Acórdão Nº 5007400-28.2020.8.24.0036 do Primeira Câmara de Direito Civil, 06-10-2022

Número do processo5007400-28.2020.8.24.0036
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5007400-28.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

APELANTE: LIBERTY SEGUROS S/A (AUTOR) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por L. S. S.A. em face da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Jaraguá do Sul que, nos autos da Ação Regressiva de Ressarcimento de Danos n. 5007400-28.2020.8.24.0036 ajuizada contra C. D. S.A., julgou improcedente o pedido inicial, nos seguintes termos (Evento 22, SENT44 - autos de origem):

(...)

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado por LIBERTY SEGUROS S/A contra CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., resolvendo o mérito da lide, o que faço com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fico em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquivem-se.

Inconformada, a seguradora apelante sustentou que o nexo de causalidade restou confirmado por meio dos laudos técnicos que os danos ocorreram por descargas elétricas, indicando a falha na prestação de serviços da ré. Aduziu que os relatórios juntados pela concessionária não estão em conformidade com as normas da ANEEL, os quais não têm o condão de afastar o elo causal entre os fatos e os danos alegados (Evento 82, APELAÇÃO1 - autos de origem).

Em resposta, a apelada apresentou contrarrazões, refutando as razões do recurso, com destaque para a necessidade de reconhecimento de cerceamento de defesa na eventualidade de reforma da decisão monocrática, pois a recorrida pretende que seja respeitado seu direito ao contraditório e ampla defesa, possibilitando a produção das provas requeridas na peça contestatória, em especial a testemunhal e pericial. No mérito ponderou que quando a área técnica da empresa analisa as ocorrências registradas no sistema elétrico, ela está analisando todos os itens descritos no item 6.2, sendo o sistema SIMO apto a apresentar todas as hipóteses previstas no Módulo 9 PRODIST, quando existentes (Evento 87, CONTRAZ1 - autos de origem).

Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade recursal

Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à sua análise.

Preliminar - Cerceamento de defesa

Com a possibilidade de reforma da sentença, convém analisar o pleito de cerceamento de defesa sustentado pela recorrida em contrarrazões.

Aduz que as provas testemunhal e pericial poderiam corroborar para demonstração da regularidade da prestação de serviços, as quais fizeram parte de pedido expresso na peça contestatória.

Todavia, a prefacial deve ser afastada, pois, compulsando os autos denota-se que a recorrente dispensou a prova pericial (Evento 54, PET1 - autos de origem), não podendo agora alegar cerceamento no ponto. Ademais, a prova testemunhal foi indeferida pelo juízo a quo, pois inexistentes fatos a serem comprovados exclusivamente por meio de depoimentos (Evento 62, DESPADEC1). O oficio à EPAGRI foi deferido e cumprido (Evento 45, OFIC1 - autos de origem).

Sabe-se que o magistrado é o destinatário final das provas e, segundo disposição dos arts. 370 e 355, I do CPC, cabe a ele determinar a produção das provas necessárias à instrução do processo e antecipar o julgamento da lide. Ou seja, se o conjunto documental nos autos forneceu a segurança necessária ao juiz para proferir a sentença, não se há falar em cerceamento de defesa.

A prova testemunhal requerida em nada influiria na avaliação da regularidade dos relatórios apresentados pela apelada, porquanto exige-se apenas prova documental ou pericial (no caso, dispensada pela parte).

Logo, o julgamento antecipado da lide mostrou-se absolutamente viável no caso e, sempre que possível, deve ser evitada a dilação indevida do curso do processo.

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu:

O STJ possui entendimento de que o magistrado tem ampla liberdade para analisar a conveniência e a necessidade da produção de provas, podendo perfeitamente indeferir provas periciais, documentais, testemunhais e/ou proceder ao julgamento antecipado da lide, se considerar que há elementos nos autos suficientes para a formação da sua convicção em relação às questões de fato ou de direito vertidas no processo, sem que isso implique cerceamento do direito de defesa (REsp n. 1.651.097/BA, rel. Min. Herman Benjamin, j. 14-3-2017).

Não se constata a violação aos arts. 330 e 332 do CPC, por suposto cerceamento do direito de defesa, pois, de acordo com a jurisprudência consagrada nesta Corte, de fato, é facultado ao julgador o indeferimento de produção probatória que julgar desnecessária para o regular trâmite do processo, sob o pálio da prerrogativa do livre convencimento que lhe é conferida pelo art. 130 do CPC, seja ela testemunhal, pericial ou documental, cabendo-lhe, apenas, expor fundamentadamente o motivo de sua decisão (AgRg no REsp n. 1.574.755/PE, rel. Min. Sérgio Kukina, j. 3-3-2016).

Rejeita-se, portanto, a preliminar de cerceamento de defesa aventada em contrarrazões.

Mérito

Extrai-se dos autos que a controvérsia cinge-se à comprovação do liame causal entre os danos em produtos do segurado e a eventual falha na prestação de serviço de energia elétrica pela concessionária.

De acordo com a disposição do art. 786 do CC "paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano".

A relação jurídica entre seguradora e os segurados é incontroversa (Evento 1, OUT5, OUT8 e OUT9 - autos de origem).

Na hipótese debatida, há três sinistros abertos perante a seguradora, sob os ns: a) 8191098, datado de 26/10/2019, por danos em um televisor - MARCA: SAMSUNG MODELO: UN55C8000XM SÉRIE: Z0JA3XLZ700913T cujo dispêndio segurado foi de R$ 1.799,00; b) 8806820, datado de 23/01/2020, por danos em um aparelho HOME - MARCA: SAMSUNG MODELO: HT-Z220T SÉRIE: B13E1XCS900891N, com dispêndio no valor de R$ 1.273,00; c) 8635708, datado de 15/01/2020, por danos em um forno - MARCA: ELETROLUX MODELO: OE7TX, um microondas - MARCA: ELETROLUX MODELO: MTX 52 e um bebedouro MARCA: ELETROLUX MODELO: PA30G (Evento 1, OUT8, pp. 1, 10-14, OUT9, pp. 3-5 e 18 - autos de origem).

Registre-se que em casos como o dos autos, de ressarcimento de danos elétricos, a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL definiu, por meio do Procedimentos de Distribuição de Energia Elétrica no Sistema Elétrico Nacional - PRODIST, Módulo 9 - Ressarcimento de Danos Elétricos, da ANEE, as etapas que a distribuidora deve observar para a análise do pedido do consumidor.

De acordo com as aludidas regras, o processo interno se inicia com a manifestação da vontade do consumidor em receber ressarcimento por danos elétricos. A etapa de análise é obrigatória para a concessionária, em que se verifica a tempestividade da solicitação, a existência do dano reclamado, as excludentes de responsabilidade e o nexo de causalidade no intuito de verificar a obrigatoriedade do ressarcimento. Nesta etapa, é facultado à distribuidora a realização da chamada verificação, que tem o objetivo de inspecionar, antes da resposta ao consumidor, as condições do equipamento objeto da solicitação e as instalações internas da unidade consumidora, visando subsidiar a fase de análise (itens 8, 10 e 34 do Módulo 9 PRODIST).

Não obstante a desnecessidade de prévio requerimento administrativo para a obtenção do ressarcimento na via judicial, sob pena de ofensa ao princípio de acesso à justiça e de inafastabilidade da jurisdição, o acionamento extrajudicial da distribuidora facilita as etapas de confirmação do nexo de causalidade e o respectivo pagamento.

No caso dos autos, a concessionária não foi previamente acionada pelo consumidor, restando prejudicadas as etapas de análise e verificação previstas na normativa, remanescendo, nesta via judicial, apenas a comprovação ou não do nexo de causalidade com base na prova documental carreada. Não obstante, reforça-se, a etapa de verificação é uma faculdade da concessionária, revelando-se a prática a ausência dessa averiguação in loco mesmo quando presente a prévia comunicação pelo consumidor.

Importante destacar que os laudos técnicos e relatórios reguladores, sobretudo quando genéricos, por si só, não são suficientes a atestar o nexo de causalidade. Faz-se necessário que os documentos apresentem elementos mínimos para que sejam enquadrados como verdadeiros "laudos de oficina" disposto no art. 17 do Módulo 9 do PRODIST, em especial, que abordem, de forma convincente e técnica, a causa/origem do dano alegado. Logo, a dúvida ou a incerteza do motivo ensejador da queima dos equipamentos tenciona desfavoravelmente à caracterização do nexo causal.

Para melhor compreensão, a análise será desmembrada por sinistro, dadas as suas peculiaridades, a seguir apontadas.

Do sinistro n. 8191098 (segurado R. M) ocorrido em 26/10/2019

Para esse sinistro, relativo a um televisor - MARCA: SAMSUNG MODELO: UN55C8000XM SÉRIE: Z0JA3XLZ700913T a parte autora colacionou apenas a apólice, sem qualquer relatório regulador e/ou laudos de oficina que pudessem comprovar a ocorrência do sinistro (Evento 1, OUT5 - autos de origem). Além disso, o extrato de pagamento juntado não pode ser utilizado como prova de quitação do segurado, pois não demonstra a autenticação bancária (Evento 1, COMP7 - autos de origem).

Com base nisso, não há um começo de prova capaz de confirmar o fato constitutivo do direito autoral, nos termos do art. 373, I, do CPC.

De acordo com o Módulo 9 PRODIST, item 18, o laudo de oficina é o documento emitido por área técnica que detalha o dano ocorrido no equipamento objeto da solicitação de ressarcimento e tem como intuito confirmar se o dano reclamado tem origem elétrica.

Com o laudo, poder-se-ia concluir que o equipamento do segurado não...

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