Acórdão Nº 5006020-19.2023.8.24.0018 do Quarta Câmara Criminal, 07-06-2023

Número do processo5006020-19.2023.8.24.0018
Data07 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5006020-19.2023.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


RECORRENTE: VOLMIR DA ROSA (RECORRENTE) ADVOGADO(A): LUIZ ANTONIO ANDRIGGE (OAB SC036405) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)


RELATÓRIO


Na comarca de Chapecó/SC, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Volmir da Rosa, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial (Evento 1, DENUNCIA1, autos originários):
No dia 15 de outubro de 2017, por volta das 22h25min, na Rua Olivio Lago nº 147, Bairro Quedas do Palmital, em Chapecó, SC, o denunciado VOLMIR DA ROSA, dolosamente, ciente da reprovabilidade de sua conduta, imbuído de animus necandi, portando uma arma branca, tentou matar a vítima João Maria Romildo Alves Pereira, desferindo-lhe golpes de faca, somente não consumando o intento homicida por circunstâncias alheias a sua vontade.
Segundo consta, nas circunstâncias de tempo e local acima descritos, a vítima se deslocava em direção a seu veículo, estacionado no pátio da residência de sua namorada Emília Silva Quadros, momento em que, mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, foi surpreendido pelo denunciado VOLMIR DA ROSA que, na posse de uma arma branca (não apreendida) e, com manifesta vontade de matar João, desferiu três golpes que atingiram a região do abdômen e clavícula esquerda da vítima, causando-lhe os ferimentos extensos descritos no prontuário médico . Em seguida, mesmo ferido, João conseguiu fugir e abrigar-se na casa de um vizinho, que o conduziu até o Hospital Regional do Oeste, evitando, com isso, que o delito se consumasse.
A tentativa de homicídio perpetrada pelo denunciado VOLMIR DA ROSA foi motivada pelo descontentamento com o relacionamento existente entre a vítima e sua ex-companheira, Emília Silva Quadros, o que demonstra depravação e sentimento de posse na conduta do denunciado.
Finalizada a instrução preliminar, o Magistrado a quo julgou admissível a denúncia, para pronunciar o acusado, submetendo-o, por conseguinte, a julgamento perante o Tribunal do Júri, como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, I e IV, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal (Evento 66, SENT1, autos originários).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs recurso em sentido estrito, mediante o qual postulou a impronúncia, sustentando que teria agido sob o manto da excludente de ilicitude da legítima defesa. De modo alternativo, clamou pelo decote das qualificadoras do motivo torpe e do recurso que dificultou a defesa da vítima, ao fundamento de que estariam dissociadas do conjunto probatório. Ao final, solicitou a fixação de honorários ao defensor nomeado, pela atuação neste grau de jurisdição (Evento 74, RSE1, autos originários).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 80, CONTRAZ1, autos originários), e mantida a decisão recorrida (Evento 82, DESPADEC1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio da Exma. Dra. Vera Lúcia Coró Bedinoto, manifestou-se pelo parcial conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 9, PARECER1)

VOTO


O recurso, adianta-se, merece ser parcialmente conhecido.
1 Impronúncia
A defesa clama pela impronúncia do acusado, sustentando que este teria agido acobertado pela excludente de ilicitude da legítima defesa.
Sem razão.
De partida, convém registrar que, como é cediço, em se tratando do procedimento criminal de competência do Tribunal do Júri, para a pronúncia do acusado é suficiente que se constate prova da materialidade do delito e indícios suficientes de autoria (art. 413 do Código de Processo Penal).
Isso porque se trata de uma decisão interlocutória, de caráter processual que, encerrando a fase de formação da culpa, tem por objetivo simplesmente julgar a admissibilidade da imputação para fins de submissão do acusado a julgamento popular.
Para tanto, nessa etapa do procedimento escalonado, quanto à prova produzida, procede-se a uma operação cognitiva não exauriente, já que não se pode exigir a formação de um juízo de certeza, mas apenas de probabilidade fundada.
Como consequência de seu caráter meramente declaratório, logicamente, não se pode exigir prova plena acerca da autoria delitiva, até porque, havendo dúvida razoável a respeito, uma vez presente prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, deverá ela ser solucionada pelo juízo natural dos crimes contra a vida.
Acerca do tema, Fernando da Costa Tourinho Filho explica:
Dês que haja prova da materialidade do fato e indícios suficientes de que o réu foi o seu autor, deve o Juiz pronunciá-lo. A pronúncia é decisão de natureza processual (mesmo porque não faz coisa julgada), em que o Juiz, convencido da existência do crime, bem como de que o réu foi seu autor (e procura demonstrá-lo em sua decisão), reconhece a competência do Tribunal do Júri para proferir o julgamento (Código de processo penal comentado. v. 2. 15. ed. Saraiva: São Paulo, 2014. p. 80).
Na mesma linha de raciocínio, assinala Renato Brasileiro de Lima:
Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusaionis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência (Manual de Processo Penal. 4. ed, Salvador: JusPodivm, 201. p. 1336).
A decisão de impronúncia, por sua vez, somente subsiste no caso de o magistrado não se convencer "da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação" (art. 414 do Código de Processo Penal).
Justamente pelo seu caráter terminativo, que implica no afastamento de competência constitucional, a impronúncia é medida excepcional, que deve ser reservada às hipóteses em que nem sequer é possível reconhecer a probabilidade de sucesso da pretensão acusatória.
A absolvição sumária, a seu turno, como decisão de mérito que põe cobro ao processo, somente é admitida quando restar demonstrada, de forma nítida e concludente, algumas das hipóteses previstas no art. 415 do CPP, a saber: a) a inexistência do fato; b) não ser o acusado autor ou partícipe do fato; c) o fato não constituir infração penal; d) causa de isenção de pena ou de exclusão de crime, ressalvada, neste caso, inimputabilidade, quando não for a única tese da defesa.
Nesses termos, esclarece-se que, a despeito de o recorrente ter solicitado a impronúncia com base na legítima defesa, a matéria, na verdade, configura hipótese de absolvição sumária.
No caso, a materialidade e os indícios de autoria criminosa estão presentes. Em suas razões, a própria defesa descreveu que: "A materialidade delitiva referente ao delito encontra-se perfeitamente demonstrada por meio dos boletins de ocorrência (fls. 7-8 e 10-11, Evento 1, INQ1), resumo de ocorrência policial (fls. 13-14, Evento 1, INQ1), prontuário médico do paciente João Maria Alves Pereira (fls. 26-51, Evento 1, INQ1 e 1-30, Evento 1, INQ2), exame em local de ação violenta n. 9118.18.01062, fls. 2-5, Evento 1, INQ3), e pela prova oral produzida em ambas as fases processuais. Da mesma forma, os indícios da autoria criminosa em relação ao denunciado encontram amparo em todo o conjunto probatório coligido, notadamente na prova oral produzida em ambas as fases processuais" (Evento 74, RSE1, autos originários).
Cumpre prescrutar, portanto, se o conjunto probatório é capaz de agasalhar, peremptoriamente, a tese voltada ao reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa.
Narrou-se na denúncia que, no dia 15 de outubro de 2017, por volta das 22h25min, na rua Olivio Lago, n. 147, bairro Quedas do...

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