Acórdão Nº 5007869-66.2021.8.24.0092 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 04-08-2022

Número do processo5007869-66.2021.8.24.0092
Data04 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5007869-66.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: AIDA NECCHI RIBEIRO DOS SANTOS (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 18), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Cuida-se de ação movida por AIDA NECCHI RIBEIRO DOS SANTOS em face de BANCO BMG S.A. Alegou que assinou contrato de empréstimo consignado junto à parte contrária, com pagamento através de desconto em seu benefício previdenciário. Todavia, constatou posteriormente que foi induzido em erro, pois não se tratava propriamente do empréstimo consignado desejado, mas sim da aquisição de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), com encargos/retenção de valores não esperados, o que seria ilegal. Requereu a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com RMC, igualmente da reserva de margem consignável, com a restituição em dobro do que foi descontado a título do RMC e condenação da parte ré ao pagamento de danos morais.

A tutela de urgência foi apreciada e indeferida (evento 4).

Citada, a instituição financeira contestou alegando preliminares e defendendo a higidez do contrato e da validade da reserva de margem consignável por terem sido confeccionados de acordo com a vontade dos envolvidos. Discorreu sobre a repetição de indébito e sobre danos morais (evento 11).

Houve réplica (evento 16).

Da sentença

O Juiz de Direito, Dr. LUIZ EDUARDO RIBEIRO FREYESLEBEN, da Unidade Estadual de Direito Bancário, julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 18):

Ante o exposto, julgam-se improcedentes os pedidos.

Condena-se a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa por força da Justiça Gratuita.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.

Da Apelação

Inconformada com a prestação jurisdicional, a Autora, ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 24), no qual reedita os argumentos lançados à petição inicial, ressaltando que, após a celebração do contrato de empréstimo consignado, foi surpreendido com o desconto de reserva de margem consignável (RMC) de cartão de crédito.

Pugna a reforma da decisão recorrida, uma vez que a conduta perpetrada pelo Apelado é contrária às regras de proteção ao consumidor, por violar o direito à informação.

Argumenta que há prática abusiva do Apelado, a qual está comprovada pela ocorrência de onerosidade excessiva, pois as parcelas descontadas mensalmente do seu benefício previdenciário somente pagam os encargos do cartão de crédito, o que ofende a boa-fé contratual.

Por conta disso, pretende o reconhecimento da ilegalidade da contratação, com a consequente nulidade do pacto firmado entre as partes, com a condenação do Apelado a restituição dos valores indevidamente descontados mensalmente, na forma dobrada.

No que se refere ao dano moral, sustenta que o ato ilícito está configurado, diante da ilicitude praticada pelo Apelado, sendo o abalo moral, portanto, presumido.

Por fim, requer o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos deduzidos na exordial.

Das contrarrazões

Devidamente intimado, o Apelado apresentou contrarrazões (Evento 26). Aventa a necessidade de intimação da parte autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, requer a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Ascenderam os autos ao Tribunal de Justiça.

Após a distribuição, vieram-me conclusos para julgamento.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

II - Das contrarrazões

O BANCO BMG S.A requer a intimação da parte autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, pleiteou a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Sem razão.

No que se refere ao pleito de intimação da parte autora para que esta informe o seu conhecimento acerca da propositura da lide, infere-se que tal medida não se revela plausível, notadamente pelo conteúdo genérico da narrativa, que não encontra abrigo em qualquer início de prova.

Conforme já decidiu este Tribunal, eventual desvirtuamento do interesse da parte autora na propositura da demanda não pode ser reconhecido a partir de meras conjecturas, não cabendo ao juízo, sobretudo em segundo grau de jurisdição, investigar o ânimo da parte (Nesse sentido: Apelação n. 5030238-56.2020.8.24.0038, rel. Mariano do Nascimento, j. 04-02-2021 e Apelação n. 5007736-58.2020.8.24.0092, rel. Guilherme Nunes Born, j. 08-07-2021).

Salienta-se que o instrumento de procuração subscrito pela parte, cuja autenticidade não foi derruída, tem o condão de evidenciar a prévia ciência sobre o pleito vertido em juízo, bem como seu interesse na tutela jurisdicional vindicada.

Igualmente, não merece amparo o pleito de condenação do procurador da parte demandante nas penas de litigância de má-fé, especialmente em virtude de que a aplicação das indigitadas penalidades é dirigida às partes da relação processual instaurada, e não aos seus causídicos.

A propósito, entende-se que "o fato do procurador da parte autora ter ajuizado, supostamente, centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir, não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz" (TJSC, Apelação n. 0301613-52.2019.8.24.0040, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 30-07-2020).

Em arremate, caso a instituição financeira entenda haver indícios de infrações disciplinares e condutas típicas, poderá buscar diretamente as autoridades administrativas ou o respectivo órgão de classe competente, se assim julgar necessário (Apelação n. 5001121-83.2021.8.24.0038, rel. Tulio Pinheiro, j. 01-07-2021).

II - Do julgamento do recurso

Trata-se de Apelação Cível interposta por AIDA NECCHI RIBEIRO DOS SANTOS contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na "Ação Anulatória de Contrato Jurídico c/c Suspensão de Descontos, Indenização por Danos Materiais e Morais e antecipação de Tutela de Urgência" ajuizada em desfavor do BANCO BMG S.A, ora Apelado.

a) Do julgamento do mérito

Inicialmente, imperioso destacar que a relação existente entre as partes está sob o albergue do Código de Defesa do Consumidor, subsumindo-se Apelante e Apelado aos conceitos de consumidor e fornecedor prescritos nos artigos 2° e 3°, ambos do Diploma Protetivo.

Ademais, quanto à aplicabilidade das normas consumeristas às instituições financeiras, incide na espécie a Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Superada a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em comento, passo à análise da discussão vertida nos autos.

No caso em comento, a parte Apelante alega que firmou contrato de empréstimo consignado, com desconto direto em seu benefício previdenciário, tendo sido surpreendido, porém, com descontos diversos, atinente à reserva de margem consignável de cartão de crédito (RMC).

Por seu turno, em contestação, defende a Instituição Financeira a regularidade da contratação, a legalidade na reserva de margem consignável (RMC), além da inexistência de dano moral indenizável.

Pois bem.

Da análise da documentação constante nos autos, verifico que a Apelante firmou com o Banco, na data de 05/08/2015, "Termo de Adesão ao Cartão de Crédito Consignado e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento" n. 38475400 (Evento 11 - CONTR 2), acreditando, segundo alega, ter contratado empréstimo consignado com descontos mensais em seu benefício previdenciário.

Da consulta do benefício previdenciário apresentada pela Apelante denoto que, além de outros contratos de...

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