Acórdão Nº 5006614-26.2020.8.24.0022 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 24-08-2021

Número do processo5006614-26.2020.8.24.0022
Data24 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5006614-26.2020.8.24.0022/SC

RELATOR: Desembargador NEWTON VARELLA JUNIOR

APELANTE: MAURINA SILVA DE SOUZA (AUTOR) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Maurina Silva de Souza interpôs apelação cível em face da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Curitibanos, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na Ação Declaratória de Nulidade Contratual, Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais n. 5006614-26.2020.8.24.0022, ajuizada pela apelante contra Banco Pan S.A.

Destaca-se do dispositivo do decisum:

Isto posto, ACOLHE-SE parcialmente a pretensão para:

a) DECLARAR nulo o contrato n.° 0229015082731, como cartão de crédito, devendo o mesmo ser executado como contrato de empréstimo consignado, com a taxa de juros permitida para esta espécie de contratação, apurando-se o saldo devedor considerando os descontos havidos, aplicando-se a estes a mesma taxa de juros para o contrato de empréstimo consignável, consoante tabela do Banco Central.

b) CONDENAR o réu ao pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, o valor é atual reajustável pela SELIC a partir desta data. É autorizada a compensação deste valor com o saldo devedor do contrato, se houver.

c) CONDENAR o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação. (Evento 30).

A autora busca, em síntese, que seja reconhecida a nulidade total do contrato, aplicando-se a repetição do indébito na forma dobrada, e majorados os danos morais, não inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais) (Evento 35).

Deixou de recolher preparo, porquanto beneficiária da gratuidade da justiça (Evento 3).

Intimado, o apelado não apresentou contrarrazões (Evento 42).

Após, os autos foram encaminhados a esta Instância.

É o relatório necessário.

VOTO

A presente demanda versa, em síntese, sobre a existência de vício de consentimento na contratação de cartão de crédito, pois a parte autora visava, em verdade, pactuar um empréstimo consignado comum.

Por decorrência disso, a autora ficou impossibilitada de pagar a dívida, que acumula juros indefinidamente.

Na primeira instância, foi proferida a seguinte decisão quanto ao mérito:

a) DECLARAR nulo o contrato n.° 0229015082731, como cartão de crédito, devendo o mesmo ser executado como contrato de empréstimo consignado, com a taxa de juros permitida para esta espécie de contratação, apurando-se o saldo devedor considerando os descontos havidos, aplicando-se a estes a mesma taxa de juros para o contrato de empréstimo consignável, consoante tabela do Banco Central.

b) CONDENAR o réu ao pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, o valor é atual reajustável pela SELIC a partir desta data. É autorizada a compensação deste valor com o saldo devedor do contrato, se houver. (Evento 30).

A autora requer seja reconhecida a nulidade total do contrato, aplicando-se a repetição do indébito na forma dobrada, e majorados os danos morais, não inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

1. Nulidade contratual

Conquanto o contrato entabulado mencione expressamente a existência de um cartão de crédito, demonstrou-se que a instituição financeira utilizou a modalidade de forma abusiva e induziu a consumidora a acreditar que contratava um empréstimo, enquanto o foco do contrato era o crédito rotativo.

Nesse passo, por constar na avença a denominação consignado, a parte autora acreditou estar realizando apenas mais uma dentre as várias operações de empréstimo consignado em folha de pagamento e/ou benefício previdenciário, porém a instituição financeira faltou com o dever de informação, de modo a omitir o fato de que o crédito ali obtido não seria quitado apenas desse modo.

Isso fica claro quando (I) o contrato define que os boletos para pagamento do montante serão disponibilizados apenas "on-line", isso é, não serão enviados ao consumidor; (II) o valor emprestado é depositado diretamente na conta da pessoa via TED, independentemente do desbloqueio do cartão; e (III) não há qualquer evidência de que a parte recebeu e/ou utilizou o cartão, que não para saque do valor emprestado.

No presente caso, inclusive, nenhuma das faturas mensais demonstram a utilização do cartão, tais como com aquisição de produtos ou serviços, mas tão somente encargos da natureza contratual, de modo que o crédito foi transferido à consumidora por meio de TED direcionado a conta de banco diverso (Evento 9).

Tudo isso demonstra que, embora o contrato mencione expressamente a existência desse cartão cuja existência física nunca foi comprovada , referenciando uma modalidade legalmente permitida, a instituição financeira utilizou isso para induzir a parte demandante a erro e enriquecer apenas com os juros da operação, maiores que na modalidade de crédito consignado comum, pois a dívida nunca ou dificilmente seria adimplida.

Esses pontos, a respeito, são os adotados por esta Câmara para verificar se houve abusividade e/ou vício de consentimento na contratação:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C PLEITOS DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEMANDA ALICERÇADA NA ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO EM RELAÇÃO À CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO POR MEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM DESCONTOS REALIZADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A TÍTULO DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DA CASA BANCÁRIA DEMANDADA. SUSTENTADA A LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO E A EXPRESSA ANUÊNCIA DO RECORRIDO COM OS DESCONTOS ORIUNDOS DA RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. TESE REJEITADA. CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO QUE INDICA PRÁTICA ABUSIVA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA APELANTE CONSISTENTE NA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO CLARA ACERCA DA MODALIDADE CONTRATUAL CELEBRADA ENTRE AS PARTES. CONSTATAÇÃO, ADEMAIS, DE QUE NÃO HOUVE UTILIZAÇÃO, TAMPOUCO PROVA ACERCA DO ENVIO OU DO RECEBIMENTO DO CARTÃO DE CRÉDITO NO ENDEREÇO DO REQUERENTE. EVIDENTE DESVIRTUAMENTO DA REAL INTENÇÃO DO DEMANDANTE DE CONTRATAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COMUM, O QUAL ORIGINOU NEGÓCIO...

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