 344 DO CPC/2015. OUTROSSIM, AUSÊNCIA DE QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA A POSSIBILITAR EVENTUAL APRECIAÇÃO. "Tendo a contestação sido oferecida a destempo, considera-se não praticado o ato de resposta, devendo ser aplicado ao caso os efeitos da revelia dispostos no art. 319 da revogada Lei Adjetiva Civil (CPC/2015, art. 344). A revelia não conduz à automática procedência dos pedidos exordiais, mas sim à preclusão do direito de resposta, não sendo possível ao revel a alegação posterior de temáticas...

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