Acórdão Nº 5006363-40.2021.8.24.0000 do Quarta Câmara Criminal, 18-03-2021

Número do processo5006363-40.2021.8.24.0000
Data18 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Habeas Corpus Criminal Nº 5006363-40.2021.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: FERNAO SERGIO DE OLIVEIRA (Impetrante do H.C) E OUTROS ADVOGADO: RENATO ALMEIDA COUTO DE CASTRO JUNIOR (OAB SC017801) ADVOGADO: FERNAO SERGIO DE OLIVEIRA (OAB SC028973) IMPETRADO: Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Joinville MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA INTERESSADO: ALEXANDRE GAYOSO NEVES MAIA DE OLIVEIRA ADVOGADO: JULIANO MARCELINO FREITAS ADVOGADO: ANA PAULA MARCELINO FREITAS INTERESSADO: ALINE SANTIAGO INTERESSADO: ANDREA MENEZES LEITE ADVOGADO: James José da Silva INTERESSADO: EDUARDO LEITE KROPIWIEC ADVOGADO: LEANDRO GORNICKI NUNES INTERESSADO: FAUSTINO JOSÉ REBELLATO ADVOGADO: MAURICIO ALESSANDRO VOOS INTERESSADO: JOSE NESTOR SOLIZ ENCINAS ADVOGADO: DANUBIA MEDEIROS BACHTOLD ADVOGADO: GUILHERME LUCIANO VIEIRA ADVOGADO: PEDRO ROBERTO DONEL INTERESSADO: MELISSA YOSHINAGA ZANONI ADVOGADO: DAIANE SOUSA SILVA ADVOGADO: LUIZ FELIPE BITENCOURTT WINTER INTERESSADO: RENATO BASTOS POPE ADVOGADO: FABIAN RADLOFF INTERESSADO: RUI CELSO VIEIRA ADVOGADO: ALBANO FRANCISCO SCHMIDT ADVOGADO: NICHOLAS ALESSANDRO ALVES MEDEIROS INTERESSADO: LUIS CARLOS FERREIRA ADVOGADO: LEANDRO GORNICKI NUNES


RELATÓRIO


Cuida-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de Fernando Sanfelice André, ao argumento de estar sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da comarca de Joinville.
Narraram os impetrantes que, nos autos de medida cautelar inominada, em que é investigada a existência de fraude no controle de ponto eletrônico do Hospital Regional Hans Dieter Schmidt, foram impostas ao paciente medidas cautelares de afastamento da função pública, sem direito à remuneração, pelo prazo de 90 (noventa) dias, proibição de acesso e frequência ao nosocômio, proibição de contato com os servidores por qualquer meio, e pagamento de fiança no montante de R$ 31.170,00 (trinta e um mil e cento e setenta reais).
Sustentaram, todavia, que o paciente não praticou os delitos, bem como cumpre jornada de trabalho e metas de atendimento e cirurgia superiores às exigidas. Acrescentaram que a sua atuação profissional é imprescindível, porquanto é o único médico especialista no setor de cirurgias pós-bariátricas, motivo pelo qual seu afastamento afronta o princípio da eficiência e deixa os pacientes desamparados.
Aduziram que a decisão combatida carece de fundamentação e deixou de individualizar as condutas perpetradas, tal como exige o art. 282, II, do Código de Processo Penal. Asseveraram que as medidas carecem de proporcionalidade e não são mais necessárias, haja vista que as investigações já foram encerradas e redundam, com o prejuízo da remuneração mensal, em pena que se estende aos familiares.
Arremataram ser descabida a privação dos rendimentos do paciente, que exerce função pública, sob pena de violação aos princípios da dignidade da pessoa humana, devido processo legal, presunção de inocência e irredutibilidade dos vencimentos.
Com esses argumentos, postularam a concessão liminar do pedido, a fim de que seja restabelecida a remuneração mensal do paciente, sem prejuízo do pagamento do montante devido desde o início de seu afastamento. Ao final, requereram a confirmação da ordem e a revogação das medidas cautelares aplicadas (Evento 1, INIC1).
O pedido liminar foi parcialmente deferido para determinar a retomada da percepção dos vencimentos pelo paciente, excetuadas as parcelas estritamente ligadas ao exercício da atividade (Evento 5, DESPADEC1).
Depois de prestadas as informações (Evento 8, INF1), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Dr. , manifestou-se pelo conhecimento e pela denegação do writ (Evento , PROMOÇÃO1)

VOTO


É devida a concessão parcial da ordem postulada.
Acerca das medidas cautelares, o Código de Processo Penal, em seu art. 282, § 2º, preconiza que: "As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público".
Nada obstante, para que sejam aplicadas/mantidas, mister a exposição de fundamentação concreta acerca da sua necessidade, a teor do art. 282, I, do Código de Processo Penal, devendo ser observada, ainda, "a adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado" (inciso II).
Sobre os requisitos para sua imposição, expõe Guilherme de Souza Nucci:
Há dois requisitos genéricos: a) necessariedade; b) adequabilidade. Estes são cumulativos, ou seja, ambos precisam estar presentes para autorizar a imposição de medidas cautelares (art. 319, CPP). O primeiro requisito genérico divide-se em três: a.1) para aplicação da lei penal; a.2) para a investigação ou instrução criminal; a.3) para evitar a prática de infrações penais, nos casos previstos em lei. Esses três são alternativos, ou seja, basta a presença de um deles para configurar a necessariedade. [...] O segundo requisito genérico divide-se em três: b.1) gravidade do crime; b.2) circunstâncias do fato; b.3) condições pessoais do indiciado ou acusado (Manual de Processo Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 372).
Dessa forma, sabe-se que "as medidas cautelares alternativas à prisão não podem ser impostas pelo juiz sem necessidade e adequação. Não são medidas automáticas, bastando que haja investigação ou processo. Elas restringem a liberdade individual, motivo pelo qual precisam ser fundamentadas" (NUCCI, Guilherme de Souza. op. cit.).
Dentre as características das medidas cautelares, destaca-se a provisoriedade, inserta no art. 282, I, do CPP, segundo a qual "devem elas vigorar apenas enquanto perdurar a situação de urgência que justificou sua decretação" (AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 869).
O referido autor acrescenta que a revogabilidade é outra característica intrínseca às cautelares e está "[...] coligada à provisoriedade, corporificando-se no art. 282, § 5º, parte, do CPP, ao dispor que o juiz poderá revogar a medida cautelar quando verificar a falta de motivo para que subsista" (op. cit).
Assim, possível concluir que, em se tratando de medidas cautelares de natureza pessoal, sua decretação condiciona-se à análise dos princípios da necessidade e adequação, consagrados no art. 282, I e II, do CPP, e dos requisitos das cautelares em geral, consubstanciados no periculum in mora e no fumus boni iuris.
Ainda, "a Lei n. 12.403/2011, ao alterar significativamente os arts. 319 e 320 do Código de Processo Penal, estabeleceu a possibilidade de imposição de medidas alternativas à prisão processual, no intuito de permitir ao Magistrado, diante das peculiaridades de cada caso concreto, e dentro dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, estabelecer a medida mais adequada" (STJ, AgRg no RHC 132.255/SP, rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, j. em 15/12/2020, DJe de 18/12/2020).
1 Verifica-se dos autos de origem que o paciente vem sendo investigado pela suposta prática dos delitos de prevaricação (art. 319 do CPP), abandono de função pública (art. 323, § 1º do CP), falsidade ideológica (art. 399 do CP) e estelionato (art. 171, § 3º do CP), uma vez que, na condição de médico concursado do Hospital Regional Hans Dieter Schimidt, teria, em tese, praticado burla ao controle de frequência e à carga horária mensal de trabalho.
Nesse prisma, a decretação das medidas cautelares, precedida de requerimento da autoridade policial (Evento 1, PET1, fls. 1-6, autos n. 5049521-65.2020.8.24.0038) e de manifestação favorável do órgão do Ministério Público (Evento 4, PROMOÇÃO1, fls. 1-3, autos n. 5049521-65.2020.8.24.0038), teve como pressupostos a comprovação da materialidade dos delitos, a presença de indícios de autoria, bem como a visualização de risco à futura instrução processual e perpetuação de práticas ilícitas, além da gravidade concreta das condutas.
Pinça-se da decisão combatida (Evento 6, DESPADEC1, autos n. 5049521-65.2020.8.24.0038):
Segundo é de conhecimento do juízo, a polícia civil local instaurou inquérito policial para apuração da "notícia de que médicos atuantes no Hospital Regional Hans Dieter Schmidt - HRHDS, situado na R. Xavier Arp, s/n, Boa Vista, Joinville, estariam burlando o controle de frequência e a carga horária a que estão submetidos, não cumprindo, portanto, com a carga horária mensal de trabalho contratada, podendo, em tese, tais condutas amoldarem-se aos crimes de prevaricação (art. 319 do CPP), abandono de função pública (art. 323, § 1º do CP), falsidade ideológica (art. 399 do CP) e estelionato (art. 171, § 3º do CP)" (f. 01 do evento 1.4 dos autos nº 5035697-39.2020.8.24.0038).
Veio daí que a Divisão de Investigação Criminal - DIC desta comarca de Joinville/SC, subsidiada em relatórios policiais, requereu e teve deferido o acesso aos dados telemáticos de mais de uma dezena de médicos, a fim de facilitar "o monitoramento, em tempo real, da localização aproximada dos médicos no dia em que, em tese, deveriam estar laborando no Hospital Regional" (f. 04 do evento 1.1 dos autos nº 5035697-39.2020.8.24.0038).
Com isso, mediante apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas - GAECO, elaboraram-se doze relatórios de investigação, que tinha como alvo os aqui representados, e fez constar que, após campana e monitoramento por intermédio de ERB, os médicos não trabalharam a totalidade do horário registrado em ponto eletrônico.
[...]
Ao investigado Fernando Sanfelice André, que no dia 15.10.2020 "às 8h41min, utilizando o veículo PEUGEOT/208 ACTIVE PACK, conforme vigilância acima retratada, deixou o estacionamento interno do Hospital Regional de Joinville e seguiu até a clínica médica do também...

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