Acórdão Nº 5006826-65.2020.8.24.0113 do Primeira Câmara Criminal, 16-12-2020

Número do processo5006826-65.2020.8.24.0113
Data16 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5006826-65.2020.8.24.0113/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


AGRAVANTE: JOAO ZALIR DA SILVA JUNIOR (AGRAVANTE) ADVOGADO: SAMARA BEATRIZ FORTUNATO BELLAN (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)


RELATÓRIO


Pronunciamento judicial agravado: a juíza de direito Cláudia Ribas Marinho, da Vara de Execuções Penais da comarca de Itajaí, dentre outras coisas, indeferiu o pedido de aplicação da Lei 13.964/2019, nos seguintes termos:
Trata-se de pedido de aplicação da Lei n. 13.964/2019, remição e livramento condicional formulado em favor de JOAO ZALIR DA SILVA JUNIOR.
O Ministério Público se manifestou no evento 133.
DECIDO
I - Aplicação da lei 13.964/2019
O pedido da defesa não merece acolhimento.
De plano, observa-se que a nova legislação não passou a prever percentual menor de cumprimento de pena para os crimes hediondos. Apenas transformou as antigas frações (2/5 e 3/5) em porcentagem (40% e 60%), já que o período necessário de cumprimento de pena para a obtenção da progressão é equivalente.
Ademais, o percentual de 40% (antiga fração de 2/5) foi previsto expressamente apenas para os apenados primários, condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado.
Do mesmo modo, a Lei n. 13.964/2019 não faz qualquer distinção entre reincidência comum ou específica, apenas estabelece que o apenado, na prática de crime hediondo ou equiparado, deverá cumprir 60% da pena (antiga fração de 3/5) quando for reincidente. Segue o citado dispositivo:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
(...)
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
(..)
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado.
Sobre a questão, segue recente julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
RECURSO DE AGRAVO. EXECUÇÃO PENAL (LEI 7.210/1984, ART. 197). DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO PARA A UTILIZAÇÃO DA FRAÇÃO DE DOIS QUINTOS (QUARENTA POR CENTO) NO CÁLCULO DA PROGRESSÃO DO REGIME PRISIONAL PARA AS PENAS DOS CRIMES DE TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES EM CUMPRIMENTO. INSURGIMENTO DO REEDUCANDO. APONTADA INOVAÇÃO TRAZIDA PELA LEI 13.964/2019, DENOMINADA PACOTE ANTICRIME. ALEGAÇÃO DE QUE A NOVA REDAÇÃO DO ART. 112, VII, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL ESTIPULA O PERCENTUAL DE SESSENTA POR CENTO (TRÊS QUINTOS) SOMENTE PARA CONDENAÇÕES POR DELITOS HEDIONDOS OU EQUIPARADOS NA HIPÓTESE DE REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. IMPERTINÊNCIA. DISPOSITIVO QUE NÃO DIFERENCIA A RECIDIVA NA MESMA NATUREZA DELITIVA OU GENÉRICA. MONTANTE DE QUARENTA POR CENTO DO CORRELATO INCISO V APLICÁVEL APENAS AOS AGENTES PRIMÁRIOS. PRECEDENTES. PRONUNCIAMENTO CONSERVADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (Agravo de Execução Penal n. 0000694-26.2020.8.24.0033, de Itajaí. Relator: Des. Luiz Cesar Schweitzer. Julgado em 20/08/2020).
O Superior Tribunal de Justiça se pronunciou neste mesmo sentido:
Ao tratar dos impactos do Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/2019) na Lei de Execução Penal, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu monocraticamente que, "[...] apesar da atecnia ao não deixar clara a situação do apenado reincidente por crime comum e condenado por delito hediondo, o legislador, em momento algum, exige que a reincidência mencionada no inciso VII seja específica, conforme argumentado pela Defesa" (HC n. 583.751/SP, Ministro Félix Fischer, j. 16-6-2020).
Assim, considerando que o sentenciado, na prática de crime hediondo, foi considerando reincidente na sentença, para progredir ao regime semiaberto deverá regatar a fração 3/5 da pena.
[...]
Conclusão
A) INDEFIRO o pedido de aplicação da Lei 13.964/19, devendo ser mantidas as previsões de benefícios já formalizadas nos presentes autos. [...] (evento 134 dos autos originários).
Recurso de Agravo de Execução Penal: o apenado João Zalir da Silva Júnior, por intermédio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, interpôs recurso e argumentou:
a) "o apenado não é reincidente específico em crime hediondo ou equiparado, assim, a fração para progressão de regime deveria ser de 2/5, conforme novidade legislativa introduzida pelo art. 112, V, da Lei nº 7.210/84";
b) deve ser realizada uma análise sistemática do dispositivo, a partir da qual se pode concluir que "a única interpretação viável para o inciso V é de que a primariedade ali exigida não seria a genérica, mas a específica em crime hediondo ou equiparado", de modo que, para o condenado por crime hediondo ou equiparado, que não seja reincidente em crime desta natureza, a fração para progressão de regime é de 40% da pena (2/5);
c) o inciso VII, por sua vez, reserva-se aos apenados reincidentes na prática de crime hediondo ou equiparado, tratando-se de reincidência específica, ao contrário do que previa o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/1990, de modo que a aplicação da fração de 60% fere o princípio da individualização da pena.
Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso a fim de reformar a decisão impugnada e aplicar ao crime equiparado a hediondo a fração de 2/5 para progressão de regime e retificar a previsão de benefícios (evento 1 dos autos do agravo/PG).
Contrarrazões: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por meio do Promotor de Justiça, impugnou os argumentos apresentados sob o fundamento de que "a Lei n. 13.964/2019 que recentemente alterou o artigo 112 da LEP, não faz qualquer distinção entre reincidência comum ou específica, apenas estabelece que o apenado, na prática de crime hediondo ou equiparado, deverá cumprir 60% da pena (antiga fração de 3/5) quando for reincidente". E, por ter sido o crime praticado anteriormente à Lei n. 13.964/19, bem como pelo fato de a nova legislação não trazer quaisquer benefícios ao apenado, deixa-se de aplicar seus dispositivos.
Postulou a manutenção da decisão objurgada (evento 6 dos autos do agravo/PG).
Juízo de retratação: a juíza de direito Naiara Brancher manteve a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos (evento 8 dos autos do agravo/PG).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: a procuradora de justiça Cristiane Rosália Maestri Böell manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 12 dos autos do agravo/SG).
Este é o relatório

VOTO


O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se aos argumentos expostos em sede recursal.
Trata-se de recurso interposto pela defesa do apenado João Zalir da Silva Júnior contra decisão que indeferiu o pedido de aplicação da fração de 2/5 (40%) para progressão de regime, prevista pela novel Lei 13.964/2019.
O Ministério Público, a seu turno, pugna pela manutenção do pronunciamento objurgado.
O recurso não comporta provimento.
O apenado João Zalir da Silva Junior cumpre, atualmente, a pena unificada de 7 anos, 8 meses e 27 dias, referente aos PECS 0000156-14.2011.8.24.0113, 0002079-02.2016.8.24.0113, 0001028-68.2016.8.24.0011 e 0003363-60.2016.8.24.0011 (evento 129 dos autos originários), tratando-se de reincidente não específico.
Conforme certidão de antecedentes criminais 209-215, evento 119 dos autos originários, o recorrente apresenta duas condenações transitadas em julgado pela prática do crime de furto qualificado, duas pela prática do crime de furto qualificado tentado, uma pela prática do crime de furto simples tentado e duas pela prática do crime de ameaça na forma da Lei 11.340/2006.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, "em sessão realizada em 27/11/2019, pacificou o entendimento de que a intangibilidade da sentença penal condenatória transitada em julgado não retira do Juízo das Execuções Penais o dever de adequar o cumprimento da sanção penal às condições pessoais do réu (EREsp n. 1.738.968/MG, Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, DJe 17/12/2019). Assim, o Juízo da execução deve considerar as condições pessoais do apenado, inclusive a reincidência, para fins de concessão dos benefícios da execução, ainda que não reconhecidas pelo Juízo da condenação." (AgRg no HC 556.371/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 23-6-2020, v.u.).
Ainda sobre o tema, aquela Corte Superior, assim como este Tribunal de Justiça, possui entendimento de que "a reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo. Sendo assim, a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das reprimendas (HC n. 307.180/RS, Ministro Felix Fisher, Quinta Turma, DJe 13/5/2015)." (AgRg no HC 506.275/MG, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. em 4-2-2020, v.u.).
No mesmo sentido: AgRg no HC 498.546/MS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, j. em 30-5-2019, v.u.;. AgRg no REsp 1819736/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, j. em 6-8-2019, v.u.
A progressão de regime da pena privativa de liberdade, como se sabe, permite a transferência do condenado para um regime menos gravoso, a fim de que possa comprovar o seu senso de responsabilidade e aptidão à vida em liberdade, porquanto a finalidade da Lei de Execução Penal é a ressocialização do apenado.
O referido benefício está previsto no art. 112 da Lei de Execução Penal, que, nos termos da redação dada pela Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, assim previa:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao...

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