Acórdão Nº 5006366-92.2021.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Público, 30-09-2021

Número do processo5006366-92.2021.8.24.0000
Data30 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5006366-92.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO

AGRAVANTE: VALTAIR ALVES AGRAVADO: MUNICÍPIO DE TROMBUDO CENTRAL/SC

RELATÓRIO

Na comarca de Trombudo Central, a municipalidade ajuizou a Execução Fiscal n. 0302059-89.2015.8.24.0074 em face de Valtair Alves, mediante apresentação das Certidões de Dívida Ativa (CDAs) ns. 615 a 617/2015, todas emitidas em 17-8-2015, referentes ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) dos exercícios de 2012 e 2013, visando à satisfação de crédito no valor total de R$ 1.543,95 (um mil, quinhentos e quarenta e três reais e noventa e cinco centavos).

Determinada a citação (Evento 3 dos autos originários), por duas vezes a tentativa por via postal resultou infrutífera (Eventos 6 e 18 dos autos originários).

O exequente requereu a citação editalícia do executado (Evento 23 dos autos originários), o que foi deferido (Evento 26 dos autos originários).

Citado (Evento 32 dos autos originários), o devedor deixou o prazo escoar in albis (Evento 33 dos autos originários).

A curadora especial nomeada (Evento 36 dos autos originários) opôs embargos à execução fiscal (autos n. 5000437-84.2020.8.24.0074), estes que foram rejeitados (Evento 49 dos autos originários).

Consoante pleito do credor (Evento 53 dos autos originários), foi determinado o bloqueio de valores via Sisbajud (Evento 55 dos autos originários), com cumprimento integral da ordem (Evento 58 dos autos originários).

Embora frustradas as tentativas de intimação do executado (Eventos 63-65 dos autos originários) este compareceu espontaneamente aos autos para requerer o reconhecimento da impenhorabilidade da quantia de R$ 3.331,13 (três mil, trezentos e trinta e um reais e treze centavos), depositada em conta corrente (Evento 66 dos autos originários), o que foi, contudo, indeferido pela magistrada a quo (Evento 77 dos autos originários), decisão que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.

O recorrente verbera que os valores constritados são absolutamente impenhoráveis, seja por serem decorrentes de seu trabalho como pequeno produtor rural e, esporadicamente, em serviços de jardinagem, seja pelo fato de que a importância é inferior a 40 (quarenta) salários mínimos, sendo indispensáveis para sua sobrevivência e da família. Aduz, ademais, que de acordo com entendimento dos Tribunais pátrios não há necessidade de comprovação da origem da verba bloqueada, "de modo a admitir a impenhorabilidade de valores inferiores a 40 salários-mínimos, independente da sua origem, mantidos em qualquer conta, salvo se comprovada a ocorrência de fraude, abuso ou má-fé por parte do devedor, presumindo-se como reserva indispensável à manutenção do mínimo existencial do mesmo e de sua família". Pugna pelo deferimento do benefício da Justiça gratuita, requerido na origem, mas não analisado pela decisão atacada; pela concessão do efeito suspensivo e, ao final, pelo reconhecimento da impenhorabilidade do montante bloqueado, com consequente liberação deste em favor do agravante.

Deferi a gratuidade da Justiça para fins de processamento do reclamo, mas, ausentes os requisitos legais, indeferi a almejada carga suspensiva (Evento 3).

A parte agravada não ofereceu contrarrazões.

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pela ausência de interesse de intervir na causa (Evento 18).

É o relatório.

VOTO

O agravo está fundado a partir da natureza do interlocutório combatido (art. 1.015, parágrafo único, do CPC), as hipóteses legais (art. 1.016 e ss. do CPC) foram contempladas, o recorrente teve deferido o pedido de Justiça gratuita (Evento 3) e o recurso é tempestivo, razão pela qual merece ser conhecido.

O agravante busca a reforma da decisão a quo sustentando que os valores indisponibilizados são absolutamente impenhoráveis por decorrerem do seu trabalho e se destinarem à sua subsistência e da família, perfazendo montante inferior a 40 (quarenta) salários mínimos, em relação ao qual os Tribunais têm presumido tratar-se de reserva indispensável à manutenção do mínimo existencial.

Sem razão!

Consoante adiantei na decisão inaugural (Evento 3), o art. 833, IV e X, do Código de Processo Civil, dispõe que são impenhoráveis "os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º", bem como "a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos".

Ao comentar o rol de impenhorabilidade do art. 833 do CPC, a doutrina esclarece que seu fundamento é constitucional, visando resguardar a dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade:

O dispositivo em análise confere concreção à regra prevista no artigo precedente [art. 832] e possui iluminação de princípios constitucionais insertos na nossa Carta Política de 1988: (a) dignidade da pessoa humana (art. 1.º, III), e (b) da função social da propriedade (art. 5.º, XXIII). A submissão se impõe para não sujeitar à penhora bens e de direitos considerados indispensáveis à existência digna do executado (por exemplo, a hipótese do inciso IV do dispositivo) e que estejam desempenhando, imune de dúvidas e concretamente, uma função social (tal como a situação inserta no inciso IX da regra legal). Note-se que, de forma reflexa, o rol dos bens que a lei entende como impenhoráveis acaba por ser um cardápio de exceções à responsabilidade patrimonial do devedor, na medida em que exclui bens do âmbito da responsabilidade pelo inadimplemento das obrigações [CC/2002 (art. 391) e CPC (art. 789 do NCPC, em substituição ao art. 591 do CPC/1973)]. (MAZZEI, Rodrigo; MERÇON-VARGAS, Sarah. Da penhora, do depósito e da avaliação. In: CABRAL, Antonio Passo, CRAMER, Ronaldo (orgs.). Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1.191; grifei)

Nesse sentido, ao encontro da argumentação do agravante, a jurisprudência do...

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