Acórdão Nº 5007043-68.2021.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-09-2022

Número do processo5007043-68.2021.8.24.0018
Data15 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Apelação Nº 5007043-68.2021.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: CELSO MUNIS REZENDE (AUTOR) ADVOGADO: CLOVIS VALDECIR RIBEIRO JUNIOR (OAB SC049813) APELADO: BANCO INTER S.A. (RÉU) ADVOGADO: LUIS FELIPE PROCOPIO DE CARVALHO (OAB MG101488)

RELATÓRIO

Celso Munis Rezende interpôs recurso de apelação cível da sentença proferida pelo juízo da 1º Vara Cível da comarca de Chapecó, que julgou improcedentes os pedidos da "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral," aforada contra Banco Inter S.A, o que se deu nos seguintes termos (evento 20/1G):

1) RELATÓRIO

CELSO MUNIS REZENDE aforou(aram) AÇÃO DECLARATÓRIA contra BANCO INTER S.A., já qualificado(s). Em sua petição inicial (ev(s). 01), alegou(aram) que: 1) recebe benefício previdenciário; 2) sofreu desconto indevido em seu benefício previdenciário a título de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) relativa à cartão de crédito, porém, não contratou tal produto; 3) sofreu dano moral. Requereu(ram): 1) a dispensa da audiência conciliatória; 2) a declaração de inexistência do contrato de cartão de crédito com RMC; 3) a condenação da parte ré à restituição em dobro dos descontos realizados em seu benefício previdenciário, no valor de R$7.238,90; 4) a exibição de documentos consistentes no contrato firmado com a parte ré e documentos correlatos; 5) alternativamente, a readequação da contratação para empréstimo consignado; 6) a condenação do(a)(s) parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$20.000,00; 7) a concessão do benefício da Justiça Gratuita; 8) a inversão do ônus da prova; 9) a condenação do(a)(s) parte ré ao pagamento dos encargos da sucumbência; 10) a produção de provas em geral; 11) a prioridade na tramitação da ação.

No(a) decisão ao(s) ev(s). 04, foi(ram): 1) deferido o benefício da Justiça Gratuita; 2) determinada a citação da parte ré.

O(a)(s) réu(ré)(s) foi(ram) citado(a)(s) pessoalmente (ev(s). 10).

O(a)(s) réu(ré)(s) apresentou(aram) contestação (ev(s). 06, doc(s). 01). Aduziu(ram): 1) a parte autora contratou cartão de crédito; 2) autorizou expressamente o desconto das parcelas em seu benefício previdenciário; 3) os valores contratados foram efetivamente disponibilizados à parte autora; 4) a reserva de margem consignável é operação lícita; 5) não houve conduta ilegal de sua parte e não há provas em sentido oposto; 6) não há possibilidade de repetição. Requereu(ram): 1) a improcedência dos pedidos; 2) a condenação da autora em ônus sucumbenciais; 3) a devolução dos valores recebidos pela parte autora em caso de procedência dos pedidos; 4) a condenação da parte autora por litigância de má-fé.

O(a)(s) autor(a)(es) apresentou(aram) réplica à contestação do(a)(s) réu (ev(s). 18). Requereu(ram) a procedência dos pedidos iniciais.

Conclusos os autos.

É o relatório necessário.

[...].

3) JULGAMENTO

Por todo o exposto:

I) com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido;

II) CONDENO o(a)(s) a parte autora ao pagamento das custas e das despesas processuais;

III) CONDENO o(a)(s) autor ao pagamento dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa (CPC, art. 85, § 2.º), em favor do(a)(s) procurador(a)(s) do(a)(s) parte ré.

Quanto ao(à)(s) parte autora, beneficiário(a)(s) da Justiça Gratuita (ev(s). 04), a cobrança dos encargos da sucumbência fica suspensa na forma da Lei (CPC, art. 98, §§ 2.º e 3.º).

Publique-se. Registre-se. Intime(m)-se.

Arquivem-se oportunamente.

Em suas razões recursais (evento 26/1G), o autor sustenta, em síntese, que: (a) o contrato é inválido, pois foi ludibriado pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada; (b) a forma como o desconto é realizado, torna o valor recebido impagável, na medida em que apenas da conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização; (c) diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, pois não recebeu, tampouco utilizou o cartão de crédito; (d) é ônus da ré comprovar o envio do cartão e das faturas; (e) a operação deve ser cancelada, com a respectiva suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução da quantia indevidamente cobrada; (f) em razão do ato ilícito praticado, o banco deve ser condenado ao pagamento de danos morais. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso para, em reforma da sentença, julgar procedentes os pedidos da ação.

Contrarrazões (evento 31/1G), requerendo o réu a manutenção da sentença.

Os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça e foram distribuídos por sorteio a este relator.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade do recurso

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Fundamentação

2. (Ir)regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta o autor-recorrente a invalidade da operação pactuada com a casa bancária, na medida em que teria sido por ela ludibriado, pois pretendia contratar unicamente empréstimo pessoal consignado, e não saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada.

Analisados os autos, verifica-se, todavia, que sem razão a parte demandante.

A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1o Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:

I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o;

II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;

III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias.

[...]

§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 6o A instituição financeira que proceder à retenção de valor superior ao limite estabelecido no § 5o deste artigo perderá todas as garantias que lhe são conferidas por esta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004)

Em relação aos aposentados e pensionistas do INSS, tais operações ainda se encontram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/08, que, ao tempo da contratação, estabelecia da seguinte forma:

[...]

Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos...

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