Acórdão Nº 5005570-58.2021.8.24.0079 do Segunda Câmara Criminal, 06-09-2022

Número do processo5005570-58.2021.8.24.0079
Data06 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5005570-58.2021.8.24.0079/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: PAULO DE CARLI CORDEIRO (RÉU) ADVOGADO: MARCELA EDUARDA BIAVA (OAB SC056184) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Videira, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Paulo de Carli Cordeiro, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos arts. 155, § 4º, II (fato I), 155, caput, ambos do Código Penal (fato IV), e 306 e 309, do Código de Trânsito Brasileiro, estes por duas vezes (fatos II, III, V e VI), nos seguintes termos:

Fatos I, II e III. Artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal. Artigo 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro. Artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro.

No dia 20 de agosto de 2021, por volta das 19h30min., no Bar do Pinóquio, situado na Rua Caçador, bairro Panazzolo, neste município e Comarca de Videira/SC, o denunciado Paulo de Carli Cordeiro, com consciência e vontade, mediante destreza, subtraiu, para si, coisa alheia móvel, consistente em 1 (uma) chave do veículo Ford/Fiesta Sedan 1.6 Flex, cor branca, ano 2012/2013, placas MJV5067, de propriedade da vítima Leorides Lopes da Silva. Ato contínuo, o denunciado Paulo de Carli Cordeiro, igualmente com consciência e vontade, subtraiu, para si, coisa alheia móvel, consistente no próprio veículo anteriormente mencionado, avaliado em aproximadamente R$ 31.199,00 (trinta e um mil cento e noventa e nove reais), da aludida vítima Leorides Lopes da Silva.

Na oportunidade, o denunciado encontrou com a vítima no interior do citado bar, momento em que lhe deu um abraço e, mediante destreza, sem a vítima perceber, subtraiu a chave do aludido automóvel e, na sequência, subtraiu o próprio veículo, que estava estacionado em frente ao estabelecimento. Na sequência, o denunciado conduziu o veículo automotor pela via pública, até a Rodovia Luiz Henrique da Silveira Menegola, neste município e Comarca de Videira/SC, com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência.

Na ocasião, igualmente, o denunciado dirigiu o veículo automotor subtraído em via pública sem a devida habilitação, gerando perigo de dano, tanto que deu causa a acidente de trânsito com danos materiais, tendo capotado o veículo nas margens da Rodovia Luiz Henrique da Silveira Menegola, próximo à empresa Transporte Menegola, neste município de Videira/SC.

Fatos IV, V e VI. Artigo 155, caput, do Código Penal. Artigo 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro. Artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro.

Logo depois dos fatos descritos anteriormente, em frente à Estofaria Contorno Sul, situada na Rodovia Luiz Henrique da Silveira Menegola, neste município e Comarca de Videira/SC, o denunciado Paulo de Carli Cordeiro, com consciência e vontade, subtraiu, para si, coisa alheia móvel, consistente em 1 (um) veículo Ford/Ka Flex, cor vermelha, placas MEG2773, avaliado em aproximadamente R$ 16.439,00 (dezesseis mil quatrocentos e trinta e reais), de propriedade da vítima Matilde Huinka Odorizzi.

Na oportunidade, o denunciado ingressou no veículo automotor que estava com a chave na ignição, deu partida e evadiu-se do local, conduzindo-o pela via pública, até a Rua Caçador, bairro Panazzolo, neste município e Comarca de Videira/SC, com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência. Na ocasião, igualmente, o denunciado dirigiu o veículo automotor subtraído em via pública sem a devida habilitação, gerando perigo de dano, tanto que deu causa a acidente de trânsito com danos materiais, vez que que colidiu na traseira do veículo Audi/A3 1.8, placa HAO9955, de propriedade da vítima Welington Vinícius da Luz Bernardoni, que estava estacionado na via, sentido Bar das Panteras, na Rua Caçador, bairro Panazzolo, neste município de Videira/SC (Evento 1).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito julgou procedente a exordial acusatória e condenou Paulo de Carli Cordeiro à pena de 11 meses e 25 dias de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e 3 anos e 9 meses de reclusão, a ser adimplida em regime inicialmente fechado, e 52 dias-multa, além da suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 3 meses e 22 dias, pelo cometimento dos delitos previstos nos arts. 306 e 309 do Código de Trânsito Brasileiro, ambos por duas vezes, bem como 155, caput, e 155, § 4º, II, estes do Código Penal (Evento 104).

Insatisfeito, Paulo de Carli Cordeiro deflagrou recurso de apelação.

Busca a proclamação da sua absolvição quanto ao delito de furto descrito no fato 1 da exordial acusatória, em razão da fragilidade probatória com relação à autoria e à materialidade ou, de maneira subsidiária, o afastamento da qualificadora de abuso de confiança.

Quanto ao crime de furto narrado no fato 4 da denúncia, igualmente postula a decretação da sua absolvição, diante da suposta ausência de provas aptas a ensejarem a condenação.

Por sua vez, quanto aos fatos atinentes ao delito previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (fatos 2 e 5), pugna pela absolvição em decorrência do reconhecimento da atipicidade da conduta por ausência de prova do perigo concreto ou da alteração da capacidade psicomotora.

Ainda, sustenta a necessidade de absolvição com relação às condutas narradas nos fatos 3 e 6 (CTB, art. 309) porquanto, ainda que não tenha habilitação para a condução de veículo automotor, não restou comprovado que gerou perigo de dano.

Por fim, requer, a aplicação da pena-base no mínimo legal, a fixação do regime aberto ao cumprimento da reprimenda e a substituição da privativa de liberdade por restritivas de direitos, além da fixação de honorários recursais (Evento 115).

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões recursais pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 124).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Genivaldo da Silva, manifestou-se pelo parcial conhecimento e provimento em parte do apelo, tão somente para arbitrar honorários recursais à Excelentíssima Defensora nomeada (Evento 9).

VOTO

1. O pleito para que seja afastada a qualificadora de abuso de confiança quanto ao delito de furto estampado no fato 1 da exordial acusatória não comporta conhecimento, pois é carente de interesse recursal, uma vez que em nenhum momento foi cogitada a aplicação da referida qualificadora.

2. O Excelentíssimo Procurador de Justiça manifestou-se pelo parcial conhecimento do apelo ao argumento de que os pedidos para aplicação da pena-base no mínimo legal, para a fixação do regime inicialmente aberto para o cumprimento da reprimenda e para a substituição da privativa de liberdade por restritivas de direitos não confrontaram os fundamentos lançados na sentença resistida, o que importaria em ofensa ao princípio da dialeticidade.

O argumento não procede. O paradigma constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI) culmina na inafastável conclusão de que o princípio da dialeticidade recursal não se aplica ao acusado no âmbito do processo penal. Tal convicção é reforçada pela possibilidade de se instrumentalizar, a qualquer tempo, revisão criminal (CPP, art. 622) e de garantir-se, enquanto direito fundamental, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença" (CF, art. 5º, LXXV).

Nesse contexto, por exemplo, o apenamento injusto e incorreto, mesmo que a diferença seja de apenas um dia, configura encarceramento arbitrário, a ofender, inclusive, o art. 7º, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário e cujo texto já se encontra incorporado ao ordenamento pátrio, por força do Decreto 678/92.

Bem por isso que a revisão da condenação e do apenamento em sede recursal pode dar-se até mesmo de ofício, quando houver manifesta injustiça ou impropriedade técnica, consoante reiterados precedentes desta Corte de Justiça (vide Apelações Criminais 2014.065697-2, Rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 21.10.14; 2014.016950-3, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 14.10.14; e 2014.024047-0, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 2.9.14).

Assim, o pleito defensivo, ainda que dotado de certa generalidade nos tópicos, visa garantir a plenitude da defesa ao jurisdicionado, e deve ser admitido, como o Superior Tribunal de Justiça reiterada e monocraticamente determina (HC 599378, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 26.4.21; e HC 611896, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.9.20).

3. No mérito, a Defesa postulou a absolvição do Recorrente Paulo de Carli Cordeiro quanto aos delitos de furto descritos nos fatos 1 e 4 da exordial acusatória, diante da fragilidade probatória.

Malgrado o inconformismo do Apelante, o reclamo não comporta provimento no ponto.

Quanto ao fato 1, a Vítima Leorides Lopes da Silva, corroborando com o que foi relatado perante a Autoridade Policial (Evento 42, p. 4 e 5, do Inquérito Policial), declarou em Juízo:

na data dos fatos estava no bar do Pinóquio quando o acusado lhe cumprimentou com um tapa nas costas e conversaram por um tempo. Contou que, posteriormente, percebeu que a chave de seu veículo havia sumido do bolso lateral da jaqueta. Pontuou que havia ingerido apenas uma cerveja, contudo [não] viu se o acusado também fez uso de bebida alcóolica, tampouco se recorda de eventuais sinais de embriaguez. Afirmou não ter deixado a chave em cima de mesa. Discorreu, ainda, que quando chegou ao estabelecimento Paulo já estava saindo e disse que no bar haviam mais pessoas, as quais estava cumprimentando quando visualizou Paulo adentrando ao veículo sozinho e, em seguida, deixando o local com o automóvel. Sustentou que foi possível vê-lo saindo, pois o carro estava em frente ao...

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