Acórdão Nº 5006321-06.2021.8.24.0092 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 22-09-2022

Número do processo5006321-06.2021.8.24.0092
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5006321-06.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: CLEAMAR DE LIMA MARCIANO MARTINS (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 24), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

CLEAMAR DE LIMA MARCIANO MARTINS propôs ação contra BANCO BMG S.A, na qual sustentou, em suma, que percebeu a averbação de dois contratos de cartão de crédito com reserva de margem consignável em seus benefícios previdenciários n. 162.938.248-2 e n. 133.386.955-7, firmados com a parte ré, que jamais desejou ter contratado.

Requereu, em sede de tutela provisória de urgência antecipada, a suspensão dos descontos realizados a título de RMC. Ao final, postulou: i) a declaração de inexistência das contratações de empréstimo via cartão de crédito RMC; ii) a condenação da restituição em dobro dos descontos realizados; iii) a readequação do empréstimo de cartão de crédito consignado para empréstimo consignado, sendo os valores já pagos a título de reserva de margem consignável utilizado para amortizar o saldo devedor; iv) a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais.

Em decisão interlocutória, concedeu-se a tutela provisória de urgência, para determinar a suspensão dos descontos realizados no benefício previdenciário da parte autora. Na oportunidade, ainda, deferiu-se o benefício da justiça gratuita e inverteu-se o ônus da prova.

Citada, a parte ré apresentou resposta na forma de contestação, na qual arguiu, preliminarmente, a ausência de interesse processual e a inépcia da petição inicial. No mérito, sustentou, em suma: i) a regularidade da contratação do cartão de crédito, e a ausência de vício de consentimento da parte autora; ii) a impossibilidade de inverter o ônus da prova; iii) a ausência de danos morais; iv) o descabimento da repetição de indébito. Também postulou a expedição de mandado de intimação da parte autora, para informar se possui conhecimento do ajuizamento da presente ação.

Houve réplica.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. SABRINA MENEGATTI PITSICA, da Unidade Estadual de Direito Bancário, julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 24):

Ante o exposto, com resolução de mérito, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para:

I - Declarar a nulidade da modalidade contratual apresentada (contrato de cartão de crédito consignado) e, por consequência, determinar que as partes voltem ao status quo ante, devendo, os valores depositados na conta bancária da parte autora, atualizados monetariamente pelo INPC, ser compensados com a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente pela parte ré a título de RMC, atualizados monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso.

II - Condenar a parte ré a efetuar o pagamento em favor da parte autora, a título de danos morais, da quantia de R$ 5.000,00, acrescida de correção monetária pelo INPC a partir desta sentença e de juros de mora de 1% ao mês, a contar da data da inclusão dos descontos nos benefícios previdenciários da parte autora.

III - Confirmar a tutela de urgência deferida.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios de sucumbência, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Da Apelação da Instituição Financeira

Inconformado com a prestação jurisdicional, o BANCO BMG S.A interpôs recurso de Apelação (Evento 30).

Alega, em suma, a legalidade do contrato celebrado. Aduz que o contrato de cartão de crédito consignado com possibilidade de saque é suficientemente claro e preciso ao identificar a modalidade que está se contratando, os mecanismos de pagamento e a cobrança dos débitos correspondentes.

Acrescenta que os documentos anexados aos autos demonstram que o contrato não dá margem a interpretação equivocada, pois existe autorização expressa da Autora, para o desconto em folha de pagamento.

Assevera que inexistente a prática de ato ilícito, sendo indevida a condenação por dano moral. Ainda, sustenta que a situação fática descrita não caracteriza abalo moral indenizável, uma vez que o dano alegado sequer foi comprovado.

Argumenta que a restituição dos valores descontados somente é possível quando há cobrança de quantia indevida, o que não é o caso dos autos.

Busca a aplicação do entendimento firmado pelas Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis acerca da validade do contrato de cartão de crédito. Neste tópico, destaca que o entendimento já está pacificado nas Turmas de Uniformização, sendo já exarado pelo Superior Tribunal de Justiça, que reconhece a validade do pacto, bem como é adotado em primeira instância no TJSC.

Ao final, requer o provimento do Apelo, para reconhecer a validade da contratação, e a inexistência dos danos morais e materiais. Subsidiariamente, pugna pela minoração da indenização por abalo moral.

Do Recurso Adesivo da Autora

Também inconformada, a Autora CLEAMAR DE LIMA MARCIANO MARTINS, interpôs recurso Adesivo de Apelação (Evento 37), aduzindo, em síntese, que ao ser ludibriada com a forma de contração proposta pelo Banco, faz jus a majoração do quantum da indenização do dano moral.

Das contrarrazões

Devidamente intimadas, as partes apresentaram contrarrazões (Eventos 39 e 42). O BANCO BMG S.A aventa a necessidade de intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, requerer a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Com a distribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merecem ser conhecidos.

II - Das contrarrazões

O BANCO BMG S.A requer a intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, pleiteou a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Sem razão.

No que se refere ao pleito de intimação da parte Autora para que esta informe o seu conhecimento acerca da propositura da lide, infere-se que tal medida não se revela plausível, notadamente pelo conteúdo genérico da narrativa, que não encontra abrigo em qualquer início de prova.

Conforme já decidiu este Tribunal, eventual desvirtuamento do interesse da parte Autora na propositura da demanda não pode ser reconhecido a partir de meras conjecturas, não cabendo ao juízo, sobretudo em segundo grau de jurisdição, investigar o ânimo da parte (Nesse sentido: Apelação n. 5030238-56.2020.8.24.0038, rel. Mariano do Nascimento, j. 04-02-2021 e Apelação n. 5007736-58.2020.8.24.0092, rel. Guilherme Nunes Born, j. 08-07-2021).

Salienta-se que o instrumento de procuração subscrito pela parte, cuja autenticidade não foi derruída, tem o condão de evidenciar a prévia ciência sobre o pleito vertido em juízo, bem como seu interesse na tutela jurisdicional vindicada.

Igualmente, não merece amparo o pleito de condenação do procurador da parte demandante nas penas de litigância de má-fé, especialmente em virtude de que a aplicação das indigitadas penalidades é dirigida às partes da relação processual instaurada, e não aos seus causídicos.

A propósito, entende-se que "o fato do procurador da parte autora ter ajuizado, supostamente, centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir, não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz" (TJSC, Apelação n. 0301613-52.2019.8.24.0040, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 30-07-2020).

Em arremate, caso a instituição financeira entenda haver indícios de infrações disciplinares e condutas típicas, poderá buscar diretamente as Autoridades administrativas ou o respectivo órgão de classe competente, se assim julgar necessário (Apelação n. 5001121-83.2021.8.24.0038, rel. Tulio Pinheiro, j. 01-07-2021).

III - Do julgamento conjunto dos recursos

Trata-se de Apelação Cível interposta por BANCO BMG S.A e recurso Adesivo interposto pela Autora CLEAMAR DE LIMA MARCIANO MARTINS, ambos contra a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada".

a) Da preliminar - do julgamento paradigma - Turma de Uniformização.

Requer o Banco que este Tribunal de Justiça utilize o entendimento adotado pela Turma de Uniformização dos Juizados Especiais, que reconheceu a legalidade do contrato de cartão de crédito consignado, hipótese vertida nestes autos.

Contudo, razão não lhe assiste. Isto porque, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial, em julgamento realizado em 12/06/2019, não admitiu o...

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