Acórdão Nº 5006506-95.2021.8.24.0075 do Primeira Câmara Criminal, 17-05-2022

Número do processo5006506-95.2021.8.24.0075
Data17 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5006506-95.2021.8.24.0075/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: FERNANDO GUIMARAES PAES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

No Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Tubarão, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em desfavor de Fernando Guimarães Paes, pela prática, em tese, do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, da Lei n. 11.343/06, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (Evento 1 dos autos originários):

Consta no caderno indiciário acima referido que, no dia 19 de maio de 2021, por volta das 15h50min, na Rua Manoel Estevão Fernandes, n. 789, Bairro Congonhas, Tubarão-SC, o denunciado FERNANDO GUIMARÃES PAES mantinha em depósito/guarda, no porão, 2 tabletes da substância "maconha", pesando aproximadamente 675 gramas (Laudo Preliminar de p. 17 do Evento 41), bem como preparava, fracionando e embalando em cima de uma mesa, porções de "maconha", mais precisamente 9 porções pesando aproximadamente 225 gramas (Laudo Preliminar de p. 18 do Evento 41), droga essa destinada à comercialização, inclusive com oferta em grupos de WhatsApp, tudo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, ainda portando o denunciado, no local, um prato onde manuseava o entorpecente e uma balança de precisão para a pesagem das porções (Auto de Apreensão de p. 17 do Evento 41).

Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio sentença que acatou a pretensão deduzida na denúncia, para condenar o acusado pelo cometimento do tráfico de drogas descrito na peça vestibular. A deliberação contou com o seguinte dispositivo (Evento 88 dos autos originários):

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia de evento 1, para CONDENAR o acusado FERNANDO GUIMARAES PAES ao cumprimento de pena privativa de liberdade fixada em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 666 (seiscentos e sessenta e seis dias) dias-multa, cada qual no valor mínimo estipulado pelo art. 43 da Lei 11.343/06 com correção monetária a partir da data da infração (a respeito, vide: Resp. 98135-SP), por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.

Inconformado, o acusado interpôs a presente insurgência, almejando, em suma: a) o reconhecimento da ilicitude da entrada dos policiais na sua residência com a nulidade dos elementos colhidos e decorrentes da invasão domiciliar; b) o desentranhamento dos prints anexados aos autos do inquérito policial em virtude da quebra da cadeia de custódia; c) a desclassificação da conduta, reconhecendo-se que a droga destinava-se exclusivamente para uso próprio; d) fixação do regime inicial semiaberto; e e) concessão dos benefícios da justiça gratuita (Evento 10 destes autos).

Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença vergastada (Evento 14 destes autos).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador Marcílio de Novaes Costa, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 17 destes autos).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2201349v5 e do código CRC 5f87bd53.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIROData e Hora: 17/5/2022, às 15:18:35





Apelação Criminal Nº 5006506-95.2021.8.24.0075/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: FERNANDO GUIMARAES PAES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Fernando Guimarães Paes em face da sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Tubarão que, ao julgar procedente o pedido formulado na denúncia, condenou-o à pena privativa de liberdade de 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa, no valor mínimo legal, em razão da prática do crime disciplinado no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06.



1. Dos fatos

Consta da peça vestibular, em suma, que no dia 19-05-2021, por volta das 15h50min, o apelante, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, matinha em depósito e sob sua guarda, 2 (dois) tabletes do entorpecente vulgarmente conhecido como maconha, com massa bruta de 675g (seiscentos e setenta e cinco gramas).

Segunda a pretensão acusatória, na mesma oportunidade, o acusado preparava, fracionando e embalando, mais 9 (nove) porções do mesmo estupefaciente, pesando ao total aproximadamente 225g (duzentos e vinte e cinco gramas), e contava com uma balança de precisão para pesagem. De acordo com o Parquet, a droga destinava-se à comercialização ilícita, anunciada, inclusive, em grupos do aplicativo WhatsApp,

Por tais razões, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Fernando Guimarães Paes como incurso no delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06.

Devidamente instruído o feito, sobreveio sentença que acatou o pedido formulado na exordial acusatória para condenar o réu pelo cometimento do crime de tráfico de drogas.

Irresignado, o réu manejou o presente recurso de apelação.



2. Da admissibilidade recursal.

O recurso interposto preenche parcialmente os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido apenas em parte.

Isso porque, a concessão dos benefícios da justiça gratuita em favor do acusado é matéria cuja análise incumbe ao Juízo de primeiro grau.

Nesse influxo: "[...] acerca do pedido de concessão de justiça gratuita, cito que não comporta conhecimento o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita e, consequentemente, de isenção de despesas processuais, por se tratar de matéria cujo exame incumbe ao Juízo do primeiro grau, o qual, após a apuração do valor das custas finais, poderá averiguar a situação de hipossuficiência do apenado. Por tal razão, não conheço do apelo nessa parte". (TJSC, Apelação Criminal n. 0000259-04.2019.8.24.0125, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. 05-11-2020).

Ademais, a pretensão não foi formulada na origem e, portanto, não restou apreciada pelo Juízo a quo. Logo, o conhecimento do pleito implicaria supressão de instância.

Ainda que assim não fosse, não há nos autos qualquer elemento que demonstre a hipossuficiência econômica do recorrente. Inobstante, salienta-se que tal questão pode ser requerida e apreciada, se for o caso, pelo juízo da Execução Penal em momento oportuno.

Por essas razões, deixo de conhecer o recurso no ponto.



3. Preliminares

3.1 Da nulidade das provas obtidas mediante violação de domicílio

Prefacialmente, pretende a defesa o reconhecimento da ilicitude da invasão domiciliar, anulando-se, por consequência, as provas obtidas e derivadas. Para tanto, sustenta, sinteticamente, que os agentes estatais não dispunham de autorização judicial, e tampouco estavam presentes hipóteses excepcionais ou fundadas razões legitimadoras da entrada dos policiais no imóvel.

O pedido, adianto, não comporta provimento.

De pronto, convém apontar que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, com repercussão geral reconhecida, assentou que, in verbis:

"[...] a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados". (Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010).

Em resumo, a Corte Suprema delimitou a legitimidade de ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial, seja durante o dia ou no período noturno, quando amparado por fundadas razões, devidamente justificadas pelas situações do caso concreto, que apontem estar ocorrendo no interior do imóvel situação de flagrante delito.

Por sua vez, a Colenda Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça aperfeiçoou o entendimento supra e ao julgar o REsp n. 1.574.681/RJ (DJe 30/5/2017), concluiu que: "[...] para legitimar-se o ingresso em domicílio alheio, é necessário tenha a autoridade policial fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida [...]".

Ademais, relevante mencionar que o crime de tráfico de drogas possui natureza permanente, sendo possível a realização de busca domiciliar sem o mandado judicial competente, quando presentes fortes indícios de que a residência é utilizada para realizar a atividade ilícita.

A propósito, colhe-se do escólio de Guilherme de Souza Nucci:

"Desnecessidade de mandado em caso de flagrante: é indiscutível que a ocorrência de um delito no interior do domicílio autoriza a sua invasão, a qualquer hora do dia ou da noite, mesmo sem o mandado, o que, aliás, não teria mesmo sentido que fosse expedido. Assim, a polícia pode ingressar em casa alheia para intervir num flagrante delito, prendendo o agente e buscando salvar, quando for o caso, a vítima. Em caso de crimes permanentes (aqueles cuja consumação se prolonga no tempo), como é o caso do tráfico de entorpecentes, na modalidade "ter em depósito" ou "trazer consigo", pode o policial penetrar no domicílio efetuando a prisão cabível". (Código de Processo Penal Comentado. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 538).

Sobre o assunto, extrai-se da Jurisprudência Catarinense:

"APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE...

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