Acórdão Nº 5006612-42.2019.8.24.0038 do Segunda Câmara de Direito Público, 26-07-2022

Número do processo5006612-42.2019.8.24.0038
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5006612-42.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO

APELANTE: MUNICÍPIO DE JOINVILLE (INTERESSADO) APELADO: JOSE FRANCISCO VANZELATTI (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Trata-se de remessa necessária e da apelação cível interposta pelo Município de Joinville contra a sentença proferida no mandado de segurança impetrado por José Francisco Vanzelatti, que concedeu a ordem para fins de emissão da licença ambiental, nos seguintes termos:

"Ante o exposto, concedo a segurança vindicada por José Francisco Vanzelatti, determinando à autoridade impetrada que observe as disposições do artigo 119-C, inciso IV, da Lei Estadual n. 16.342/14 (Código Estadual do Meio Ambiente), em relação ao corpo d'água referido na VMF n. 439/2018, para fins de emissão da licença referida na exordial.Arcará o Município de Joinville com o pagamento das despesas relativas aos atos praticados pelo Contador e pela Distribuidora judiciais (RCE, art. 35, alínea 'h'). Honorários incabíveis (LMS, art. 25).Publique-se. Registre-se e Intime-se. Sentença sujeita a reexame necessário (LMS, art. 14, §1º)" (evento 26).

A Segunda Câmara de Direito Público negou provimento ao reexame obrigatório e ao recurso:

"AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO VISANDO A REGULARIZAÇÃO DE EDIFICAÇÃO. EXIGÊNCIA DE DISTANCIAMENTO DO CURSO D'ÁGUA QUE ATRAVESSA O IMÓVEL SUBTERRANEAMENTE. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE O CASO CONCRETO E O PARADIGMA OBJETO DO TEMA N. 1.010 DO STJ. DISCUSSÃO QUE TEM POR INTUITO A DEFINIÇÃO DA APLICABILIDADE DO CÓDIGO FLORESTAL (LEI NACIONAL N. 12.651/12) OU DA LEI DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO (LEI NACIONAL N. 6.766/79) EM TRECHOS CARACTERIZADOS COMO ÁREA URBANA CONSOLIDADA. TEMA DISTINTO DO CASO CONCRETO, QUE CUIDA DE CURSO D'ÁGUA ARTIFICIALIZADO, E NÃO DE CORPO HÍDRICO NATURAL, COMO VERSADO NO CASO PARADIGMÁTICO. DISTINGUISHING QUE AUTORIZA O JULGAMENTO DO MANDAMUS. REGULARIZAÇÃO DA CONSTRUÇÃO CONDICIONADA AO AFASTAMENTO DE 30 (TRINTA) METROS DE CORPO D'ÁGUA, CONFORME DISPÕE O ART. 4º DO CÓDIGO FLORESTAL. CORPO HÍDRICO CANALIZADO POR GALERIA SUBTERRÂNEA, INSERIDO EM IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA URBANA INEQUIVOCADAMENTE CONSOLIDADA. ADEMAIS, EXIGÊNCIA DISPENSADA, A TEOR DO ART. 119-C, INCISO IV, DO CÓDIGO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE. SENTENÇA CONCESSIVA DA ORDEM MANTIDA. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS" (evento 12).

Inconformado, o Ministério Público opôs embargos de declaração (eventos 22), ao qual o Município de Joinville aderiu (evento 31).

A Segunda Câmara de Direito Público deu provimento ao recurso:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. EXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO SOBRE A APLICAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 551/19 DO MUNICÍPIO DE JOINVILLE AO CASO CONCRETO. COLMATAÇÃO QUE SE IMPÕE. ART. 1.022, INC. II, DO CPC/15. MANDADO DE SEGURANÇA. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO VISANDO A REGULARIZAÇÃO DE EDIFICAÇÃO. EXIGÊNCIA DE DISTANCIAMENTO DO CURSO D'ÁGUA QUE ATRAVESSA O IMÓVEL SUBTERRANEAMENTE. REGULARIZAÇÃO DA CONSTRUÇÃO CONDICIONADA AO AFASTAMENTO DE 30 (TRINTA) METROS DE CORPO D'ÁGUA, CONFORME DISPÕE O ART. 4º DO CÓDIGO FLORESTAL. CORPO HÍDRICO CANALIZADO POR GALERIA SUBTERRÂNEA, INSERIDO EM IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA URBANA INEQUIVOCADAMENTE CONSOLIDADA. ADEMAIS, EXIGÊNCIA DISPENSADA, A TEOR DO ART. 119-C, INCISO IV, DO CÓDIGO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO RECUO DE 5 (CINCO) METROS PREVISTO NA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 551/19. FAIXA DE SERVIÇO. SERVIDÃO ADMINISTRATIVA DE CARÁTER URBANÍSTICO. INTERESSE PÚBLICO DE ACESSO À GALERIA DE ÁGUAS PARA EVENTUAL MANUTENÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO COM EFEITOS INFRINGENTES APENAS PARA RESSALVAR A INCIDÊNCIA DO RECUO URBANÍSTICO. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO" (evento 37).

Irresignado, o Município de Joinville interpôs recursos especial e extraordinário (eventos 45 e 46), sobrevindo as contrarrazões do impetrante (eventos 54 e 55), seguindo-se o sobrestamento do feito por força da afetação do Tema 1.010 pelo STJ (evento 61).

Entremarchas e contramarchas, o eminente Desembargador Segundo Vice-Presidente retornou os autos à Câmara para fins de juízo de retratação com relação ao Tema 1.010/STJ, na forma do art. 1.030, inc. II, do CPC/15 (evento 82).

É o relatório.

VOTO

1. O juízo de retratação, antecipe-se, deve ser negativo.

2. O processo retornou para fins de juízo de retratação no tocante ao Tema 1.010/STJ: "Na vigência do novo Código Florestal (Lei n.º 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade".

Sucede que, no julgamento da apelação e da remessa necessária, a Segunda Câmara de Direito Público não adotou o precedente obrigatório porque o caso concreto não se subsume à hipótese precedental.

Isso porque, no segmento que perpassa o imóvel em questão, o curso d'água encontra-se canalizado/tubulado, não contando mais com margens e com vegetação contíguas que exerçam funções ambientais.

Desta forma, inexistindo área de preservação permanente (APP) a proteger, não se cogita do recuo do curso d'água previsto no Código Florestal, para fins de edificação.

Senão vejamos o que ficou decidido:

"1.1. Trata-se de remessa necessária, haja vista que a sentença concessiva da ordem, em mandado de segurança, está sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, nos termos do que preconiza o art. 14, § 1º, da Lei n. 12.016/09.2. Da apelação cível:2.1. Do distinguishing entre o caso concreto e o caso paradigmático do Tema 1010 do STJA discussão no Tema 1010 tem por intuito a definição da aplicabilidade do Código Florestal (Lei Nacional n. 12.651/12) ou da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei Nacional n. 6.766/79) à área non aedificandi adjacente a cursos d'água naturais, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, sem abarcar, portanto, a hipótese concernente à corpo hídrico artificializado.Assim é que este Tribunal de Justiça, inclusive esta Câmara, passou a adotar o entendimento de que a afetação não compreende os casos que envolvam cursos d'água artificializados mediante tubulação ou canalização, justamente como ocorre no caso em análise.A propósito, como bem pontuado pelo Desembargador João Henrique Blasi na Apelação Cível n. 0311112-37.2017.8.24.0038, de Joinville, julgada em 27.08.19:

'No caso dos autos, ademais, o curso d'água em questão é o Rio Mathias, que se encontra canalizado por galeria fluvial coberta no trecho que corta o terreno objeto deste feito mandamental (fl. 45), consoante consta do Parecer Técnico n. 0633/08, emitido pela Fundação Municipal do Meio Ambiente e que, portanto, goza de presunção de veracidade.A mais disso, o parecer técnico de fls. 49 a 57, emitido por Ambient Engenharia e Consultoria Ambiental, ratifica essa informação, inclusive com registro fotográfico, dando conta da retificação do curso d'água e da canalização ao longo da sua extensão (fl. 64).Não há dúvida, pois, de que o curso d'água em questão, ao cortar o imóvel em foco, está totalmente coberto.O necessário recuo a contar das margens de corpo d'água, fixado em legislação de cariz ambiental tem por escopo 'preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas', consoante estabelece o art. 3º, inc. II, do Código Florestal (negritei).Sucede que a preservação do recurso hídrico em comento por certo foi prejudicada quando decidiu-se confiná-lo em galeria de concreto armado, totalmente coberta, de modo que a existência de maior ou menor recuo na superficie não ostenta agora qualquer 'função ambiental', dado que ele corre em ambiente 'subterrâneo', circunstância bastante para afastar a necessidade de prova pericial para formação do convencimento em...

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