Acórdão Nº 5005920-41.2020.8.24.0092 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 08-03-2022

Número do processo5005920-41.2020.8.24.0092
Data08 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5005920-41.2020.8.24.0092/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478) APELADO: IVONETE DA SILVA (AUTOR) ADVOGADO: MARISA DE ALMEIDA RAUBER (OAB SC027068)

RELATÓRIO

BANCO BMG S.A opôs embargos de declaração contra acórdão (evento 8) que negou provimento ao recurso de apelação interposto por sí.

Sustenta o embargante a ocorrência de contradição no dispositivo do acórdão quanto à reforma da decisão.

Não foram apresentadas contrarrazões.

É o necessário relato.

VOTO

Cuida-se de embargos de declaração opostos contra acórdão que, nos autos da ação ordinária, negou provimento ao recurso do embargado.

Erro Material

Aduz o embargante que existe contradição no acórdão guerreado no tocante à condenação no dispositivo.

Sabe-se que, em regra, os embargos de declaração não podem ter como consequência a modificação lato sensu da decisão. Seus objetivos estão elencados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, quais sejam: 1) esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; 2) suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; ou, 3) corrigir erro material.

Em relação à alegação de existência de erro material decorrente do equívoco na parte dispositiva, com razão o embargante.

De fato, houve equívoco no dispositivo, pois o voto foi no sentido de considerar improcedentes os pedidos iniciais.

Dessa forma, passa-se a constar o seguinte teor/voto:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA (RMC). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DA CASA BANCÁRIA DEMANDADA.

ALEGADA A PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AO CASO. INTENTO DE APLICAÇÃO DO LAPSO TRIENAL (ART. 206, § 3º, IV E V, DO CÓDIGO CIVIL). NÃO ACOLHIMENTO. INTERREGNO ATINENTE À PRESCRIÇÃO QUE, EM CASOS DESTE JAEZ, É DE 5 (CINCO) ANOS E COMEÇA A FLUIR DA DATA DO ÚLTIMO DESCONTO INDEVIDO (ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR). PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO MESMO SENTIDO. CONTUDO, LAPSO PRESCRICIONAL QUE, IN CASU, SEQUER TEVE INÍCIO EM RAZÃO DA NATUREZA CONTINUADA DOS DESCONTOS INDEVIDOS REALIZADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR. INEXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO NA HIPÓTESE SUB JUDICE.

MÉRITO. SUSTENTADA A LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO E A EXPRESSA ANUÊNCIA DO RECORRIDO COM OS DESCONTOS ORIUNDOS DA RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. TESE REJEITADA. CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO QUE INDICA PRÁTICA ABUSIVA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA APELANTE, CONSISTENTE NA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO CLARA ACERCA DA MODALIDADE CONTRATUAL CELEBRADA ENTRE AS PARTES. CONSTATAÇÃO, ADEMAIS, DE QUE NÃO HOUVE UTILIZAÇÃO, TAMPOUCO PROVA ACERCA DO ENVIO OU DO RECEBIMENTO DO CARTÃO DE CRÉDITO NO ENDEREÇO DO REQUERENTE. EVIDENTE DESVIRTUAMENTO DA REAL INTENÇÃO DO DEMANDANTE DE CONTRATAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COMUM, O QUAL ORIGINOU NEGÓCIO JURÍDICO LEONINO, FORÇANDO O CONSUMIDOR A CONTRAIR OBRIGAÇÃO EXTREMAMENTE ONEROSA. AFRONTA À LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. PRÁTICA ABUSIVA EVIDENCIADA. IMPERIOSA MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NO PONTO.

SUSCITADA A INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL INDENIZÁVEL. NÃO ACOLHIMENTO. CASO CONCRETO EM QUE SE CONSTATOU A EVIDENTE VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ CONTRATUAL E DO DEVER DE INFORMAÇÃO. ABALO ANÍMICO CONSUBSTANCIADO NO FATO DE QUE OS DESCONTOS REALIZADOS, MÊS A MÊS, NO PARCO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR O COLOCARAM EM EVIDENTE SITUAÇÃO TEMERÁRIA, TENDO EM VISTA A EXPROPRIAÇÃO INDEVIDA E DURADOURA DE VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. IMPOSITIVA MANUTENÇÃO DO DECISUM NO PONTO.

PLEITO SUBSIDIÁRIO DE MINORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO DA VERBA EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). VALOR QUE, DE ACORDO COM AS ESPECIFICIDADES DO CASO CONCRETO, SE MOSTRA RAZOÁVEL PARA REPARAÇÃO DO DANO E CONDIZENTE COM AS CONDIÇÕES ECONÔMICAS DAS PARTES, ALÉM DE SATISFAZER O CARÁTER PEDAGÓGICO E INIBIDOR DA SANÇÃO.

HONORÁRIOS RECURSAIS. APELO DESPROVIDO. APLICABILIDADE DA REGRA CONTIDA NO ART. 85, §11, DO CPC/2015. MAJORAÇÃO DOS ESTIPÊNDIOS PATRONAIS EM GRAU DE RECURSO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO TRIBUNAL DA CIDADANIA - RESP N. 1.573.573/RJ - E ACOMPANHADO POR ESTE ÓRGÃO JULGADOR.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Voto:

Trata-se de recurso de apelação interposto pela casa bancária requerida contra sentença que, no âmbito da presente ação, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na peça exordial.

Realizada a admissibilidade recursal, passa-se à análise das insurgências levadas ao duplo grau de jurisdição.

1 Preliminar

1.1 Prescrição

Sustenta a instituição bancária apelante que a pretensão da parte autora está acobertada pelo manto da prescrição, tendo em vista que, no caso concreto, se aplica o prazo prescricional de 3 (três) anos, previsto no artigo 206, § 3º, IV e V, do Código Civil de 2002.

Não lhe assiste razão.

Cabe salientar que o caso envolve relação de consumo, razão pela qual tem aplicação o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual "prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria".

Assim sendo, o prazo começa a fluir a partir do último desconto indevido, "porquanto em se tratando de relação de trato sucessivo, no qual, a cada desconto indevido, surge uma nova lesão, o prazo prescricional começa a fluir a partir da data do última dedução realizada no benefício previdenciário da autora" (Apelação n. 5000286-05.2020.8.24.0047, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 25-5-2021).

Veja-se, nesse mesmo sentido, excerto de precedente recente desta Corte, em aresto da relatoria do Insigne Desembargador Roberto Lucas Pacheco, onde o Eminente Julgador se valeu, para fundamentar o seu decisório, de julgado do Tribunal da Cidadania:

"1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC.2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27-8-2019 [...])" (Apelação n. 5000399-28.2020.8.24.0218, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 1º-10-2020).

E mais, destacam-se entendimentos desta Câmara, na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECLAMOS INTERPOSTOS POR AMBOS OS LITIGANTES. PRESCRIÇÃO - INTENTO DA PARTE RÉ DE APLICAÇÃO DO LAPSO TRIENAL COM FUNDAMENTO NO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL (PRETENSÃO DE REPARAÇÃO CIVIL) - PREFACIAL AFASTADA - RELAÇÃO OBRIGACIONAL EXISTENTE DE NATUREZA CONTINUADA - TERMO INICIAL CORRESPONDENTE À DATA DO ÚLTIMO DESCONTO REALIZADO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR. "É assente o entendimento desta Corte Superior que em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC e o termo inicial do prazo prescricional, é a partir da data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do pagamento/desconto indevido" (STJ, AREsp 1.539.571/MS, rel. Ministro Raul Araújo, j. em 24/9/2019). (Apelação Cível n. 0300117-36.2019.8.24.0218, de Catanduvas, rel. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 23-6-2020).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.CONTRARRAZÕES. TESE DE PRESCRIÇÃO. PREFACIAL NÃO ANALISADA PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. APRECIAÇÃO EM SEDE RECURSAL. DEMANDA QUE ENVOLVE RELAÇÃO DE CONSUMO E DE TRATO SUCESSIVO. INCIDÊNCIA DO PRAZO QUINQUENAL PREVISTO NO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TERMO A QUO A PARTIR DO ÚLTIMO DESCONTO INDEVIDO. CAUSA EXTINTIVA NÃO CONFIGURADA. PRELIMINAR AFASTADA. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação n. 5004164-94.2020.8.24.0092, rel. Altamiro de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 11-5-2021).

Desta forma, não há falar em prescrição, porquanto a contagem do prazo prescricional de 5 (cinco) anos insculpido no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor sequer teve seu curso iniciado, pois não houve a cessão do dano discutido até o momento.

Portanto, rejeita-se a prefacial de prescrição suscitada pela ora apelante.

2 Mérito

2.1 Legalidade do contrato firmado entre as partes

Alega a casa bancária apelante que a sentença singular deve ser reformada tendo em vista que ficou comprovado que o autor, ora apelado, realizou a contratação da operação de empréstimo consignado na modalidade "cartão de crédito consignado" e, por consectário, autorizou os descontos efetuados no seu benefício previdenciário a título de reserva de margem consignável. Sustenta, ademais, que a modalidade possui previsão legal e não deve ser considerada como modalidade abusiva.

Da análise detida dos autos em epígrafe...

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