Acórdão Nº 5006791-71.2020.8.24.0092 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 03-05-2022

Número do processo5006791-71.2020.8.24.0092
Data03 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5006791-71.2020.8.24.0092/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5006791-71.2020.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA

APELANTE: BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO: ALESSANDRA MICHALSKI VELLOSO (OAB RS045283) APELADO: RAMON MONTEIRO MACEDO DOS PASSOS (AUTOR) ADVOGADO: WILLIAN DOMINGOS DA SILVEIRA (OAB SC040720)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por BANCO DAYCOVAL S.A. contra sentença de procedência (evento 25) da denominada ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com restituição de indébito e indenização por danos morais da Comarca da Capital, a qual foi prolatada nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos na inicial desta "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada" movida por RAMON MONTEIRO MACEDO DOS PASSOS em face de BANCO DAYCOVAL S.A. para:

a) declarar a nulidade do contrato objeto da presente ação, retornando as partes ao status quo ante;

b) determinar à parte autora que proceda a devolução ao Banco réu do valor tomado emprestado, com correção monetária pelo INPC, a partir da data do crédito;

c) determinar à Instituição Financeira que proceda a restituição dos valores descontados indevidamente do benefício da parte demandante, assim como outros pagamentos eventualmente realizados, os quais devem ser corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data do efetivo desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% a.m. (um por cento ao mês), nos termos do art. 406 do Código Civil c/c 161, § 1º, do CTN desde a citação, em consonância com o disposto no art. 405 do CC c/c art. 240 do CPC, oportunizada a compensação dos créditos e débitos (368 do Código Civil);

d) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que deverá ser corrigido pelo INPC, desde a presente data (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, a contar da data da inclusão dos descontos no benefício previdenciário da parte autora.

Em razão da procedência dos pedidos, e presentes os requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil, conceder a tutela de urgência para determinar: (i) a suspensão dos descontos a título de RMC, relativos ao contrato objeto da lide; (ii) a proibição da parte ré de realizar qualquer tipo de depósito ou transferência em favor da parte autora no decorrer do processo.

Arbitro, em caso de descumprimento, multa mensal no valor de R$ 2.000,00, limitada no patamar máximo de R$ 100.000,001.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Em suas razões recursais (evento 43), a casa bancária sustenta, em síntese, a legalidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, ressaltando a inexistência de prova de que o apelado teria sido levado a erro, não se vislumbrando, assim, irregularidade que dê causa à anulação do instrumento. Assevera que, à época da pactuação, o recorrido já não tinha margem consignável em seus rendimentos, inviabilizando a contratação de empréstimo consignado, restando apenas a obtenção de crédito consignado através da adesão ao contrato de cartão de crédito com margem consignável. Aduz a inexistência de termo final a caracterizar dívida impagável, porquanto o débito é extinto com pagamento do débito, na data do vencimento da fatura, constitui liberalidade do autor. Defende que o uso cartão fica constituído e provado pelo saque de valores, razão pela qual não há falar em nulidade. Também, afirma inexistir danos indenizáveis, requerendo, subsidiariamente, a minoração do "quantum". Ainda, discorre acerca do descabimento da restituição de valores, vislumbrando, em caso de manutenção do "decisum", que eventual importância disponibilizada à parte adversa sejam devolvidos ou compensados, e devidamente corrigidos monetariamente, sob pena de enriquecimento ilícito.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 46).

Este é o relatório.

VOTO

Insurge-se a instituição financeira contra sentença de parcial procedência da ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais.

Os pontos atacados no apelo serão analisados separadamente com o objetivo de facilitar a compreensão.

Contratação via cartão de crédito consignado

Relativamente ao tema, importa esclarecer que, durante o curso do processado, a parte autora defendeu a nulidade da contratação ajustada com a ré, sustentando ter sido vítima de fraude por esta ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), operação diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado, o qual acreditou efetivamente ter celebrado.

No pronunciamento judicial atacado, o Magistrado de Primeiro Grau concluiu pela nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, determinando que os valores depositados na conta bancária do autor, atualizados monetariamente pelo INPC, sejam compensados, na forma simples, com os valores descontados indevidamente pelo banco a título de RMC, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso.

Em seu reclamo, pretende a apelante a reforma do referido "decisum", a fim de que seja julgada improcedente a demanda, no que assevera, para tanto, a validade do contrato de cartão de crédito consignado, defendendo ter sido entabulado com anuência do demandante, a significar, em consequência, a licitude dos descontos efetuados no seu benefício previdenciário e a inviabilidade de restituição de valores.

Pois bem.

Sobre as modalidades de mútuo bancário, o Banco Central do Brasil define como "empréstimo consignado aquele cujo desconto da prestação é feito diretamente em folha de pagamento ou benefício previdenciário. A consignação em folha de pagamento ou de benefício depende de autorização prévia e expressa do cliente à instituição financeira concedente" (http://www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/consignados.asp).

Ainda a respeito, esclarece a jurisprudência que, no empréstimo por intermédio de cartão de crédito com margem consignável, "disponibiliza-se ao consumidor um cartão de crédito de fácil acesso ficando reservado certo percentual, dentre os quais poderão ser realizados contratos de empréstimo" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).

Nessa perspectiva, a concessão de crédito através dessas duas modalidades (empréstimo e cartão de crédito), mesmo na consignação, possui considerável distinção, especialmente em relação às taxas de juros e demais encargos, avistando-se maior onerosidade ao consumidor quando se vale do cartão de crédito em detrimento do empréstimo.

Isso se deve, por vezes, em razão de que "o consumidor firma o negócio jurídico acreditando tratar-se de um contrato de empréstimo consignado, com pagamento em parcelas fixas e por tempo determinado, no entanto, efetuou a contratação de um cartão de crédito, de onde foi realizado um saque imediato e cobrado sobre o valor sacado, juros e encargos bem acima dos praticados na modalidade de empréstimo consignado, gerando assim, descontos por prazo indeterminado" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).

Inclusive, é sabido que tal prática abusiva e ilegal difundiu-se, atingindo parcela significativa de aposentados e pensionistas, tendo como consequência o ajuizamento de diversas ações visando tutelar o direito dos consumidores coletivamente considerados a fim de reconhecer a nulidade dessa modalidade de desconto realizado a título de Reserva de Margem Consignável (RMC).

Acerca do "modus operandi" utilizado pelas casas bancárias, o Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), da Defensoria Pública do Estado do Maranhão, para fins de ajuizamento de ação...

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