Acórdão Nº 5006746-89.2020.8.24.0020 do Primeira Câmara Criminal, 17-02-2022

Número do processo5006746-89.2020.8.24.0020
Data17 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5006746-89.2020.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: NEEMIAS DA SILVA VELEDA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no Auto de Prisão em Flagrante, ofereceu denúncia em face de Cintia Nascimento da Cunha e Neemias da Silva Veleda, devidamente qualificados nos autos, dando a primeira como incursa nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e o segundo como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, artigos 12, caput, e 16, caput, e §1º, inciso III, ambos da Lei n. 10.826/03 (estes nos moldes do art. 70 do Código Penal), e artigo 329, caput, do Código Penal, na forma do artigo 69 do referido Diploma Legal, por conta dos seguintes fatos narrados na denúncia, in verbis (Evento 01 dos autos da ação penal):

FATO 1

No dia 10 de abril de 2020, por volta das 14h35min, no pátio do posto de combustível "Imula", situado na Rodovia Sebastião Toledo dos Santos, s/nº, bairro Coloninha Zilli, Criciúma, os denunciados NEEMIAS DA SILVA VELEDA e CINTIA NASCIMENTO DA CUNHA, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, transportaram e trouxeram consigo drogas.

Na ocasião, os denunciados, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, transportaram, no interior do veículo GM/Ônix, branco, placa MLQ-5633, 1 (um) invólucro da substância conhecida como cocaína, com peso bruto aproximado de 202g (duzentos e dois gramas), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

A denunciada CINTIA NASCIMENTO DA CUNHA, ao sair do veículo, foi abordada por policiais militares, sendo encontrado, no interior da sua bolsa, o referido entorpecente que ela trazia consigo.

No interior do veículo que era ocupado pelos denunciados foi encontrado 1 (uma) balança de precisão e 1 (uma) faca, petrechos utilizados para fracionar e pesar as drogas, além de R$ 719,00 (setecentos e dezenove reais) em espécie e 3 (três) celulares.

FATO 2

a sequência, na Rua Senador Teotônio Vilella, s/nº, Bairro Presidente Vargas, Içara/SC, o denunciado NEEMIAS DA SILVA VELEDA, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, mantinha em depósito drogas.

Infere-se que o denunciado NEEMIAS tinha em depósito, no interior da sua residência, 15 (quinze) plantas utilizadas para produzir a droga conhecida como "maconha", e 12 (doze) porções da referida droga, com peso bruto aproximado de 274g (duzentos e setenta e quatro gramas).

Tais substâncias são entorpecentes e podem causar dependência física e psíquica, sendo daquelas elencadas na Portaria n. 344/98 da Secretaria da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde como de uso e comercialização proibida em todo o Território Nacional.

FATO 3

Ainda, o denunciado NEEMIAS possuía, no interior do imóvel, artefato explosivo sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, sendo encontrado, em um dos quartos, 1 (uma) emulsão de dinamite com detonador separado e cordel.

O denunciado também mantinha sob sua guarda, nos quartos da residência, em desacordo com determinação legal e regulamentar, 8 (oito) munições de calibre .38, de uso permitido, e 6 (seis) munições de calibre 9mm, marca Win Luger, de uso restrito, além de um colete balístico, marca Safeside.

FATO 4

Posteriormente, na mesma data, nas proximidades da Delegacia de Polícia de Criciúma, situada na Rua General Lauro Sodré, n. 110, Bairro Comerciário, Criciúma, o denunciado NEEMIAS DA SILVA VELEDA se opôs à execução de ato legal mediante violência empregada contra o Policial Militar De Oliveira.

Durante a lavratura do auto de prisão em flagrante, enquanto aguardava no interior da delegacia de polícia, o denunciado NEEMIAS empreendeu fuga, sendo acompanhado e contido por policiais militares e civis após percorrer aproximadamente 400m (quatrocentos metros).

Na ocasião, o denunciado resistiu à abordagem policial e desferiu um chute na cintura do Policial Militar De Oliveira, danificando o seu coldre. (Grifos no original)

Em razão da não localização da acusada Cintia Nascimento Cunha, foi determinada sua citação por edital (Evento 58 dos autos da ação penal). Diante do não comparecimento da referida ré aos autos, o curso do feito e do prazo prescricional, em relação à ela, restaram suspensos, nos termos do art. 366 do Código de Processo Penal (Evento 104 dos autos da ação penal), dando-se continuidade à marcha processual em relação ao corréu Neemias.

Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz de Direito a quo julgou procedente a denúncia, a fim de condenar o acusado Neemias da Silva Veleda à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, e 02 (dois) meses e 10 (dez) dias de detenção, em regime aberto, bem como ao pagamento de 761 (setecentos e sessenta e um) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, pela prática dos crimes do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, artigos 12, caput, e 16, caput, e § 1º, inc. III, ambos da Lei n. 10.826/03, e artigo 329, caput, do Código Penal; negando-lhe o direito de recorrer em liberdade (Evento 268 dos autos da ação penal).

Inconformado, o acusado interpôs recurso de apelação criminal, por termo nos autos (Evento 281 dos autos da ação penal), bem como por intermédio da defesa (Evento 275 dos autos da ação penal), a qual manifestou, na oportunidade, o interesse de arrazoar o reclamo nesta Superior Instância, na forma do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal.

Após, com a ascensão dos autos a esta Superior Instância, e depois de devidamente intimado o causídico (Evento 12), sobrevieram as razões de insurgência, nas quais pugnou a defesa pela absolvição dos crimes previstos na Lei de Armas ante a atipicidade da conduta, por falta de lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma, bem como do crime de tráfico de drogas, sob o argumento que o flagrante foi preparado. Ainda, embasou o pleito absolutório quanto ao delito de resistência na ausência de elementos colhidos sob o crivo do contraditório. Subsidiariamente, pretendeu o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea em relação aos crimes previstos na Lei de Armas e tráfico de drogas, bem como a restituição do veículo apreendido (Evento 13).

A representante do Ministério Público, em contrarrazões, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 17).

Após, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso (Evento 20).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por PAULO ROBERTO SARTORATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1740924v10 e do código CRC b33a98bb.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): PAULO ROBERTO SARTORATOData e Hora: 10/2/2022, às 20:2:58





Apelação Criminal Nº 5006746-89.2020.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: NEEMIAS DA SILVA VELEDA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto em face de sentença que, ao julgar integralmente procedente a denúncia, condenou o acusado Neemias da Silva Veleda pela prática dos crimes descritos no artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06, artigos 12, caput, e 16, caput, e § 1º, inc. III, ambos da Lei n. 10.826/03, e artigo 329, caput, do Código Penal.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o reclamo deve ser conhecido, passando-se à análise de seu objeto.

I - Dos delitos da Lei de Armas

Almejando a absolvição dos crimes estampados nos artigos 12 e 16, ambos da Lei n. 10.826/03, sustenta a defesa a atipicidade das condutas, por falta de lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma.

Entretanto, urge salientar que o fato de o acusado ter sido flagrado possuindo 01 (uma) emulsão de dinamite com detonador separado e cordel, 08 (oito) munições de calibre .38, de uso permitido e 06 (seis) munições de calibre 9mm, de uso restrito, em sua residência, não o exime da responsabilidade penal, uma vez que eram, segundo os elementos probatórios coligidos nos autos, artefatos eficientes para o fim a que se destinam, o que configura a prática delitiva constante nos artigos 12 e 16, ambos da Lei de Armas.

A propósito, urge salientar que a apreensão unicamente das munições não impede a caracterização dos delitos descritos na exordial acusatória, porquanto a lei também as prevê como objeto material da infração, conforme se infere da leitura dos tipos penais:

Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa:

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Observa-se, assim, que os tipos penais preveem como objetos materiais alternativos a arma de fogo, acessórios e munições, bastando, para a configuração dos delitos, a apreensão de qualquer um deles, ainda que de forma isolada.

Ademais, os referidos crimes classificam-se como de mera conduta, ou seja, prescindem da comprovação de efetivo prejuízo à sociedade ou eventual vítima para a configuração, e de perigo abstrato, cujo risco...

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