Acórdão Nº 5007111-49.2020.8.24.0019 do Terceira Câmara de Direito Civil, 05-07-2022

Número do processo5007111-49.2020.8.24.0019
Data05 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5007111-49.2020.8.24.0019/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

APELANTE: LIBERTY SEGUROS S/A (AUTOR) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por LIBERTY SEGUROS S/A contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Concórdia que, nos autos da ação regressiva de ressarcimento de danos, em epígrafe, aforada contra CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por LIBERTY SEGUROS S/A em face de CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., na forma do art. 487, I, do CPC, para condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 739,00 (setecentos e trinta e nove reais), acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária pelo INPC desde o desembolso.

Tendo em vista a sucumbência recíproca (art. 86, do CPC), condeno as partes, proporcionalmente (80% a autora e 20% a ré), ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 800,00, a teor dos §§ 2º e 8º do art. 85 do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquive-se. (evento 24).

Em seu apelo, sustenta, em suma, que: os bens eletroeletrônicos da parte segurada foram danificados após distúrbios elétricos provenientes da rede de distribuição elétrica administrada pela concessionária de serviço público; entende que não houve comprovação da regular prestação do serviço, sob o argumento de que "O Módulo 9 do PRODIST, em seu item 6.2, prevê de forma TAXATIVA os itens para averiguação da existência de nexo causal entre o dano reclamado e eventual perturbação do sistema elétrico, senão veja--se [...]" (fl. 6); os laudos técnicos juntados ao caderno processual, confeccionado por profissionais devidamente qualificados e empresas especializadas, sem qualquer interesse na demanda, demonstram, de forma robusta, que os danos aos bens segurados foram causados em razão da oscilação da rede administrada pela apelada; não restou demonstrada a existência de excludentes de responsabilidade; a causa do sinistro foi a oscilação de tensão elétrica advinda externamente da rede de distribuição da apelada; acredita que: "a Apelada sendo uma prestadora de serviço de energia elétrica, é também responsável pela distribuição de energia com segurança, qualidade e a manutenção com menor risco possível ao usuário final. Também, os documentos que à Apelada trouxe aos autos, consulta ao sistema Simo, que indicou não haver registro de falha na distribuição de energia no dia do sinistro, não serve de prova irrefutável para comprovar a não ocorrência de oscilação no seu fornecimento de energia. O que se verifica é que o Sistema SIMO é um programa interno da própria Apelada que não possui qualquer tipo de auditoria externa!!" (fl. 11); aplica-se ao caso o Código de Defesa do Consumidor, com a consequente inversão do ônus da prova. Pugna, ao final, pelo total provimento da insurgência (evento 31).

Com as contrarrazões (evento 37), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

VOTO

De início, vale esclarecer que tanto a prolação da decisão recorrida quanto a interposição do recurso sucederam à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), de modo que os pressupostos de admissibilidade recursal devem observar o regramento disposto no novo diploma, consoante disposto no Enunciado Administrativo n. 3 do STJ.

Dito isso, porque presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise de suas razões.

Na origem, LIBERTY SEGUROS S/A ingressou com ação regressiva em face da Celesc Distribuição S.A. buscando ser ressarcida dos valores desembolsados à parte segurada que teve danos aos equipamentos eletrônicos do condomínio segurado em virtude da falha no serviço de fornecimento de energia elétrica prestado pela ré.

A sentença, como visto por ocasião do relatório, julgou improcedentes os pedidos iniciais, razão pela qual ora se insurge a seguradora.

Em seu apelo, a seguradora aduz, em suma, que a documentação acostada aos autos se revela suficiente para fins de comprovação da falha na rede de distribuição de energia elétrica administrada pela concessionária ré.

Nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

Sobre o assunto, Hely Lopes Meirelles ensina que "o exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Firmou, assim, o princípio objetivo da responsabilidade sem culpa pela atuação lesiva dos agentes públicos e seus delegados" (Direito administrativo brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 653).

Em comentários ao aludido dispositivo constitucional, Maria Sylvia Zanella Di Pietro assinala que "mesmo as concessionárias e permissionárias de serviço público somente responderão objetivamente na medida em que os danos por elas causados sejam decorrentes da prestação de serviços" (Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 613-614).

É evidente, portanto, que a ré, na condição de concessionária de serviços públicos, responde objetivamente pelos danos causados em decorrência da prestação do referido serviço.

A seguradora demandante, por sua vez, atua nos autos mediante subrogação nos direitos da parte segurada (art. 786 do CC), o qual figura como consumidor dos serviços fornecidos pela requerida.

Por conseguinte, aplica-se em seu favor às disposições insertas no Código de Defesa do Consumidor, com seus consectários reflexos na aferição da responsabilidade civil e no âmbito probatório, com a possibilidade de inversão do ônus da prova (art. 6º, inc. VIII, do CDC).

A respeito da responsabilidade civil, aliás, o CDC, em seu art. 14, prevê a responsabilização do fornecedor, independentemente de culpa, pelos danos causados ao consumidor, in verbis: "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

O fornecedor de serviços somente não será responsabilizado quando comprovar: "I - que, tendo prestado o serviço o defeito inexiste; "II - culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro ( art. 14, § 3º, I e II do CDC).

No caso em apreço, discutem as partes se os danos ocasionados ao equipamento eletrônico do segurado decorreu, ou não, da inadequação dos serviços oferecidos pela ré (sobretensão da rede de energia elétrica).

A seguradora, com base em laudos técnicos elaborados por empresas especializadas nos ramos dos eletrônicos danificados (evento 1, laudos 15/18), defende que os danos resultaram de oscilações na rede de energia elétrica/descarga atmosférica.

A concessionária ré, por sua vez, defende que os danos elétricos não decorreram dessa circunstância, uma vez que não houve registro de ocorrência nos...

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